Miguel Araújo lança novo álbum de inéditos no dia 1 de janeiro de 2026.
Miguel Araújo lança novo álbum de inéditos no dia 1 de janeiro de 2026.D.R.

Miguel Araújo: "Sinto uma espécie de obrigação perante a música de nunca parar de trabalhar”

'Por Fora Ninguém Diria' é o novo álbum do cantautor que estará nas plataformas a partir de 1 de janeiro de 2026. Músico prolífico, tem outros dois discos quase prontos e mais um a meio do caminho.
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Contra o que o marketing da indústria da música aconselha, Miguel Araújo vai lançar o seu novo álbum de inéditos, Por Fora Ninguém Diria, numa quinta-feira, um feriado, “mas não ligo nada a isso”, diz o cantautor, que não compõe a pensar em álbuns ou em pessoas (há artistas que lhe pedem canções). O músico tem uma rotina diária de trabalho, porque, diz ao DN, “se uma pessoa quer a terra lavrada tem que empurrar o arado”. E assim acaba o ano com 80 canções novas.

As primeiras datas ao vivo de apresentação de Por Fora Ninguém Diria já estão confirmadas, dia 14 de fevereiro no Teatro Municipal de Vila Real, 12 de março no Convento de São Francisco, em Coimbra, 24 e 25 de abril no Teatro Municipal da Guarda e 30 de abril no Theatro Circo, em Braga.

Nos concertos, e pela primeira vez, revela Miguel Araújo ao DN, estarão à venda postais das canções, com as letras e os créditos das músicas por trás, um para cada canção.

O novo álbum chama-se Por Fora Ninguém Diria, de onde vem o nome? Ninguém diria que estas onze músicas iam dar um álbum?

O nome vem de uma frase da primeira música que se chama Meia Vida. Andei até à última sem título, e estava a ouvir o disco, já com tudo pronto, já tudo masterizado, tudo finalizado, e a frase saltou-me como uma frase enigmática e misteriosa o suficiente para ter todas as explicações possíveis, ou seja, nenhuma.

Disse que as canções foram gravadas ao longo de 2023, 2024 e 2025, como é percebeu que poderiam dar um disco? O que é que lhes dá coerência?

Desde que tenho o estúdio em casa, desde finais de 2018, que tenho uma ética de trabalho que é ir trabalhando quase todos os dias em pedacinhos de ideias, coisas soltas, algumas coisas mais concretas, umas mais acabadas, outras menos. E vou gravando. Vou gravando assim numa perspetiva descomprometida, sem estar muito a pensar se aquilo depois um dia vai ser editado ou não. E às vezes faço uns balanços, passo manhãs a ver o que tenho. E estas tinham alguma ligação entre si, a temática. O disco fala sobre separação, as músicas têm todas elas algum ângulo sobre esse processo, seja de uma pessoa com quem se teve uma relação amorosa, um amigo, ou alguma outra coisa, mas as músicas têm todas isso. Algumas têm uma coisa que é o pós-separação, a esperança que aí vem. E conclui de uma maneira mais filosófica com a última música que é Eu Não Vou Mudar. E de repente surgiu um fio condutor entre estas todas e resolvi acabá-las. Algumas já estavam bastante acabadas, outras acabei em função deste fio condutor que entretanto constatei. Já tenho o disco pronto há quase um ano e agora tenho o seguinte também praticamente pronto. Já não ouvia este há muito tempo e como hoje ia ter três entrevistas, fui dar a minha corridinha habitual e fui ouvir o disco e fiquei muito contente, porque de facto era o que eu queria fazer.

O disco fala sobre separação, as músicas têm todas elas algum ângulo sobre esse processo, seja de uma pessoa com quem se teve uma relação amorosa, um amigo, ou alguma outra coisa, mas as músicas têm todas isso.
Miguel Araújo

Optou por lançá-lo só agora, no início de 2026, porque teve outros lançamentos entretanto?

Sim, lancei um EP de duetos chamado Cê Barra que tem quatro músicas em dueto, com Os Quatro e Meia, Rui Veloso, António Zambujo e João Só. Estou sempre a mostrar as músicas novas aos meus filhos e o meu filho do meio disse pai, tu não andarás a fazer spam de músicas? Então adiei para 2026 para não fazer spam de lançamentos. Para não encavalitar os lançamentos uns nos outros, e porque acho uma certa piada sair no dia 1 de Janeiro. Não é um dia bom para sair. Em teoria, todas as diretivas do marketing musical dizem para se lançar às sextas e o dia 1 não é uma sexta. Dizem para não se lançar em feriados, e o dia 1 é um feriado. Dizem para evitar essas datas muito marcantes, como o primeiro dia do ano, mas eu não ligo nada a isso.

Gosta da sua liberdade, foi por isso que se desvinculou da Warner? Não se arrepende disso?

Não, não me arrependo de nada, dá-me imenso conforto ser o total dono dos direitos das minhas músicas e agora sou. Desde que saí da Warner, em 2017, e durante oito anos, as músicas que eu lancei lá ainda estavam vinculadas a eles em termos de direitos, e desde abril deste ano que já sou o total dono delas. E acho isso ótimo por mil razões, por isso não me arrependo, pelo contrário, fico muito contente. Mas eu insisto sempre, quando me fazem essa pergunta, em referir que eu tive sempre uma relação ótima na Warner e sempre tive muita liberdade para fazer o que me apetecia, e basta olhar para os meus discos lá na Warner, que são os meus três primeiros, para se perceber isso. Eles não têm muito a ver uns com os outros, cada um segue a sua própria viagem.

Desde que saí da Warner, em 2017, e durante oito anos, as músicas que eu lancei lá ainda estavam vinculadas a eles em termos de direitos, e desde abril deste ano que já sou o total dono delas.
Miguel Araújo

No novo álbum toca todos os instrumentos. É porque lhe dá prazer, ou porque acha que só assim as coisas ficam como quer?

Não, eu não tenho essa regra, tanto assim que o disco anterior, o Chá Lá Lá foi feito com dezenas de músicos a tocar, toda a minha banda, etc. Depois o anterior ao Chá Lá Lá, o Peixe Azul, já é do género deste, eu a tocar tudo. Vou variando, gosto muito de trabalhar em equipa, mas também gosto muito de trabalhar sozinho, principalmente em músicas que me deixam mais inseguro, que eu ainda não sei bem como é que elas são, que foi o caso destas onze todas, em que eu precisei de estar ali sozinho, a ver como é que seria o baixo, como é que seria o piano, como é que seria a bateria. Não sou nenhum virtuoso em nenhum desses instrumentos, no entanto, às vezes também é bom, não é? Gosto de andar ali a fazer um trabalho de laboratório, muito demorado, em que as coisas demoram tanto e eu sou tão obcecado e tão perfeccionista, que seria muito chato para qualquer outra pessoa estar ali ao meu lado, e então vou fazendo isso com o Bruno Pereira, que é o engenheiro de som que está comigo no meu estúdio, em que ele, com uma paciência infinita, deixa-me repetir duzentas vezes as mesmas coisas, depois deixa-me recomeçar a música do início, algumas ficam ao primeiro take outras ao milésimo take, isso não interessa. E depois há muitos discos que eu adoro, como por exemplo o primeiro disco de Paul McCartney, o McCartney 1, de 1970, em que ele toca os instrumentos todos, e é um disco muito descomprometido com enganos, com muitas arestas por limar, e estes meus discos que são assim também têm esse lado de que gosto, principalmente numa altura em que já há muita música a ser feita por inteligência artificial e maquinaria e robótica. Gosto do facto de ter feito um disco em que foi tudo tocado através das minhas mãos, exceto a harmónica - que a harmónica é com a boca.

Quando diz que este disco retoma o processo criativo de trabalhos como Cinco Dias e Meio e Peixe Azul, está a falar no facto das versões finais serem muito próximas das maquetes?

Sim, é exatamente isso, o Cinco Dias e Meio foi um disco feito dessa maneira, mas foi feito em cinco dias e meio, como o próprio nome indica, foi feito à flor da pele, que criativamente e em termos de processo artístico também é interessante. Depois, o Peixe Azul foi feito mais ou menos da mesma maneira, mas num tempo mais alargado, e agora este, Por Fora Ninguém Diria, acabou por se tornar um disco feito por mim mas com uma produção mais cuidada, coisa que os outros não têm.

É por isso que está a revisitar alguns desses álbuns antigos, fazendo novas misturas?

Não, isso teve a ver com a minha saída da Warner, é uma questão técnica e prática, quando se desvincula com uma editora, passados esses oito anos - no meu caso eram oito anos -, para aquilo ficar totalmente do meu lado tenho que tirar o disco e voltar a pô-lo no Spotify e nessas redes todas, é assim que se faz. E eu pensei, então, se vou tirar e voltar a pôr, mais vale pôr com umas misturas melhores, porque na altura as coisas foram feitas sem meios e à pressa, principalmente esses meus três primeiros discos. Então aproveitei, porque já sabia que este dia viria, abril de 2025, e andei um ano e tal a preparar novas misturas, novas masterizações que em nada desvirtuam o disco original. Acho que a maior parte das pessoas nem nota, mas a mim fazia-me uma certa comichão as coisas terem sido feitas com essa pressa e com essa falta de meios, e aproveitei para me reconciliar com esse passado. Fiz questão de não regravar nada, não substituir nada, poderia incorrer na tentação de regravar, mas não fiz nada disso, as pistas são as originais, eu apenas dei um jeitinho. Eu não, quem sabe, o João Bessa no caso dos dois primeiros e o Guilherme Afonso no caso do Giesta. E este foi o disco que deu o maior salto entre o que estava e o que acabou por estar agora.

E vai fazer isso a mais discos?

Acho que sim. Antigamente era impossível ir às casas das pessoas todas que tinham comprado os discos e substituir-se por um revisto. Mas hoje em dia, com estas plataformas, é possível, tanto que muita gente faz isso, os Beatles fazem isso, uma pessoa vai à discografia dos Beatles tem o Abbey Road 2024, tem o Abbey Road 2019, eles vão sempre revendo e pondo coisas novas, no caso deles vão deixando as versões antigas para trás, eu acho que não tenho esse estatuto, não valia a pena estar a complicar a minha discografia com versões praticamente iguais aos discos. Por isso, respondendo à pergunta, eu acho que irei fazer isso, o Peixe Azul será o próximo.

Andei um ano e tal a preparar novas misturas, novas masterizações que em nada desvirtuam o disco original. Acho que a maior parte das pessoas nem nota, mas a mim fazia-me uma certa comichão as coisas terem sido feitas com essa pressa e com essa falta de meios, e aproveitei para me reconciliar com esse passado.
Miguel Araújo

O novo álbum é lançado nas plataformas digitais no dia 1 de janeiro e depois haverá uma edição limitada em vinil e em CD. Porquê é essa opção?

As pessoas gostam e respeito isso. Eu não tenho CDs, nem vinis, eu nunca tive um vinil na vida, nunca tive um gira discos, não sei sequer pôr um vinil a tocar, nunca baixei uma agulha sobre um pedacinho de vinil, nem sei como é que isso se faz, não havia em minha casa. Tive centenas de CDs, mas acabei por oferecê-los, deixei de ter leitor. Não tenho essa ligação afetiva com os objetos, mas muita gente tem, e eu respeito muito isso, e muita gente pede. Quando eu estava mais que decidido a só lançar versões digitais dos meus álbuns, o coro de vozes que se insurgiu contra isso e que pediu, quase que exigiu, que existissem vinil e CD foi grande o suficiente para eu aceder a isso. Demora como o diabo fazer um vinil, demora meses, não ficou pronto a tempo de dia 1, vai sair um pouco mais tarde, mas vai ser em janeiro ainda. O que também vai haver, que não está ainda anunciado, mas posso dizer aqui em primeira mão, é a venda de uns postais nos concertos, tantos quanto as músicas, são onze músicas e há onze postais, todos diferentes, que por trás têm a letra, têm os créditos, têm aquela informação toda que as pessoas gostam de ter. É quase como se fosse o libreto de CD, mas sem CD e sem caixa. Então vão ser baratinhos, os postais, porque não têm nenhum CD, vinil ou cassete, não têm nada, são só postais que as pessoas podem comprar em separado ou em conjunto, que vão estar à venda nos concertos depois da apresentação do disco, e depois também no meu site. Os postais vão ficar muito bonitos, foram concebidos pela Marta Pina e a Maria João Barbosa.

As fotografias do disco retratam o Miguel Araújo num hotel em Ofir, ligado à sua infância. O álbum tem alguma coisa de autobiográfico?

A Marta Pina escolheu esse sítio porque ela gostava muito, e foi uma coincidência muito engraçada, era um sítio onde eu ia muito em miúdo com os meus pais, os meus pais tinham lá uma casa, na praia de Ofir, e mais coincidência ainda, os meus pais, em solteiros, ainda antes de serem sequer namorados, antes de se casarem, iam com os respetivos pais, portanto, os meus avós, para esse hotel. Existem umas filmagens do meu avô materno - que já tinha uma câmara de filmar de 9mm -, do meu pai e da minha mãe nesse hotel. E por isso achei ótimo a Marta ter, por coincidência, escolhido esse hotel, porque é muito bonito, tem uma arquitetura muito original, é um hotel muito especial mesmo. Essa escolha batia certo com a minha infância, sendo que o disco não tem nada a ver com a minha infância nem com nada disso, é só uma capa, é só um suporte fotográfico.

Capa do novo disco de Miguel Araújo em vinil.
Capa do novo disco de Miguel Araújo em vinil.

Os concertos do próximo ano serão para apresentar o novo álbum?

Não, eu não faço isso, vou fazer alguns do disco, mas cinco ou seis só, sete, no máximo. E depois gosto que os meus concertos sejam uma coisa que não se prenda a nada, tenho o meu reportório, que tem 20 anos, 21, e gosto de não me prender a disco nenhum, vou variando. Eu não divido a minha a minha faceta de palco pelos discos, já há muitos anos que eu não faço isso. Gosto de fazer alguns concertos de apresentação para quem realmente gosta e quer ouvir, e depois volto para a estrada com um concerto em que não penso em nada disso, algumas dos discos vão estar, outras não, algumas dos discos presentes também vão estar, só dá para tocar cerca de 20 músicas num concerto ou até menos, por isso não ia fazer com que 11 fossem só do disco novo.

Este ano foi cheio em concertos. Gostaria de fazer ainda mais em 2026?

Não. Eu cantava também nos Azeitonas e com os concertos meus, a solo, em simultâneo, chegava a fazer 90 ou 100 num ano e decidi que não era vida para mim. Reduzi drasticamente para 50 por ano, o que já é muito, e agora tenho um teto de 50, portanto, o 51º já não se marca. E tenho feito sempre isso, 50 concertos, já há muitos anos que faço consistentemente esse número de concertos. Em 2026 já devo ter uns 20 e tal marcados, há de ser igual, há de ser algo como 50, para mim é saudável fazer isso, mais do que isso já começa a não ser saudável.

Os concertos são fundamentais para rentabilizar um álbum?

Sim, a grande fonte de rendimento dos músicos é o palco, e eu não sou exceção disso, direitos de autor e palco. Direitos de autor é uma coisa diferente de royalties, direitos de autor é o facto de ter sido eu a fazer as músicas que faço, não só para mim, mas também para outros, e as passagens em rádio, as passagens nos concertos, tudo isso gera direitos de autor. No meu caso as minhas fontes de rendimento principais são o palco e os direitos de autor, mas eu não faço música a pensar nisso.

Também fez música para telenovelas...

Fiz uma especificamente para um genérico que se chama Bem Me Quer e é cantada pela Joana Almeirante, aí sim, fiz especificamente para a telenovela, porque era a música do genérico e mandaram-me o guião, com o personagem. De resto, há músicas que uma pessoa lança e as telenovelas pedem para incorporar na novela e algumas minhas já têm ido para lá, mais recentemente Lá vai Sofia, que está numa novela chamada Herança. Mas não foi feita para a novela, essa música.

A rádio e até as telenovelas são importantes para a divulgação da música junto de um público mais vasto?

Talvez, eu faço as minhas músicas depois há uma ou outra que de vez em quando salta para a rádio, salta para aqui, salta para ali, e ficam mais conhecidas. Mas na medida em que eu não controlo essa parte, não controlo que músicas é que dão na rádio, não controlo que música é que vai para novelas, foco-me nas músicas e mais nada. Depois edito-as com a maior dignidade que conseguir, e a partir daí já não é comigo.

Tenho muita dificuldade em escrever por empreitada. Fiz uma música para uma telenovela, mas é muito raro eu conseguir fazer isso, seja qual for o pedido que me façam.
Miguel Araújo

O Miguel Araújo também faz muitas colaborações com outros artistas. São importantes para si essas parcerias com outros músicos?

Gosto, sempre gostei, qualquer músico gosta, não pela parceria em si, aquela coisa de me juntar a um cantor muito famoso só para eu e ele ou eu e ela beneficiarmos do público um do outro, eu isso nunca fiz. Junto-me naturalmente com pessoas que vão ficando minhas amigas ao longo destes anos, por isso já fiz colaborações com aqueles que são os meus amigos na música, Os Quatro e Meia, o Zambujo, o Rui Veloso, o João Só, a Mafalda Veiga também, nunca me lembrei de convidar alguém que eu não conheço pessoalmente para participar comigo em música.

Continua também a escrever músicas para outros artistas?

Sim, eu quando escrevo não estou propriamente a pensar em para quem são as músicas, mas quando me pedem vou ver o que é que tenho, alguma música que eu veja que se adequaria àquela voz e às vezes até altero umas coisas para se adequar mais ainda, mas é uma coisa que eu faço sempre, tenho sempre gente a pedir músicas. Tenho muita dificuldade em escrever por empreitada. Fiz uma música para uma telenovela, como disse, mas é muito raro eu conseguir fazer isso, seja qual for o pedido que me façam. Não é assim que as músicas me nascem. Por exemplo, acho que não é inconfidência, o Luís Trigacheiro pediu-me uma música, mas tem que ser assim e assado, tem que caber no conceito das outras e tal, e eu tenho muita dificuldade em fazer isso. Tanto que ele ficou de me mandar as outras do disco para eu ouvir. Agora posso é ter lá para trás uma música já feita que encaixe naquele contexto e depois trabalhamos a partir daí. Mostro-lhe e fazemos as alterações que forem precisas.

Estou a pensar fazer um disco - até para desenjoar desta loucura de música feita por inteligência artificial que está aí a entrar na indústria -, de voz e guitarra, tenho andado a trabalhar nisso, num disco só com voz e guitarra, e mais nada.
Miguel Araújo

Como é um dia típico quando não está num concerto?

Hoje foi assim: acordei, deixei os meus filhos na escola às 8h10, depois começo logo a trabalhar. Na primeira parte da manhã estou aqui no meu sofá a rever coisas, a acabar pedacinhos, depois lá para as 9h30 o Bruno Pereira chega e eu desço para o estúdio e dedico-me a gravar, às vezes ainda não tenho a letra da música, mas gravo na mesma. O Mark Knopfler dizia que se uma pessoa quer a terra lavrada tem que empurrar o arado. E é isso, sinto que é uma rotina que tenho que ter, uma espécie de obrigação perante a música de nunca parar de trabalhar, e é isso que eu faço. É essa a razão de eu ao fim do ano ter 80 músicas novas e os meus filhos ficarem com a sensação de que ando a fazer spam de músicas. Sinto que é isto que tenho que fazer e é uma coisa que adoro fazer, é uma sorte enorme uma pessoa gostar do que faz e eu ando há 20 anos e ainda não me fartei, gosto mais agora até de como gostava antes.

O que é que o inspira mais ultimamente? De onde é que vêm as ideias?

As ideias aparecem quando querem, é uma coisa inexplicável, não se faz uma música do nada, mas faz-se uma música a partir de uma ideia, seja musical, seja de uma letra, e essa ideia, na minha maneira de trabalhar, é que depois comanda o resto do trabalho. Ou seja, tudo o que eu faço é respeitar essa ideia, não desvirtuá-la, não inventar nada por cima daquilo, porque as ideias aparecem-me muito cristalinamente, ouço as músicas na cabeça, e é só não estragar o que ali está. Não me compete pensar sequer se gosto ou se não gosto, ou se devia ser assim ou assado. Essa tentação eu não deixo que interfira no meu trabalho, por isso é que eu estou sempre a trabalhar.

Como já referiu, já tem outro lote de canções para outro álbum...

Até tenho mais, tenho três lotes que dão três álbuns, mas um dia inteiro não me chega, trabalhar todos os dias das 9 às cinco não me chega.

Quando é que em princípio lançará outro?

Não sei, estou a pensar fazer um disco - até para desenjoar desta loucura de música feita por inteligência artificial que está aí a entrar na indústria -, de voz e guitarra, tenho andado a trabalhar nisso, num disco só com voz e guitarra e mais nada. Mas não sei se vai ficar assim.

Com músicas inéditas?

Sim, claro, mas não sei, eu não posso dizer, porque depois o processo em si altera a consequência e depois começa-me a dar outras ideias e eu deixo-me levar. Mas já tenho muita coisa nova, já tenho um disco inteiro, um disco inteiro de uma parceria com o Joel Cleto, o historiador e arqueólogo do Porto, músicas sobre as lendas do Porto, tenho isso já praticamente acabado. Depois tenho esse disco mais acústico também praticamente acabado, no sentido em que as músicas estão feitas e já gravadas da minha parte, mas não sei ainda mais o que é que vou meter. E tenho um disco um bocadinho mais pop, diria mais produzido, mais como o Chá Lá Lá, também já com oito ou nove músicas, já a meio do caminho. Vou andando, a minha mãe pergunta porque é que eu não paro um bocado, mas o que é que eu ia fazer?

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