Se sorrir é o melhor remédio, o avançado português Cláudio Braga não poderia estar mais saudável. Um dos goleadores dos Hearts of Midlothian, surpreendente líder invicto do campeonato escocês após onze jornadas disputadas, o camisola dez da equipa de Edimburgo e natural de Mafamude (Vila Nova de Gaia) viu sua vida mudar completamente nos últimos meses. Autor de nove golos e uma assistência e atleta do mês do clube em setembro e outubro, Braga viu o seu nome viralizar em Portugal recentemente, quando a música dos adeptos dos Hearts em sua homenagem (uma versão de Radio Ga Ga, dos Queen), chegou ao seu país. A partir daí, foram entrevistas como esta e páginas futebolísticas a divulgarem a boa fase do craque - e, assim, atender todas as chamadas passou a ser tarefa difícil. ."Graças a Deus", ri ao falar da fama em conversa com a reportagem do DN. "Por um lado é bom ser reconhecido, significa que estou a ter sucesso. Por outro, é algo que não estou nada habituado, portanto é um pouco complicado de gerir", explica o avançado de 26 anos, cujo trajeto de formação incluiu clubes como Candal, Boavista, Paços de Ferreira ou Rio Ave e que deixou o país natal em 2022, após um início de carreira profissional com passagens efémeras por CD Fátima, Valadares, SC Ideal e Vila Meã, todos do Campeonato de Portugal, para se aventurar na Noruega. No país nórdico, a trajetória foi sinuosa, porém recheada de aprendizagem. No primeiro ano atuou pelo Moss, da terceira divisão, chegando logo ao título. Depois, assinou pelo Aalesund, onde atuou por um ano e meio até chamar a atenção dos escoceses. "A Noruega foi uma experiência dura pelo lado pessoal: vivi sempre sozinho, longe da família, num país frio e com cultura diferente, mas foi muito importante para o meu crescimento. No segundo clube, o Aalesund, foi a primeira vez que senti que tinha chegado a um nível profissional a sério. Tinha um ordenado profissional, jogava num estádio para dez mil pessoas, chef privado para o clube com almoço e pequeno almoço... era uma equipa de primeira liga que estava na segunda", conta. As boas atuações em solo norueguês, país para o qual se mudou por ver a carreira estagnada em Portugal, mesmo com boas atuações na quarta divisão, fizeram os Hearts ficarem de olho em Cláudio Braga e avançar para uma negociação que foi concluída em junho deste ano. Desde então, o casamento entre equipa, Cláudio Braga e adeptos tem sido perfeito. "Começou logo na minha apresentação", relembra ao falar do carinho dos fãs, que esgotam os 20.000 bilhetes disponíveis a cada partida no Tynecastle Park. "Eu não conseguia parar de sorrir, estava genuinamente muito feliz por dar aquela entrevista na apresentação. Acho que a partir daí os adeptos começaram a ter afeição por mim. Ouvi muitos deles me dizerem que fazia tempo que não viam um jogador do Hearts a sorrir tanto", revela o português, que já é reconhecido sempre que sai à rua em Edimburgo. .Líder no campeonatoAlém da alegria de Braga, a fase impressionante da equipa ajuda. São nove vitórias e dois empates em onze jornadas, o que faz os comandados do treinador Derek McInnes liderarem o campeonato com nove pontos de vantagem para o segundo colocado, o Celtic, que tem uma partida a menos que os Hearts. Por falar em Celtic, tanto o emblema alviverde de Glasgow quanto o seu rival Rangers, clubes que dominam o campeonato local há 40 anos, já provaram do veneno deste possivelmente histórico Hearts. Nas partidas contra as duas principais equipas de Glasgow, a equipa de Cláudio Braga venceu ambas (2 - 0 com o Rangers e 3 - 1 com o Celtic), mostrando que quer mesmo repetir o feito do Aberdeen comandado por Alex Fergunson em 1984/85, último campeão da liga antes da dinastia Celtic/Rangers. "Com o Celtic foi muito especial, um dos maiores clubes contra quem já joguei, e com o Rangers, fora de casa, no Ibrox Park com mais de 50 mil pessoas, também foi top", diz o avançado que ainda lembra com carinho de uma outra partida, disputada ainda na pré-época. "Enfrentámos o Sunderland, ganhámos 3 - 0 e fiz um golo contra uma equipa da Premier League. Senti que podia jogar naquele nível. Claro que era apenas um amigável, mas eles também queriam ganhar e fomos melhores do que uma equipa que agora está muito bem no campeonato inglês", diz Braga, recordando a boa forma do Sunderland, atual quarto colocado na Premier League. Contratado por scouting de IAO sucesso dos The Jam Tarts, 'tortinhas de geléia', alcunha do clube escocês, tem explicação. O português conta que, assim como aconteceu com ele, diversos outros atletas foram recrutados através de um inovador programa de análise de desempenho com auxílio de Inteligência Artificial, o Jamestown Analytics. "Não é uma forma normal de scouting. Tony Bloom, que é o dono do Brighton, Como e Union St. Gilloise, agora também é sócio minoritário aqui no Hearts, e é o único que tem acesso a essa forma de recrutar. Consegue recrutar atletas com potencial, mas se calhar por valores baixos. Portanto não fui só eu a chegar, mas todos os que vieram estão a fazer ver que realmente dá para jogar neste nível", sublinha. Por falar em nível técnico, a diferença entre o futebol na segunda divisão da Noruega e o primeiro escalão escocês foi algo que assustou Braga num primeiro momento. "Fiquei um bocado assustado com o nível de qualidade. Apesar de eu saber que podia ser capaz de jogar a este nível, treinar com atletas que já jogaram na Premier League, com muita experiência, muita qualidade, fizeram-me pensar, num primeiro momento, que estava lixado", recorda o bem-humorado goleador..Os primeiros meses em solo escocês, no entanto, têm provado o contrário. Querido pelos adeptos e com boas atuações, Braga viu na Scottish Premiership a forma perfeita de encaixar o seu estilo de jogo. "Foi um salto muito bom para mim em diversos aspetos, desde poder estar mais perto de casa, ir mais a Portugal e os meus parentes virem mais me ver, até dentro dos relvados. Acho que a liga escocesa fica perfeita no meu estilo de jogo. A liga é muito intensa, não se para de correr e o jogo é sempre muito agressivo. Bem, eu também sou um jogador intenso e agressivo: então foi o encaixe perfeito para acontecer", diz o avançado.Trilhando um caminho de sucesso que parecia difícil ao deixar a Vila Meã há três anos, Cláudio Braga, apesar de manter o sonho de chegar ao mais alto que puder na carreira, fala de desfrutar o momento com os Hearts, uma fase que ainda parece "não estar a acontecer", segundo o craque. "É como sonhar acordado", diz."Claro que tenho ainda muitos outros sonhos até chegar ao ponto mais alto possível da minha carreira e, neste sentido, a Premier League é a melhor liga do mundo. Sonho com isto, com a seleção nacional [comemora os golos como Cristiano], com a Champions League, ou seja, as principais competições, como qualquer jogador sonha. Mas neste momento estou tão bem aqui, que nem penso nisso, quero aproveitar. Acredito que se porventura acontecer algum feito histórico aqui neste clube, talvez possa até vir a ser uma coisa até maior do que chegar a jogar nesses outros níveis", finaliza.nuno.tibirica@dn.pt.Ansu Fati reencontra o bom futebol no Mónaco e volta a sonhar com a seleção espanhola.Lesões, concorrência e extracampo: como Endrick foi do estrelato ao ostracismo no Real Madrid