Zelensky é ovacionado em Bruxelas e Rússia reforça os ataques
O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, lançou esta terça-feira um apelo à União Europeia (UE) num discurso por videochamada para um Parlamento Europeu dominado pelo azul e amarelo das cores da bandeira ucraniana. "Sem vocês a Ucrânia fica sozinha. Provem que estão connosco, provem que não nos vão deixar sozinhos. E então a vida ganhará sobre a morte e a luz vencerá as trevas", disse, ovacionado pelos eurodeputados presentes em Bruxelas. Nas ruas das cidades ucranianas, a Rússia intensificou os seus ataques.
Zelensky admitiu que não sabe como se dirigir às pessoas, porque não pode dizer o habitual "bom dia" - porque para muitos não o é, lembrando que muitos civis já morreram desde que o presidente russo, Vladimir Putin, ordenou o ataque à Ucrânia. "Para muitos, hoje pode ser o seu último dia", referiu, falando de uma manhã "muito trágica" com ataques à Praça da Liberdade, em Kharkiv (Carcóvia).
O vídeo do ataque mostra carros a passar sem pressa frente a um edifício administrativo naquela que é a maior praça do país (e uma das maiores da Europa) quando um míssil entra na imagem vindo de cima e explode numa bola de fogo. Pelo menos dez pessoas morreram no ataque, apelidado por Zelensky como um ato de terrorismo, lembrando que não há alvos militares naquela praça. Tal como não os há nas zonas residenciais que também foram bombardeadas e onde foram contabilizados mais oito mortos (entre eles estará um estudante indiano). Isto apesar de Putin repetir "uma e outra vez" que o seu exército visa apenas "infraestruturas militares".
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As forças russas reforçaram os ataques contra as cidades ucranianas, avisando que se preparavam para atingir edifícios dos serviços de segurança em Kiev e centros de comunicação que estarão a ser usados em "ataques de informação", segundo a Tass. Moscovo pediu aos civis para abandonarem as suas casas. Pouco tempo depois do alerta, foi atingida uma torre de televisão na capital (cortando a transmissão de vários canais), assim como o memorial Babyn Yar, local de um massacre de quase 34 mil judeus por parte das forças nazis em 1941. "Para o mundo: qual é o objetivo de dizer "nunca mais" durante 80 anos, se o mundo fica em silêncio quando uma bomba cai no mesmo local do Babyn Yar? Pelo menos cinco mortos. A história a repetir-se", escreveu Zelensky no Twitter.
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Um comboio de veículos militares russos continua a avançar na direção de Kiev, com alguns a alegar que este se estende ao longo de 60 quilómetros de estrada. O seu progresso está contudo a ser travado por avarias, segundo os analistas, com um oficial do Pentágono (citado pelo The New York Times) a alegar que há tropas russas a entregar-se e a sabotar os veículos para não terem que lutar.
A NATO terá uma reunião de emergência de chefes da diplomacia em Bruxelas na sexta-feira sobre a Ucrânia, enquanto uma segunda ronda de negociações entre Kiev e Moscovo, na Bielorrússia, estava prevista para esta quarta-feira. Contudo, numa entrevista à Reuters e à CNN no seu bunker em Kiev, Zelensky exigiu que antes de qualquer regresso ao diálogo a Rússia pare os bombardeamentos. Além disso, o presidente apelou aos membros da NATO que imponham uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia, de forma a travar a força aérea russa.
O presidente ucraniano, que na segunda-feira assinou o pedido formal de entrada na UE, defendeu no Parlamento Europeu que "a Europa será muito mais forte com a Ucrânia no seu seio". E reiterou: "Nós provámos a nossa força, mostrámos que somos vossos iguais. Então, provem que estão connosco e que não nos vão deixar sozinhos", declarou, assumindo a felicidade por ver "todos os países da UE unidos" no seu apoio à Ucrânia.
A presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, disse no início do debate que a situação atual é "uma ameaça existencial à Europa que conhecemos". A maltesa agradeceu a Zelensky por mostrar ao mundo o que significa tomar uma posição: "Obrigada por nos lembrar dos perigos da complacência", afirmou, acrescentando que "os atos diários de heroísmo dos ucranianos inspiram-nos a todos."
Metsola enumerou quatro princípios importantes para o futuro: "Primeiro, a Europa não pode ficar dependente do gás do Kremlin", indicou diante dos eurodeputados. "Segundo, a Europa não pode dar as boas vindas ao dinheiro do Kremlin e fingir que não há condições." A presidente do Parlamento Europeu defendeu também que "o investimento na nossa defesa tem que corresponder à nossa retórica", alegando que a Europa "tem que avançar para uma verdadeira União de segurança e defesa". Por último, pediu para lutar contra a "campanha de desinformação do Kremlin".
Sobre o pedido de Kiev de aderir à UE, Metsola defendeu que "devemos enfrentar o futuro juntos". A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse também que hoje "a UE e a Ucrânia estão mais próximas do que nunca", mas reconheceu que "há ainda um longo caminho a percorrer" e que "primeiro temos que pôr fim a esta guerra e depois devemos falar sobre os próximos passos".
Os eurodeputados aprovaram por uma larga maioria (673 votos a favor, 13 contra - incluindo dos dois eurodeputados comunistas portugueses - e 26 abstenções) uma resolução a condenar "nos mais fortes termos possíveis a invasão ilegal russa da Ucrânia" e que exige que o Kremlin ponha fim às atividades militares no país. Defendem ainda que as instituições trabalhem no sentido de dar à Ucrânia o estatuto de país candidato à UE.
A intervenção do chefe da diplomacia russo, Sergei Lavrov, no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra, foi boicotada pela maioria dos representantes ocidentais, que saíram da sala quando passou o vídeo pré-gravado. A participação em pessoa tinha sido cancelada na véspera, depois de os países europeus terem proibido a entrada no seu espaço aéreo de aviões russos.
Também numa mensagem vídeo, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, sugeriu excluir totalmente a Rússia deste organismo devido ao ataque na Ucrânia. "É razoável perguntarmo-nos se um Estado-membro da ONU que tenta se apoderar de outro Estado-membro da ONU, cometendo terríveis violações dos direitos humanos e causando um grande sofrimento humanitário, deveria estar autorizado a permanecer neste Conselho", questionou Blinken, alegando ainda que se Putin conseguir atingir o seu objetivo e derrubar o governo ucraniano "a crise humanitária e dos direitos humanos vai apenas piorar".
Notícia corrigida às 11.20: Uma primeira versão dizia, erradamente, que os dois eurodeputados do Bloco de Esquerda tinha optado pela abstenção na votação no Parlamento Europeu, quando na realidade votaram a favor.