As escolas internacionais são o novo produto estrela do imobiliário em Portugal, e com efeitos âncora no segmento residencial. A oferta não chega para responder ao mercado e os investidores acionaram o radar. Prova disso são os nove estabelecimentos de ensino com programas internacionais em processo de autorização no Ministério da Educação (ME), sete dos quais previstos para a Grande Lisboa. São investimentos de dezenas de milhões de euros e há mais na calha. As consultoras imobiliárias estão no terreno à procura de oportunidades que respondam aos critérios exigidos pelos investidores.A Athena Advisers está a trabalhar para um fundo de investimento internacional que pretende comprar ativos para instalar escolas internacionais nas duas principais cidades do país. “Levantou muitos milhões de euros para desenvolver estes projetos na Europa”, revela David Moura-George, diretor-geral da consultora imobiliária. O objetivo é adquirir edifícios adaptáveis às exigências de uma escola premium e, após intervenção, arrendar a um grupo de educação internacional. “Vamos assistir ao aparecimento de grandes marcas consolidadas de ensino”,acredita. Em Portugal, já estão presentes algumas destas instituições, como a Inspired, Artemis, Globeducate ou Dukes.A CBRE está também a trabalhar com potenciais investidores neste segmento de mercado. Segundo Filipa Lucena, associate director of capital markets, a consultora “tem estado envolvida na mediação de alguns projetos”. Apesar de serem negócios confidenciais, adianta que estão em curso aquisições envolvendo a expansão de grupos já estabelecidos, e outros de entidades que ainda não têm presença no país. Os investidores estão interessados “em espaços estratégicos que atendam às necessidades específicas das escolas, nomeadamente em termos de acessibilidade, visibilidade, potencial espaço para expansão e infraestrutura”. Mas também em comprar “escolas existentes e em funcionamento, com potencial de melhoria de gestão”, explica.A Cushman & Wakefield (C&W) tem “várias procuras ativas neste momento, para Lisboa e para o Porto”. Ana Gomes, partner, head of new business & alternatives da C&W, adianta que “a procura de espaço para a instalação de novas escolas internacionais continua muito elevada, sendo a oferta em condições adequadas relativamente limitada”. Os investidores querem zonas residenciais consolidadas, com bons acessos rodoviários e condições para criar espaços exteriores apelativos com áreas verdes e instalações desportivas, aponta. E também edifícios com poucos pisos.Boom em LisboaEste movimento começou a dar os primeiros passos na entrada do milénio, mas ganhou força em meados da última década. Desde o ano letivo de 2019/20 e até agora, entraram em funcionamento 15 unidades de ensino particular e cooperativo com oferta internacional em Lisboa e Vale do Tejo, revelou o ME. Esta região tem atualmente 33 escolas internacionais autorizadas. Em processo de aprovação, estão estabelecimentos para o Seixal, Lisboa, Sintra, Torres Vedras e Casca. Investimentos que vêm responder à necessidade das famílias estrangeiras residentes no país, mas também acompanhar o crescente interesse de cidadãos internacionais pelo território luso. Como sublinha David Moura-George, “a primeira pergunta dos nossos clientes [na Athena Advisers, são essencialmente internacionais] é ‘Onde fica a escola mais próxima?’”. Para Filipa Lucena, o investimento em novas escolas internacionais na Grande Lisboa deve-se “ao aumento significativo de famílias estrangeiras que se mudam para Portugal”, mas também pela “crescente procura das famílias portuguesas por escolas com ensino de currículo internacional, que preparam os alunos para um mundo globalizado”.Ana Gomes acrescenta ainda que a opção por estes estabelecimentos prende-se “por oferecerem um ensino de elevada qualidade e com mais inovação, aspetos cada vez mais valorizados por famílias que pretendem dar uma educação mais global aos seus filhos” e às “crescentes dificuldades na atração e retenção de professores no ensino público”, que podem originar “potenciais dificuldades de aprendizagem a médio e longo prazo e maior instabilidade e preocupação para as famílias”.Embora longe de ter a mesma expressão que se verifica na Grande Lisboa, também se registaram aberturas de escolas internacionais no restante território português. A região Centro recebeu, em 2017, o primeiro estabelecimento e, pouco depois, viu a oferta duplicar. Tem ainda um novo projeto em fase de autorização. No Algarve, entrou em operação um novo colégio em 2019, reforçando a oferta total para sete unidades. A região tem também uma intenção de abertura em apreciação no ME. No Norte, estreou-se uma nova escola no ano letivo de 2023/24, contando a região com seis unidades. Segundo Filipa Lucena, os investidores podem ser os próprios operadores das escolas, que possuem capital para expandir, Sociétés Civiles de Placement Immobilier francesas ou fundos de infraestrutura, que têm um foco especial na aquisição de ativos com impacto social. Ana Gomes confirma: “são marcas estrangeiras que fazem investimentos diretos nos espaços que ocupam, mas também investidores imobiliários nacionais e estrangeiros, institucionais ou não, que procuram, cada vez mais, investimentos no imobiliário vulgarmente chamado de alternativo”.Exemplo disso, foi a compra dos edifícios da antiga fábrica de massas A Napolitana, em Alcântara, Lisboa, pelos investidores imobiliários RFR Holding LLC e CGC, que celebraram um contrato de arrendamento de longa duração com o grupo Artemis Education. Na aquisição e de adaptação do empreendimento, foram despendidos mais de 50 milhões de euros. Já o grupo Inspired tem pautado a sua ação em Portugal por investimentos de raiz e por aquisições. O King’s College School - uma das marcas da Inspired -, em Cascais, representou um custo de 45 milhões. O grupo já tinha adquirido o St. Peter’s International School, em Palmela. Hoje, tem seis estabelecimentos de ensino no país.David Moura-George chama a atenção para a valorização da zona residencial onde é instalado um colégio internacional. Segundo este especialista, a abertura da Redbridge, em Campo de Ourique, Lisboa, levou a uma “valorização dos imóveis entre 10 a 15%”. As escolas são, atualmente, “uma âncora do imobiliário a nível mundial” e há “movimentos de fundos imobiliários para estabelecer essa classe de ativos”, diz. Esses fundos conseguem uma rentabilidade da ordem dos 6% a 7% com o arrendamento dos edifícios às marcas de ensino.Novos negóciosA atratividade do país, para já ainda muito focada na Grande Lisboa, levou ao surgimento de novos negócios. Nathalie Willis-Davis fundou há cinco anos a Tendoria, uma empresa que apoia famílias e alunos a escolher escolas em Portugal e Espanha. E, diz a responsável, é contactada um ano antes de as famílias migrarem para Portugal, e às vezes até dois anos antes da decisão. Na primeira vaga, Nathalie Willis-Davis teve contactos de muitos ucranianos, russos, israelistas, brasileiros, chineses. Desde a pandemia, são os americanos que mais procuram as escolas internacionais em Portugal. Normalmente, são famílias com filhos menores de 14 anos.“É um mercado em crescimento, procurado por cidadãos internacionais, mas também por portugueses que querem ser fluentes em inglês para aceder a universidades no estrangeiro”, sublinha. As propinas não estão ao alcance de todos. A frequência anual vai dos 14 mil euros (ensino primário), passando pelos 19 mil (do 6º ao 10º ano) até atingir os 25 mil (International Baccalaureate), a que se soma ainda uma verba para a reserva de vaga e a matrícula.De acordo com o ME, havia 7130 alunos portugueses a frequentar planos de estudo estrangeiros no ano letivo 2023/24 (dados ainda provisórios), liderando de forma expressiva o ranking das principais nacionalidades que frequentam este ensino. O segundo lugar era ocupado pelos franceses (1683 estudantes), seguindo-se os espanhóis (1026), os britânicos (818), americanos (808) e, a fechar a lista das seis origens mais representadas, os alemães (663). No total, estavam matriculados 16 668 alunos em planos de estudo estrangeiros em Portugal (as escolas podem ter também alunos do sistema educativo nacional, mas esses não estão contabilizados neste número).