Não é todos os dias que um filme nos propõe uma personagem verdadeiramente invulgar, no limite inclassificável... Quem é, então, Anzu? Pois bem, alguém que uma menina de nome Karin (11 anos) irá conhecer e abraçar como um companheiro tão bizarro quanto desconcertante. Na companhia do pai, Karin está de visita ao avô. Cedo descobre que Anzu faz parte da paisagem (e da casa) em que vive o avô, isto apesar de se comportar de forma excêntrica e provocatória, quase violenta, acelerando na sua moto ou convivendo com alguns rapazes que talvez não sejam a melhor companhia para Karin. Além do mais, uma das rotinas de Anzu envolve a comunicação com os espíritos dos mortos... Ah! Ainda um pormenor que talvez seja importante ter em conta: Anzu é um gato.A partir de hoje nas salas comerciais, Gato Fantasma Anzu é um filme que nos coloca perante um universo insólito, mas absolutamente corrente, do universo da animação japonesa e, muito em particular, dos desenhos animados inspirados em histórias da BD (manga). Aqui, não existem as barreiras que a tradição ocidental reconhece nas relações entre “real” e “imaginário”. O misto de absurdo e sedução deste felino não está limitado pelas nossas fronteiras narrativas ou simbólicas, pelo que convém encarar como coisa normal o facto de Anzu falar como se fosse chefe de um gang, usar telemóvel e, nas horas vagas, exercer a profissão de... massagista! . Gato Fantasma Anzu tem assinatura de uma dupla: ela, Yôko Kuno, com uma carreira especialmente dedicada à animação; ele, Nobuhiro Yamashita, também com diversas experiências com atores de carne e osso. Revelado na edição de 2024 do Festival de Cannes, na programação da Quinzena dos Cineastas, este é, pelo menos, um filme que, além de não resultar da evolução digital que passou a marcar, por exemplo, a produção da Disney, surge como curioso exemplo de recuperação de uma velha técnica (rotoscopia) que consiste em desenhar algumas personagens a partir de imagens previamente registadas com intérpretes humanos.Enfim, não fará sentido queixarmo-nos de falta de imaginação, mesmo se, a certa altura, nos podemos questionar sobre a possível decomposição dessa imaginação numa colagem delirante que parece esgotar-se na mera ostentação de “prodígios” mais ou menos imprevisíveis.Dito isto, fica uma nota “temática” que vale a pena ter em conta. Assim, à semelhança de algum cinema japonês que vamos conhecendo (pensemos no exemplo contemporâneo de Hirokazu Kore-eda) deparamos aqui com uma encenação “natural” do mundo dos mortos, sem fronteiras entre adultos e crianças, apelando a uma serenidade com o seu quê de libertador. .'Partir, Um Dia". A comédia dramática também se canta.'Depois da Caçada'. O cinema é também uma arte da palavra