O primeiro-ministro foi ontem pela primeira vez confrontado por jornalistas com a controvérsia em torno da não recondução do presidente do Tribunal de Contas (TdC), Vítor Caldeira. E, no essencial das respostas que deu, António Costa invocou em seu favor ter do seu lado a opinião, também, do Presidente da República, a favor da tese de que estes mandatos devem ser únicos..Ainda ontem à noite, Marcelo Rebelo de Sousa nomeou, "sob proposta do primeiro-ministro, António Costa, o juiz conselheiro José Tavares" como novo presidente do TdC, conforme nota divulgada no portal da Presidência da República.."Como o Presidente da República teve a ocasião de explicitar aquando da cessação de funções da senhora conselheira Joana Marques Vidal [como procuradora-geral da República], é entendimento do governo e do Chefe do Estado que neste tipo de funções não deve haver lugar a renovação, além do mais para garantia da própria independência da função. Para que cada um a exerça sem ter de estar a pensar se, no final desse mandato, o governo vai ou não propor e se o Presidente da República vai ou não renomear", disse o chefe do governo, falando com jornalistas após ter participado na sessão evocativa do centenário do nascimento de Amália Rodrigues, no Panteão Nacional..Segundo acrescentou, "a lei, de facto, não impede e renovação, mas o atual governo e o atual Presidente da República definiram um critério para funções de natureza judiciária - funções que dependem de proposta do governo e de nomeação do Chefe do Estado -, aquando da nomeação da procuradora-geral da República"..Citaçãocitacao"Um critério é um critério, bom ou mau. Eram possíveis outros? Claro que eram. Mas este foi o critério que o Governo e o Presidente da República fixaram.".Assim, agora "seria estranho que, pouco tempo depois, se mudasse de critério" com a escolha do novo presidente do TdC.."Aí - disse - é que haveria motivo para suspeitar de ter sido adotado um critério para a procuradora-geral da República e outro para o presidente do Tribunal de Contas. Poderia dizer-se que os critérios eram fixados à medida do cargo e da personalidade. Um critério é um critério, bom ou mau. Eram possíveis outros? Claro que eram. Mas este foi o critério que o governo e o Presidente da República fixaram.".Insistindo no paralelismo da metodologia seguida para a PGR, Costa recordou que "na altura também se criou uma grande agitação, uma grande suspeição". No entanto, hoje "toda a gente reconhece que a atual PGR tem exercido as suas funções com grande competência e grande eficiência. Todos os motivos de suspeição que então se levantaram não se verificaram"..Citaçãocitacao"Neste momento, nos termos da lei, o vice-presidente assume a presidência do tribunal e oportunamente o Governo apresentará ao Presidente da República a proposta de personalidade que consideramos adequada para exercer a função de presidente do TdC.".Ou seja: "Um critério é um critério - e este é o critério que o Presidente da República e o governo fixaram. Estamos a ser coerentes com os critérios fixados. E isso é o normal.".Segundo deixou claro, Vítor Caldeira sairia imediatamente de presidente do TdC. "Seguramente, o Tribunal de Contas prosseguirá a sua missão com a composição estável que tem dos seus conselheiros. Neste momento, nos termos da lei, o vice-presidente assume a presidência do tribunal e oportunamente o governo apresentará ao Presidente da República a proposta de personalidade que consideramos adequada para exercer a função de presidente do TdC." Conforme veio a verificar-se, o novo nome já estaria escolhido, não sendo sequer necessária a substituição pelo vice-presidente do TdC, já que a proposta de Costa foi aceite, com o PR a confirmar a nomeação de José Tavares ainda antes das 23.00 de ontem (saiba mais aqui)..Costa aproveitou ainda para rejeitar qualquer relação entre a não recondução de Caldeira e as críticas do TdC à proposta de lei do executivo para a revisão da contratação pública. "Essa suspeita não faz o menor sentido. Há quatro anos que o atual presidente do TdC sabia qual era o dia do termo do seu mandato, em 30 de setembro de 2020. Não houve qualquer alteração.".Enquanto isto, no Parlamento o ministro das Finanças e o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares iam apresentando aos partidos as linhas gerais do OE 2021 - o qual deverá dar entrada no próximo dia 12..O que estava em causa, no essencial, era apresentar as projeções macroeconómicas do governo para este ano e para o próximo, no que toca, nomeadamente, a défice, desemprego e crescimento da economia..Os valores, segundo o confirmado pelo DN/Dinheiro Vivo, são os seguintes.Défice (% do PIB).2020: 7,3%.2021: 4,3%.Economia (% do PIB).2020: - 8,5%.2021: + 5,4%.Desemprego.2020: 8,7%.2021: 8,2%.À esquerda, Bloco e PCP criticaram - como sempre fazem - um suposto excesso de preocupação governamental com o défice..Pedro Filipe Soares, do BE, salientou que o país vive "uma situação extraordinária e exatamente por isso um conjunto de pressões que existiam em torno da questão do défice não existem neste momento". "Se queremos ter uma recuperação rápida deveremos dar prioridade ao investimento que ajude a essa recuperação. Se nós formos temerários na execução desse investimento nós estaremos a atrasar a nossa recuperação", afirmou..Citaçãocitacao"Teremos reuniões nos próximos dias e esperamos que, essas sim, tenham uma alteração qualitativa na resposta que o Governo tem dado.".Os bloquistas mantiveram o tom de ameaça, afirmando que ainda falta muito para o BE ter condições para viabilizar o OE. Pedro Filipe Soares exigiu ao governo uma "alteração qualitativa". "Esta reunião de hoje não altera nada do que nós dissemos nos últimos dias. Teremos reuniões nos próximos dias e esperamos que, essas sim, tenham uma alteração qualitativa na resposta que o governo tem dado e na aproximação a posições que defendem não posições políticas, mas soluções para a vida das pessoas.".Já João Oliveira, do PCP, disse que "o défice não deve ser critério de construção do OE, a resposta ao problema do país é que deve ser esse critério". "O critério deve ser o de considerar a resposta que o país precisa e encontrar os meios de resposta. Se for preciso que o défice das contas públicas seja desviado do caminho, tem de ser essa a opção a fazer", insistiu..No final das reuniões, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, procurou responder a estes reparos salientando que o défice não é neste momento "a preocupação central" do governo. A grande preocupação do OE 2021 será, isso sim, "proteger o rendimento das famílias e o apoio às empresas para se poder recuperar a economia"..À direita, ficou claro que CDS, Iniciativa Liberal e Chega se preparam para votar contra, argumentando, nomeadamente, que a proposta governamental não dá prioridade ao apoio às empresas..O PSD mantém as opções em aberto mas também insiste na questão do apoio às empresas. O OE 2021 deve "criar mecanismos que permitam que as empresas funcionem neste quadro económico muito difícil", afirmou Afonso Oliveira, vice-presidente do grupo parlamentar sociais-democratas.