O governo prevê usar neste ano e no próximo um total de 800 milhões de euros da almofada de segurança e liquidez do Estado para abater à dívida pública, indicam dados oficiais do Tesouro, da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP).De acordo com um levantamento feito pelo DN/Dinheiro Vivo das várias apresentações feitas pelo IGCP aos investidores nacionais e internacionais, o governo prevê levantar este ano 600 milhões de euros da almofada dos depósitos e no próximo mais 200 milhões de euros, o que reduzirá a referida almofada para 5,7 mil milhões de euros este ano e 5,5 mil milhões no final de 2026, indica a agência da dívida.Esta almofada de liquidez do Estado – os chamados "cofres cheios", como dizia a antiga-ministra das Finanças, hoje comissária europeia, Maria Luís Albuquerque – foi um instrumento que ganhou uma relevância enorme no tempo do programa de ajustamento e da crise das dívidas soberanas, tendo sido, na altura, entre 2011 e 2014, uma exigência da troika (a equipa que geria o programa formada por BCE, Comissão Europeia e FMI).A ideia era que o País (o governo) tivesse uma proteção adicional contra eventuais incidentes nos mercados de capitais, não fosse o país voltar a ser confrontado com taxas de juro incomportáveis.Recorde-se que nesse anos de chumbo de 2010 e 2011, três países da Zona Euro entraram em falência e tiveram de recorrer a um resgate financeiro internacional (Grécia, Irlanda e Portugal, por esta ordem). Espanha também, mas o resgate, de grandes dimensões, visou apenas o sector bancário.Almofada chegou a ter mais de 15 mil milhões de eurosLogo em 2011 (o primeiro ano da austeridade), a almofada de segurança portuguesa subiu para 8,4 mil milhões de euros. Em 2012 e 2013, foi significativamente reforçada, passando a valer mais de 15 mil milhões de euros.Hoje, mais de dez anos volvidos desde o final do resgate, as crises internacionais continuam, mas a situação das contas públicas portuguesas é bem diferente.O país tem entregue excedentes orçamentais, tem um peso da dívida muito elevado, mas a baixar há alguns anos. Tem sido recompensado por isso com elogios dos credores, de Bruxelas, das agência de ratings, o que contribui para manter as taxas de juro em níveis comportáveis e relativamente benignos.O esvaziamento da almofada para o valor previsto de 5,5 mil milhões de euros no final de 2026 acontece numa altura em que as taxas de juro portuguesas continuam estáveis, na vizinhança de 3% desde 2023 (as obrigações a dez anos), em que os ratings (notas para a dívida soberana) têm vindo a subir, em que o custo efetivo de toda a nova dívida emitida por ano está em agora em 3,3% (era 3,5% em 2023, ano em que o BCE mais subiu taxas de juro).Portanto, a ideia presente nas Finanças do ministro Joaquim Miranda Sarmento é também aproveitar esta janela de aparente bonança nos mercados da dívida, enquanto existe e dá.Com guerras militares a decorrer, uma guerra comercial global de grandes dimensões iniciada por Donald Trump, o Presidente dos Estados Unidos, e problemas nas contas públicas de países europeu de grande calibre, como França, Alemanha ou Itália, a janela pode fechar-se repentinamente.A usar depósitos, que são classificados como dívida, o Estado (neste caso, o governo) tenderá a ir gastando dívida contraída a juros mais elevados, que depois pode substituir por outra mais em conta.Para já, o ministro das Finanças parece estar mais focado em reduzir o peso da dívida o mais possível, já que se trata do principal critério do Pacto de Estabilidade europeu (que impõe um máximo de 60% do PIB - Produto Interno Bruto.Este ano, o rácio deve descer para perto de 90% do PIB, em 2026, a meta do novo Orçamento do Estado (OE 2026) é chegar a 87,8%.Quanto mais depressa melhor e mais distante fica o país do tempo em que ocupou o famigerado pódio dos mais endividados da Europa e do mundo desenvolvido. Esteve em terceiro lugar durante anos. Evitar os empréstimos do PRROutra ferramenta para fazer baixar a dívida é tentar evitar essa modalidade de financiamento no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).O PRR português é um envelope avaliado em 22,2 mil milhões de euros, dinheiro que tem de ser executado até meados do ano que vem.Prevê 16,3 mil milhões de euros em subvenções (portanto, subsídios europeus, verbas a fundo perdido) mais 5,9 mil milhões de euros em empréstimos do Mecanismo de Recuperação e Resiliência.Acontece que as Finanças decidiram rever a parte dos empréstimos previstos para este ano: era para entrar um crédito de 1,2 mil milhões de euros, mas o governo decidiu reprogramar o plano e agora a dívida associada ao PRR para o ano corrente baixou até 500 milhões de euros. São menos 700 milhões de euros e mais uma ajuda significativa para reduzir o rácio da dívida de Maastricht.Miranda Sarmento disse há pouco tempo à Lusa que “o Governo está muito focado em usar o total das subvenções", "tentaremos usar os empréstimos, mas a prioridade é usar as subvenções”.Em declarações à agência Lusa, o governante explicou que será feita uma nova reprogramação do PRR português para que “os projetos financiados por subvenções, cuja execução não esteja assegurada até agosto de 2026, sejam colocados num fundo para a inovação, que depende do Banco de Fomento”.