A visita de Marcelo Rebelo de Sousa à Índia, de 13 a 16 de fevereiro, não trará certamente resultados espectaculares, tal como, aliás, sucede com grande parte das visitas de estado. No entanto, tem um significado especial..Como refere a nota da Presidência da República, "demonstra a importância atribuída por Portugal e pela Índia ao aprofundamento do sólido relacionamento bilateral que os une bem como ao pleno aproveitamento do potencial existente para a sua diversificação nas mais diversas áreas"..Não é por acaso que a Índia seja o segundo país asiático a ser visitado por Marcelo, após a China. A Índia emergiu como a economia com mais rápido crescimento no mundo, ultrapassando a China, prevendo-se que seja, nos próximos 10 a 15 anos, uma das três maiores economias mundiais. Prevê-se mesmo que no ano de 2040 ultrapasse os Estados Unidos, tornando-se a segunda maior economia do mundo, em termos de poder de compra, segundo um relatório da Pricewaterhouse Coopers..Durante muitos anos, desde a independência até inícios da década de 90 do século passado, o país esteva fechado sobre si mesmo, com uma ligação privilegiada à então União Soviética. O investimento estrangeiro era dificultado, com numerosas restrições. Porém, a liberalização da economia, defendida hoje pelos dois principais partidos indianos (o BJP e o Congresso) abriu a Índia ao mundo, com numerosas empresas estrangeiras a se instalar nos vários estados da Índia. A iniciativa Make in India reforçou o desenvolvimento do sector industrial, proporcionando também um aumento do poder de compra do consumidor indiano, o que estimulou a produção. O governo lançou também outra iniciativa, a Digital India Iniciative, com o objetivo de desenvolver três componentes de relevo: infraestrutura digital, fornecimento de serviços digitais e aumento da literacia digital..Contrariamente à China, este crescimento tem sido promovido em democracia; a Índia é considerada a maior democracia do mundo, com um governo de base parlamentar. Durante algum tempo, houve quem questionasse a possibilidade de a Índia se desenvolver mantendo o regime democrático. Era dado o exemplo da política chinesa de contenção da natalidade (uma família, um filho), impossível de aplicação na Índia. Quando Sanjay Gandhi, filho de Indira Gandhi, tentou implementar a esterilização, em 1976, registou-se uma revolta que o obrigou a retroceder..Hoje, conclui-se que não só é possível conciliar o crescimento com a manutenção da democracia, como também que a manutenção da democracia propicia mais crescimento. A Índia está já a ultrapassar a China na taxa de crescimento do produto interno bruto..Portugal não podia ficar alheio às oportunidades que a Índia oferece, no plano económico, científico e cultural. Há um vasto campo de oportunidades, ainda por trabalhar. No ranking dos fornecedores da Índia, Portugal ocupa um modesto 106º lugar. A Índia representa ainda 0,1% das nossas exportações e 0,6% das importações..É pouco, muito pouco. Mas o caminho está há muito aberto; ainda que gradualmente, aumenta o interesse dos empresários dos dois países em investimentos recíprocos. Há hoje empresas portuguesas com sucursais na Índia e em Portugal operam também empresas indianas..A Índia encara Portugal como um importante parceiro numa relação triangular, envolvendo os países de língua oficial portuguesa..A desconfiança de outrora deu lugar a uma ambiente de grande cordialidade, a que não é alheio o facto de António Costa ser o primeiro chefe de governo na Europa com origem indiana. Aliás, a comunidade indiana em Portugal é hoje numerosa, integrando-se plenamente na sociedade portuguesa, sem estigmas. Não há notícias de desordens ou sequer perturbações, ao contrário do que sucede, infelizmente, com outras comunidades..A visita de Marcelo Rebelo de Sousa tem, pois, um significado profundo, que ultrapassa as palavras de circunstância inerentes aos discursos oficiais.