Duas atrizes, dois talentos. Victoria Guerra e Alba Baptista nas bocas do mundo. O efeito Netflix está a deixá-las expostas a uma montra global que há uns tempos atrás era impossível. Victoria Guerra deixa marcas no elenco de grupo de Um Casamento Wilde, de Damian Harris, mesmo ao lado de Patrick Stewart, Glenn Close e de John Malkovich, enquanto Alba Baptista é a atriz mais vista do mundo graças ao poder da Netflix global..A série que protagoniza, Warrior Nun, adaptação da BD com o mesmo nome, é número 1 em quase todo o mundo e nos EUA está na vice-liderança atrás da série documental Unsolved Mysteries. É obra! Depois de se saber que Daniela Melchior é uma das vedetas de The Suicide Squad, para a Warner e de todo o buzz em torno de Nuno Lopes na série de Alex Pina ( La Casa de Papel), White Lines, é inevitável que lá fora já repararam numa certa marca dos atores portugueses. .Trata-se de um momento de expansão dos nossos atores, sobretudo se pensarmos que estreou recentemente o filme Os Tradutores, com Maria Leite a contracenar ao lado de Olga Kurylenko e Riccardo Scamarcio; que Maria João Bastos impressionou em O Mecanismo; Joaquim de Almeida também está em Warrior Nun; que Albano Jerónimo será o protagonista de The One, também para a Netflix e que Ana Padrão e Joana Ribeiro vão ser estrelas na série The Dark Tower, já para não mencionar que no cinema Joana é ainda uma das protagonistas de O Homem Que Matou D. Quixote, de Terry Gilliam, e tem papel ao lado de Mark Whalberg em Infinite, para a Paramount. Depois, há também um filme que une Alba e Joana Ribeiro, Fátima, de Marco Pontecorvo, super-produção americana filmada em Portugal sobre Nossa Senhora de Fátima e com um elenco internacional que tem nomes como Sônia Braga, Harvey Keitel e Goran Visnjic..Esta internacionalização não é um estalar dos dedos de um capricho do destino. Uma nova geração de atores tem demonstrado um tipo de acting mais em consonância com um estilo à Hollywood. Atores com uma fluência linguística incrível e uma "desplante" novo - a cena de sexo entre Victoria Guerra e o ícone dos palcos britânicos, Patrick Stewart em The Wilde Wedding, é um bom exemplo, tal como a maneira como Alba Baptista aplica um naturalismo imprevisto nos momentos mais ligeiros de Warrior Nun. A par disso, o caso da iniciativa da diretor de casting Patrícia Vasconcelos, a Passporte, onde todos os anos uma série de diretores de casting de todos os canto do globo chegam a Portugal para conhecer atores. Terá sido nestes encontros que Lídia Franco chegou ao papel de Underground 6, de Michael Bay e Paulo Pires à Ibiza do deboche de White Lines.."Esta internacionalização, para mim, por muito que se endeuse os atores, é normal e já não era sem tempo! Ao contrário de Espanha, nós não formávamos atores para poderem receber convites lá fora. Isto das self-tapes [as autofilmagens que os atores enviam para as audições] ajudou imenso. O meu orgulho é imenso em ver todos estes atores em grandes papéis internacionais", palavras de Victoria Guerra, uma das atrizes da comédia que Malkovich e Glenn Close produziram há uns anos (estreou nos EUA em 2017 e por cá nunca foi exibido nas salas, apenas nos clubes de vídeo das operadoras e nos canais TVCine) para a Universal ficar com os direitos e que agora é opção na.Victoria interpreta uma jovem portuguesa com vocabulário de palavrão explícito que vai parar a um casamento entre uma atriz de Hollywood (Glenn Close) e um escritor inglês idoso (Patrick Stewart). A sua Saffron acaba por ser uma personagem pivô numa comédia que explora o filão dos filmes de equívocos em casamentos e com famílias disfuncionais. Não é obra que mereça particular atenção mas tem um John Malkovich leve e num dos melhores registos recentes e um trabalho de direção de atores muito laborioso, talvez até fora do vulgar num objeto de mera comédia romântica pensada para um público mais sénior. E é sintomático perceber que a atriz portuguesa desfila sem atritos num elenco que tem ainda nomes como Minnie Driver, Peter Facinelli ou Noah Emerich. "Devo confessar que me senti muito bem no meio deles todos, foi assim meio especial pois o filme tinha uma aura independente que nos colocou a todos muito próximos uns dos outros. Isso foi muito bom para mim e, além de grandes atores, eles são mesmo pessoas absolutamente incríveis, capazes de unir o elenco. Nunca senti que estava ao lado de estrelas e isso foi muito bonito. Por exemplo, a Glenn Close almoçava connosco na tenda do catering!".Para Victoria esta aproximação a um circuito profissional exterior tem feito sentido desde cedo, ela que roubava todas as cenas em Linhas de Wellington, de Valeria Sarmiento, onde já partilhava o ecrã com John Malkovich, tendo-se seguido uma aposta grande em produções europeias, de Variações de Casanova, de novo com Malkovich, a Cosmos, o testamento do polacoAndrzej Zulawski, nem de propósito sempre produções de Paulo Branco.."Sinceramente, creio que o fator humano latino dos portugueses é importante nesta vaga de sucesso. Sim, é mesmo um fator que nos ajuda a conseguir mais papéis. Olhem para a Alba, uma miúda tão doce, humilde e trabalhadora - é mesmo importante. Quando se escolhe atores, escolhe-se também bons seres humanos, capazes de unir uma equipa", conta a atriz que jura que nem foi avisada pela Netflix desta estreia no catálogo. Victoria destaca ainda o esforço da HBO em apostar na produção portuguesa, ela que é radiosa no pequeno papel que tem em A Herdade, disponível precisamente nesse gigante do streaming, tal como a série luso-espanhola que protagoniza, Auga Seca. Não é por acaso que já foi jurada no Festival de San Sebastián....Para além de tudo, o fator bilingue desta algarvia de 31 anos com mãe inglesa também pesa. Mas pesa mais um acting capaz de dar uma densidade fatal a uma personagem como Rosa Maria em Variações ou o sensual alheamento da musa de Aparição. Victoria Guerra, tal como Alba, é frágil, preciosa e forte ao mesmo tempo. É nesse contraste que está o ganho..E o trunfo em Alba Baptista torna a vulnerabilidade em algo de ardiloso. Quem a vir como freira guerreira em... Warrior Nun talvez se surpreenda por este rastilho de realismo no seu humanismo, mesmo quando está em cenas com efeitos visuais ou a fugir de monstros nas ruas de Málaga. É ela quem neste momento está com o maior outdoor de Sunset Boulevard - o seu rosto a dominar a paisagem de billboards no centro de Los Angeles. Uma estrela instantânea aos 23 anos. Portuguesa de gema mas com estudos no colégio alemão e um ouvido que a tornou poliglota. A série da Netflix prova que já conseguimos ter atores com sotaque de anglo-americano perfeito. Mas se for preciso, ela conseguirá fazer a inflexão para o inglês latino. Aliás, nesta altura desta explosão, olhamos para o seu sorriso e percebemos que dá para tudo, basta recuar quando Justin Amorim a filmou a sair da adolescência em Leviano, onde era uma Miss Teen algarvia e denotava logo uma graça de câmara..Quando foi escolhida para ser a atriz principal de Warrior Nun não foi pela sua cara de boa rapariga. Foi pelo seu talento e por uma self-tape que fez sentido. Nas mais altas instâncias da Netflix percebeu-se que a sua "graça de câmara" é rara: tanto pode passar por miúda como jovem sexy. No meio de tudo isto, um carisma que começa pela sua voz clara e forte e por um olhar do qual sai uma ferocidade que diz tudo.."Queria muito diluir a minha carreira internacional no cinema alemão e francês", contava ao DN a atriz em setembro passado. Agora, o cinema francês está aí à porta: está no elenco de L'Enfant, de Marguerite de Hillerin e Félix Dutilloy-Liégeois, por sinal outra produção de Paulo Branco em rodagem por estes dias. Aliás, agora tudo lhe acontece: a rimar com as críticas internacionais muito positivas da sua prestação em Warrior Nun, dia 23 estreia nos cinemas Patrick, de Gonçalo Waddington, objeto lindíssimo de um novíssimo cinema português. Aí, temos a Alba mulher-menina e o seu rosto é uma faixa de luz num tema negríssimo: os destinos das crianças raptadas para a indústria da pornografia pedófila..Justin Amorim, jovem cineasta que a descobriu em Leviano, voltou a filmá-la para um vídeo fashion para a Vogue que enuncia todas as suas "máscaras". Fica no ar a Alba anjo, anjo com sombra de pecado: "a grande força da Alba no cinema é a capacidade de ouvir, tanto o realizador em ensaios como a ouvir os colegas em personagem dentro da cena. O cinema, especificamente o cinema português, é muito mais sobre ouvir do que falar e daí me parece que a Alba será sempre a musa da cinema nacional. Os silêncios da Alba tanto na vida real como na ficção são inigualáveis, porém Warrior Nun vem provar que mesmo num projeto recheado de diálogo e caos, ela consegue executar eximiamente as duas tarefas e continua a provar ser uma atriz ultra camaleónica a protagonizar personagens da nova vaga de feminismo pós-moderno onde a mulher pode ser forte, frágil, ou o que ela mesmo quiser, complexa e em constante mutação", garante o realizador que já tem um novo projeto a pensar na sua atriz fetiche..Mas não é o único a reclamar essa atração, gente nobre como Ivo M. Ferreira, João Mário Grilo, Leonor Noivo, Gonçalo Galvão Telles, Edgar Pêra já perceberam todo o alcance deste bicho de cinema. Não é brincadeira: são 4 filmes ainda que tem para estrear nos próximos tempos, ninguém tem esta agenda..Por ironia dos destinos ainda não contracenou com Victoria Guerra, mesmo tendo a mesma agente, Carla Quelhas, da Elite Lisbon, agência que se calhar é bem capaz de ser uma das culpadas de tudo isto. Para Alba, o inevitável agora é ter de filmar a segunda temporada de Warrior Nun. A The Newsweek garante que está confirmado...