Pedro Marques Lopes é o mais contundente a analisar a anunciada demissão da liderança do Chega de André Ventura. "Acho que é um ato miserável e indigno, que o oportunista Ventura está a fazer". O comentador político argumenta que o também deputado "percebeu que não estava a ter palco" neste momento crítico, em que o debate entre forças partidárias está praticamente suspenso, e "criou este número político para ter atenção". O que já tinha procurado sem sucesso, afirma Marques Lopes, com os últimos cartazes que o Chega colocou na rua..Também acutilante se mostra Pedro Adão e Silva perante a atitude de Ventura. O também comentador político invoca uma das frases de André Ventura, no desafio que lançou ao que disse serem opositores internos, a de que "é altura de os ratos abandonarem o navio". Então, diz Adão e Silva, "o partido corre o risco de ficar totalmente vazio e, certamente, o líder não vai ser o mesmo"..O politólogo José Adelino Maltez desvaloriza a "importância" do gesto do líder demissionário do Chega. "Ele fez isso para estarmos a comentar." Na sua opinião, há partidos no sistema e "grupos que estão nas sondagens e fazem pela vida", como é o caso do Chega. "Mas, neste momento, ninguém quer saber", assegura, mas admite que a intenção de Ventura é mesmo a de "criar um facto político", que se não fosse a demissão acabaria por ser um "discurso inventado" para dar nas vistas. "Era previsível que arranjaria alguma coisa para influenciar a agenda, numa altura em que o comentário político está suspenso. E muito fruto da "intuição de Rui Rio de que o homem comum não queria competição" durante o combate à pandemia.."Estou farto", garante Ventura.O líder do Chega e deputado anunciou a sua demissão aos militantes num vídeo publicado na sua página do Facebook. "Estou farto, estou cansado daqueles que sistematicamente boicotam o trabalho da direção nacional e que sistematicamente estão contra as posições da direção nacional e que se empenham mais em atacar o partido, em divulgar mensagens privadas e opções dos órgãos internos do partido do que em ajudar a fazer crescer o partido." É assim que começa por dirigir-se aos membros do Chega, justificando a sua decisão com os alegados ataques internos..André Ventura insiste que o partido cresce exponencialmente, e que está neste momento a disputar o quarto ou o terceiro lugar na cena política nacional. O Chega conseguiu 1,29% nas eleições legislativas de 2019 e eleger um deputado - o próprio Ventura - e nas mais recentes sondagens aparece com uma percentagem muito superior. Sobretudo depois de o líder do Chega ter anunciado que será candidato nas eleições presidenciais de 2021.."Isto [o crescimento do partido] atraiu uma grande massa de população portuguesa, uma grande energia. Mas também o pior que a vida política tem, os que procuram sempre um lugar ao sol a todo o custo, sem escrúpulos, sem regras, e estão à espera do momento certo para atacar". Os que, defendeu, querem fazer do Chega um partido à imagem e semelhança de PSD, PS e CDS, os tais do sistema que esconjura..Os ataques internos de que terá sido alvo prendem-se com o facto de se ter abstido na última votação do estado de emergência nacional, decretado pelo Presidente da República. "Votei pela abstenção não porque entenda que não deva haver, mas por entender que nenhum pretexto pode permitir pôr reclusos nas ruas.".Ventura também se diz "farto" dos que internamente estão "sempre a acenar com o fantasma do racismo" e do "extremismo" em que o partido poderá cair. "Esta é a linha, é a génese do Chega, sem medo, sem tibiezas, sem medo do politicamente correto", garantiu..Assumiu ser recandidato ao cargo de presidente do partido e desafiou "todos os que têm feito sombra a apresentarem-se e a darem a cara"..A clarificação.Ao DN e às críticas dos analistas políticos, o líder do Chega insiste na ideia de que "seja no meio de uma pandemia ou não, o Chega atingiu um ponto de crescimento tal que precisa de uma clarificação para evitar a implosão".."A existência de múltiplas sensibilidades e correntes que se avolumam obriga a uma urgente clarificação antes dos próximos atos eleitorais, as eleições regionais de outubro e as presidenciais de janeiro. Por isso mesmo dou agora a oportunidade aos adversários internos e àqueles que andam sistematicamente a boicotar o trabalho político e parlamentar do partido, de se prepararem e organizarem para eleições", afirma. E reitera que "não aguento mais no Chega aqueles que estão desejosos de dar as mãos ao PSD, ao CDS e à Iniciativa Liberal"..No final do ano passado, e já depois das eleições legislativas, o Chega esteve envolvido em polémica quando dois dos fundadores bateram com a porta e saíram do partido. Jorge Castela e Pedro Perestrello deixaram críticas a Ventura e denunciaram pressões e ilegalidades internas, sobretudo no que dizia respeito à recolha de assinaturas para legalização daquela força política.