"O Orçamento vai passar. A questão é saber o que vai sair das negociações"

No dia em que o governo volta a reunir-se com BE, PCP e PAN para garantir a viabilização do Orçamento do Estado, o economista e ex-deputado Trigo Pereira apresenta um livro sobre os riscos do declínio da democracia e o que fazer para evitá-lo.

O Orçamento do Estado para 2021 (OE 2021) vai passar no parlamento, mas ainda falta saber com que alterações à proposta do governo. A convicção é do economista e ex-deputado eleito pelas listas do Partido Socialista, Paulo Trigo Pereira. "Estou convencido de que este Orçamento vai passar. Não se sabe como, mas vai passar", antecipa Trigo Pereira. "A questão é o Orçamento que vai sair destas negociações e esta incerteza nas próprias medidas e na estabilidade política", acrescenta o professor do Instituto Superior de Economia e gestão (ISEG) que apresenta nesta terça-feira (20 de outubro) o livro Democracia em Portugal: como Evitar o Seu Declínio?, da Almedina, uma reflexão sobre os quatro anos que passou no parlamento.

Para o economista o "governo já fez uma série de cedências ao Bloco de Esquerda (BE), nomeadamente. E ainda não temos uma posição do BE em relação ao Orçamento e isto é precisamente aquilo que considero no livro indesejável: haver governos minoritários sem no mínimo acordos de coligação parlamentares", frisa em entrevista ao Dinheiro Vivo.

Mas acredita que uma crise política está afastada. "Isso fragiliza a estabilidade política. Estou convencido de que não vai haver uma crise política iminente", aponta.

Este é um dos pontos centrais do livro. "As democracias maduras não funcionam assim: com governos minoritários sem acordos, funcionam com coligações. A maioria das democracias europeias funciona com coligações, logo à partida", frisa o académico, lembrando que a existência de um acordo escrito foi um dos elementos de "sucesso da geringonça". O outro foi a elaboração de um cenário macroeconómico com um conjunto de especialistas, incluindo o próprio Paulo Trigo Pereira e Mário Centeno, que viria a assumir a pasta das Finanças. O documento foi apresentado ainda antes das eleições legislativas de 2015.

Orçamentos ingeríveis

Ao problema da instabilidade, o académico junta um longo e exaustivo processo orçamental cada vez mais "complexo". "O problema é que o processo orçamental vai tornar-se ingerível, porque o número de artigos dos Orçamentos do Estado tem aumentado substancialmente e o número de propostas tem aumentado exponencialmente", explica o professor universitário, lembrando o que designa de "cavaleiros orçamentais".

"São normas que não têm implicação nenhuma do ponto de vista orçamental, nem na receita nem da despesa - mas que estão inseridas. E algumas são até surreais porque interferem na própria competência executiva do governo, como por exemplo a linha circular do metro de Lisboa", lembra.

O ex-deputado insiste que esta catadupa de propostas também decorre do facto de ser um executivo minoritário. "São promessas feitas ao partido A ou B e que para que sejam mais sólidas aparecem no Orçamento do Estado, mas não deveriam lá estar", recordando o caso do Orçamento para este ano que teve um recorde de 1300 propostas de alteração. "Ao analisar o Orçamento do Estado, e o facto de ser cada vez mais complexo, leva a situações caricatas em que os deputados, à última hora, não sabem o que estão a votar na especialidade - e não sabem porque é impossível", indica.

"Tudo isto também não fortalece a democracia, não fortalece a razoabilidade da tomada de decisão política", conclui.

O primeiro-ministro reúne-se hoje com Bloco de Esquerda, PCP e PAN para procurar um acordo para a viabilização da proposta do governo de Orçamento do Estado para 2021.

Amanhã, de acordo a agência Lusa, António Costa terá um encontro também sobre o Orçamento do Estado com o PEV, outro dos parceiros parlamentares do PS na anterior legislatura, juntamente com o BE e o PCP.

Paulo Ribeiro Pinto é jornalista do Dinheiro Vivo

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