Uma em cada duas pessoas que ganham menos de 650 euros tem dificuldades em comprar máscaras
A pandemia do novo coronavírus está a contribuir para aumentar as desigualdades sociais na população. São os mais vulneráveis aqueles que estão mais expostos a esta crise. É o que mostra o mais recente Barómetro Covid-19 da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP). As pessoas com menos rendimentos e com baixa escolaridade são, por exemplo, as que têm mais dificuldades em comprar as máscaras de proteção e em utilizá-las adequadamente. É é precisamente este o grupo que mais precisa de sair para ir trabalhar.
Dos que responderam ao inquérito "Opinião Social", da ENSP, 60% sentiram dificuldades em adquirir este equipamento de proteção individual. Os dados indicam que uma em cada duas pessoas que ganham menos de 650 euros tem dificuldades em comprar máscaras, pelo facto de "serem caras". No entanto, apenas uma em cada 10 pessoas com rendimentos superiores a 2 mil euros reporta esta dificuldade.
As máscaras de proteção são fundamentais nesta fase de desconfinamento que o país está a viver, sendo o seu uso obrigatório ou recomendado em vários setores de atividade e na deslocação a espaços fechados.
As pessoas que pertencem aos escalões de rendimento mais baixos são as que têm mais dificuldade em adquirir as máscaras, mas são também as que estão mais expostas ao novo vírus por fazerem parte do grupo onde se "verifica a maior proporção" dos cidadãos que têm de se deslocar para o local de trabalho.
"Estes resultados são ainda mais inquietantes quando analisamos quem, por força de ter de se deslocar para o local de trabalho, tem maior exposição ao risco de contrair Covid-19", refere Sónia Dias, coordenadora científica do "Opinião Social".
O inquérito indica que "nos escalões de rendimento mais baixos, 54% das pessoas têm de ir para o local de trabalho para exercer a sua atividade, enquanto 75% das pessoas com rendimentos superiores a 2500 euros está a desenvolver a sua atividade profissional em teletrabalho".
"Os dados mostram-nos que são as pessoas menos escolarizadas que poderão estar mais expostas: 76% das pessoas com escolaridade até ao 9.º ano tem de ir para o local de trabalho enquanto que esta proporção desce para 26% nas pessoas com ensino superior", afirma a coordenadora do inquérito.
São também as pessoas com menos habilitações académicas as que mais referem não saber, ou não se terem informado sobre como utilizar as máscaras de proteção, o que "pode sugerir uma possível acumulação de risco", avisa Sónia Dias.
Nesta matéria, são duas vezes mais os homens que dizem não saber usar as máscaras, em comparação com as mulheres.
O estudo mostra que há mais pessoas a assumir que nunca usaram máscaras nas faixas etárias mais elevadas. Um em cada 10 idosos admite não usar máscara, sendo este um grupo de risco que está mais exposto à infeção pelo novo coronavírus. 43% da população usa este equipamento de proteção apenas em determinadas situações e 51% usa-o sempre que sai de casa. Também aqui são mais os homens a admitir que nunca usam.
O acesso aos serviços de saúde em função do rendimento também foi analisado pelo barómetro da ENSP, verificando-se que uma em cada duas pessoas, cujo rendimento é inferior a 650 euros, não tiveram a consulta que necessitavam.
Foi no Alentejo, uma das regiões mais envelhecida do país, onde se verificou a maior proporção de pessoas que não tiveram consulta (71%) seguindo-se a zona Centro (61%), lê-se no estudo.
Das pessoas que precisavam de ir a uma consulta durante a pandemia e não conseguiu, 73% são idosos.
É também nesta faixa etária que há mais casos de pessoas que não foram à urgência ou não fizeram um tratamento num serviço de saúde.
É a população com remunerações mais baixas, a camada mais jovem e a menos escolarizada quem está a ser mais afetada pela perda de rendimento, responde o inquérito "Opinião Social".
Dos que ganham por mês menos de 650 euros, duas em cada três pessoas perderam rendimentos, sendo que 40% de forma parcial e 25% de forma total.
O número de participantes que refere obter rendimentos inferiores a 650 euros triplicou da semana 1 para a semana 7 do questionário - as respostas foram recolhidas entre os dias 21 de março e 8 de maio.
"Estes dados chamam a atenção para o facto de, nos próximos tempos, ainda se poderem agravar mais as vulnerabilidades socioeconómicas já existentes", alerta Sónia Dias
As respostas dos participantes indicam também que em cada dois jovens com idade entre os 16 e os 25 anos reporta ter perdido rendimento, bem como metade dos que têm até ao 9º ano de escolaridade.
O Algarve é a região mais afetada pela perda de rendimentos, com 57% da sua população nesta situação, e 30% a informar que teve de suspender a atividade profissional. Segue-se o Norte, com 47%, e o Centro, com 42% de pessoas que referem ter perdido rendimentos.