Um ator em discreto estado de graça.
Um ator em discreto estado de graça.

Mark Ruffalo, um detetive com bom coração

Nova minissérie do criador de 'Mare of Easttown', 'Task' dá ao brilhante ator norte-americano o protagonismo numa história de crime, encruzilhadas e compaixão. Está disponível na HBO Max.
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Já lá vai o tempo em que Mark Ruffalo vestia a pele de detetives enérgicos e sedutores, capazes de se enfiarem na cama de testemunhas com o calibre de uma Meg Ryan (In the Cut - Atração Perigosa) ou perseguir obcecadamente assassinos em série (Zodíaco). Eram outros mundos, outras idades. Agora o que salta à vista é mais a expressão cansada, uma barriga ligeiramente proeminente e um toque de bondade, que parece ter pouca relação com o título Task. E porém... é ele a admirável figura de proa nesta nova minissérie de Brad Ingelsby, um agente do FBI, Tom, chamado a liderar uma equipa de investigação em torno de uma onda de assaltos violentos, que o levará a cruzar-se com Robbie (Tom Pelphrey), um pai de família apanhado nas redes do crime.

Em estreia esta segunda-feira, dia 8, na HBO Max, Task desvia-se de um certo padrão heroico americano ao revestir de características invulgares o seu detetive. Ou como contou aos jornalistas Brad Ingelsby, na conferência de imprensa via zoom em que o DN participou (e que previa a presença de Ruffalo, cancelada à última da hora): “A primeira coisa que disse ao Mark [Ruffalo], quando conversei com ele sobre a personagem, foi que o seu agente do FBI não teria nenhuma qualidade especial: nem a pegar numa arma nem a seguir pistas que algures escaparam a outros agentes. O que o torna interessante como detetive é antes a sua forma única de abordar o trabalho. E isso tem que ver com um passado de teólogo e padre. O facto de ter frequentado o seminário, dirigido uma paróquia, ouvido pessoas em confissão... É o que chamamos de ‘serviço’. Depois, o Mark, como pessoa, também é assim, gentil e compassivo, o que bate certo com o que me interessou em Tom Brandis: um detetive não agressivo, que procura constantemente o bem nos outros”.

Este desvio à norma, que contraria o estereótipo da liderança forte, torna Task uma série fundamentalmente humana; ou seja, menos orientada para vigorosos esquemas de ação do que contemplativa de momentos que atestam a nossa propensão para a dor e a necessidade de sonhar nos intervalos do quotidiano. Cedo ficamos a conhecer a tragédia que ainda assombra o detetive e a sua família, assim como a angústia que se esconde na casa do coprotagonista Robbie, com dois filhos pequenos a seu cargo e uma sobrinha adolescente, Maeve (Emilia Jones), que faz as vezes de qualquer adulto responsável. Tudo boa gente, que acabará entrelaçada nas consequências nefastas de uma noite de assalto que corre mal.

Histórias made in Pensilvânia

Ambientada na mesma região de Mare of Easttown (2021), a anterior minissérie de Ingelsby, que trazia Kate Winslet no papel de detetive local a investigar a morte de uma jovem, Task partilha com esse sucesso um olhar genuíno sobre as dinâmicas de um lugar. “É o sangue que me corre nas veias, são as pessoas que conheço e estimo, é o modo como cresci. Sinto uma certa obrigação de narrar este mundo o melhor possível”, diz-nos o criador, quando lhe perguntamos sobre o regresso à mesma paisagem. “Ao voltar ao Delco [Condado de Delaware, Pensilvânia], queria assegurar-me de que estava a contar uma história com o mesmo nível de complexidade e atenção que foi a marca de Mare of Easttown”.

Ainda que o assunto continue a ser pais e filhos, amor e luto, não se trata aqui de fazer uma réplica de Mare of Easttown. Onde essa série de Winslet se debruçava sobre uma comunidade, usando o género policial como estrutura sólida, Task amplia um pouco as vistas, dá quase um sentido sagrado à natureza, e, sobretudo, assenta num modelo de perseguição, o chamado cat-and-mouse, que a dada altura leva Tom e Robbie (autoridade e criminoso) a colidirem como duas bagagens de sofrimento individual: um e outro reconhecerão a bondade intrínseca, mas as circunstâncias não dependem da índole de cada homem. Estão para além disso.

No fim de contas, o que é que diferencia Task? Para Ingelsby, o segredo está na excelência dos atores, que conseguem colocar no mesmo ponto de complexidade polícias e criminosos. Afinal, este é “um drama sobre vidas sob pressão, pessoas encurraladas, que não têm escolhas. A ideia não é que o público concorde com todas as decisões tomadas no ecrã, mas que consiga compreender a razão por que são tomadas”.

Da nossa parte, alerta-se para a tormenta emocional...

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