Tancos: factos e datas de um assalto rocambolesco e da sua investigação
28 de Junho
O furto do material de guerra é detetado pelas 16:30, durante uma ronda móvel. A patrulha verificou que dois paióis tinham as fechaduras arrombadas. Dentro das instalações de Tancos existiam 18 paióis. As vedações e a videovigilância não estavam no seu melhor e as torres de vigilância não eram usadas. Há indicações de que muitas vezes as patrulhas de segurança não eram realizadas.
Os inspetores da Polícia Judiciária Militar foram chamados ao local, e chegaram a Tancos poucas horas depois. Interrogaram os militares que estavam responsáveis pela segurança e pelas rondas.
29 de Junho
A opinião pública toma conhecimento do roubo através do comunicado do chefe do Estado-Maior do Exército (CEME): "Foi detetada ontem, ao final do dia, a violação dos perímetros de segurança dos Paióis". No mesmo documento, refere o desaparecimento de granadas de mão ofensivas e de munições de calibre de 9 mm. Refere, ainda, que a PJM tomou conta da ocorrência e que a PJ e o Ministério Público (MP) também estão informados. O Diário de Notícias noticia que entre o material roubado se encontravam lança-granadas e explosivos.
30 de Junho
O Exército atualiza a informação e revela que entre o material desaparecido se inclui explosivos, granadas de gás lacrimogéneo e granadas foguete anti-carro. Sem "menosprezar minimamente a gravidade dos factos", o ministro da Defesa garante em entrevista à Sic que o caso não corresponde à maior quebra de segurança do século. "Há quebras e falhas de segurança muito superiores. (...) Nem é preciso evocar os trágicos acontecimentos que têm varrido o continente", insiste, apontando para falhas ao nível militar e dos serviços de informação na Europa. A secretária-geral do Sistema de Segurança Interna reúne ao final da tarde a Unidade de Coordenação Anti-Terrorista (UCAT) e são divulgadas na imprensa nacional as primeiras listas do material furtado. O ministro passa a estar sob críticas fortes.
1 de Julho
O Chefe do Estado-Maior do Exército, Rovisco Duarte, anuncia a exoneração de cinco chefias militares. "Não quero que haja entraves às averiguações e decidi exonerar os cinco comandantes das unidades que de alguma forma estão relacionadas com estes processos", justifica.
Tratam-se dos comandantes dos regimentos de Paraquedistas, coronel Hilário Peixeiro, de Engenharia, coronel Paulo de Almeida, e de Infantaria de Tomar, coronel Ferreira Duarte, e dos comandantes da unidade de apoio da Brigada de Reação Rápida, tenente-coronel Teixeira Correia, e da Unidade de Apoio Geral de Material do Exército, coronel Amorim Ribeiro, revelou o chefe do Estado-Maior do Exército (CEME) em entrevista à RTP.
O Exército determina ainda a realização de uma inspeção extraordinária aos paióis e a abertura de três processos de averiguações.
2 de Julho
Rovisco Duarte diz em entrevista à SIC que o paiol foi "escolhido a dedo", admitindo que tenha sido roubado com "informação do interior".
4 de Julho
O Ministério Público abre inquérito ao sucedido por suspeitas da prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo.
A investigação passa a ser liderada pela PJ com a colaboração da PJ Militar. As duas equipas de investigação trabalhariam sob um mesmo comando - com quatro investigadores (dois de cada equipa), e Vítor Magalhães e João Melo, os dois procuradores titulares do processo. Luís Neves, o atual diretor da PJ era nessa altura diretor da Unidade de Contra-Terrorismo da PJ.
O Presidente da República visita paióis nacionais e defende apuramento de "tudo, de alto a baixo, até ao fim, doa a quem doer". Neste dia Marcelo Rebelo de Sousa, bem como as altas chefias militares sabem pelo diretor da PJM, coronel Luís Vieira, que meses antes o MP tinha recebido uma denúncia sobre a preparação de um assalto a instalações militares e que não tinha avisado as Forças Armadas.
5 de Julho
A revista Sábado publica a história de uma suposta denúncia sobre a preparação do assalto. Conta que no início de 2017 um informador foi apanhado numa escuta telefónica a dizer que tinha sido sondado para participar num assalto a uma instalação militar, mas que não ia aceitar.
Foi com base nessa escuta que a Diretoria do Norte da PJ, depois de recolher informações adicionais, apresentou uma proposta de apreciação urgente visando a abertura de um inquérito-crime. No entanto, essa proposta acabou por ser recusada por um juiz de instrução criminal do Porto, que entendeu não ter competência para a apreciar e que o inquérito devia ser aberto na comarca de Leiria - uma vez que a informação da Judiciária já admitia que o roubo pudesse ocorrer em Tancos. O pedido chegou a Lisboa, ao juiz Ivo rosa, que também recusou a solicitação.
Rovisco Duarte admite na Comissão Parlamentar de Defesa responsabilidade do Exército por diversas falhas de supervisão. Realiza-se uma reunião do Conselho Nacional de Segurança Interna (CNSI)59. É avaliada a situação de segurança interna, concluindo-se que o incidente de Tancos não justifica uma alteração no nível de ameaça.
6 de Julho
7 de Julho
Azeredo Lopes defende permanência de Rovisco Duarte e rejeita que falhas possam ser justificadas com desinvestimento no setor da Defesa.
8 de Julho
O tenente-general Antunes Calçada, comandante do Pessoal, apresenta demissão, segundo o semanário Expresso por "divergências inultrapassáveis" com Rovisco Duarte. Anunciada demissão do comandante das Forças Terrestres, tenente-general António Menezes.
11 de Julho
O primeiro-ministro manifesta confiança no ministro da Defesa e solidariedade com Rovisco Duarte.
O Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas admite que o roubo foi um "soco no estômago" dos militares, adianta que prejuízo ascende a 34 mil euros e revela que algum material estava indicado para abate.
17 de julho
Rovisco Duarte decide transferir o material militar guardado em Tancos para outras instalações militares.
O exército renomeia os cinco comandantes exonerados no princípio do mês.
20 de julho
O exército anuncia o reforço de segurança dos paióis de Santa Margarida, em Santarém e o cancelamento dos investimentos previstos para Tancos.
21 julho
Primeira reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional após o furto de Tancos.
25 de julho
O Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, Pina Monteiro, afirma ter tido papel "muito reduzido" no caso de Tancos.
27 de julho
O Diretor do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) diz no parlamento que o SIS soube do furto pela comunicação social e que o relatório dos serviços de informações equacionou como "cenário plausível" o envolvimento de crime organizado português ou estrangeiro, terrorista ou extremista.
14 de agosto
Na sequência do processo de averiguações que tinha determinado a 30 de junho, são instaurados processos disciplinares a dois militares (um Primeiro-Sargento e um Cabo) - em causa estarem responsáveis pelas instalações na altura do roubo.
4 de setembro
Presidente da República declara-se preocupado com tempo que demora apuramento de factos e responsabilidades
6 de setembro
É instaurado um processo disciplinar a mais um militar (um capitão) - também por razões de segurança.
10 de setembro
"No limite, pode não ter havido furto nenhum. Como não temos prova visual nem testemunhal, nem confissão, por absurdo podemos admitir que o material já não existisse e que tivesse sido anunciado... e isto não pode acontecer", afirma Azeredo Lopes em entrevista DN/TSF surpreendendo tudo e todos.
23 de setembro
O Expresso revela um relatório secreto a que terá tido acesso com cenários "muito prováveis" de roubo de armamento em Tancos e com duras críticas à atuação do ministro da Defesa, Azeredo Lopes, na sequência do caso conhecido em 29 de junho.
O relatório foi desmentido por todas as entidades do ministério à Presidência da República - passando pelas chefias militares.
18 de outubro
O material é encontrado na Chamusca pela Polícia Judiciária Militar - num terreno baldio. "Na prossecução das suas diligências de investigação no âmbito do combate ao tráfico e comércio ilícito de material de guerra, recuperou (...) na região da Chamusca, com a colaboração do núcleo de investigação criminal da Guarda Nacional Republicana de Loulé, o material de guerra furtado dos Paióis Nacionais de Tancos", diz um comunicado.
A PJM informou também que o material recuperado já se encontrava nos Paióis de Santa Margarida, à guarda do Exército, onde estava a ser realizada a peritagem para a identificação mais detalhada.
23 de outubro
O DN e o Observador dão conta de um conflito entre a investigação da PJM e da PJ. Em causa estarão divergências sobre a investigação do caso.
31 de outubro
Rovisco Duarte revela que na relação do material recuperado "existe uma caixa a mais [de petardos], que não constava da relação inicial" do material furtado. Tratava-se de uma caixa com 264 unidades de velas de explosivo de plástico cuja entrada no paiol, segundo o Exército, não tinha sido registada. O responsável por não ter registado a caixa tinha sido o sargento que foi depois punido com uma pena de repreensão.
24 de março
A Sábado revela que, poucas semanas após o assalto aos Paióis Militares de Tancos, a Polícia Judiciária (PJ) e o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) puseram em marcha uma operação encoberta para tentar recuperar o armamento roubado.
Para isso terão recorrido a um polícia estrangeiro que se fez passar por membro de uma das várias fações do IRA (Exército Republicano Irlandês) interessado em comprar parte do arsenal furtado. No entanto, o contacto com um suspeito de ter alguma ligação aos responsáveis pelo assalto ocorrido entre 25 e 28 de junho de 2017 fora infrutífero - e a operação acabou por fracassar.
13 de julho
"Ainda há explosivos de Tancos à solta", noticia o Expresso. Os procuradores do DCIAP referiram, num recurso para o tribunal de Relação, de março deste ano, que, "ao contrário do que tinha sido veiculado pelo Exército e pelo Ministério da Defesa", ainda existe material que não foi recuperado - armamento que inclui granadas e explosivos.
A mesma notícia avançava também que o Ministério Público considera que "a segurança nacional está em perigo enquanto os assaltantes não forem capturados".
Além das 1450 munições de 9 mm que não foram devolvidas, há ainda 30 cargas de explosivos - usadas para explosões cirúrgicas e controladas -, três granadas ofensivas, duas granadas de gás lacrimogéneo e um disparador de descompressão desaparecidos em parte incerta.
14 de julho
O Presidente da República reafirma, de modo ainda mais incisivo e preocupado, a exigência de esclarecimento cabal do ocorrido com armamento em Tancos". Numa nota publicada na página da Internet da Presidência, em reação à notícia do Expresso, Marcelo Rebelo de Sousa faz já uma referência ao conflito entres as judiciárias civil e militar, assinalando ter "a certeza de que nenhuma questão envolvendo a conduta de entidades policiais encarregadas da investigação criminal, sob a direção do Ministério Público, poderá prejudicar o conhecimento, pelos Portugueses, dos resultados dessa investigação. Que o mesmo é dizer o apuramento dos factos e a eventual decorrente responsabilização".
31 de julho
As secretárias-gerais do Sistema de Informações da República Portuguesa e do Sistema de Segurança Interna garantem no parlamento que desconhecem que haja mais material de guerra "à solta" e que represente perigo para a segurança interna.
No mesmo dia, o CEME Rovisco Duarte, que tinha sido chamado ao parlamento pelo CDS para confirmar se há ou não mais discrepâncias em relação ao material roubado / recuperado, refugia-se no "segredo de justiça" para negar a entrega aos deputados da lista do material que recuperado. O CDS queria, com a comparação da lista de material furtado e esta, confirmar se faltava ou não mais algum material. O general revela, porém, que o material recuperado em outubro de 2017 foi alvo de "um auto de apreensão" da PJ apenas a 18 de Junho de 2018, quase oito meses depois da PJM o ter intercetado na Chamusca.
10 de setembro
O Presidente da República declara ter "uma forte esperança" de que as conclusões da investigação criminal ao desaparecimento de material militar de Tancos sejam conhecidas dentro "de dias ou de semanas - e não de meses".
"Estamos, penso eu, na ponta final da investigação criminal. E essa investigação criminal irá apurar, certamente, factos e eventuais responsáveis. E eu hoje tenho uma forte esperança que seja uma questão de dias ou de semanas e não de meses, portanto, que estejamos mesmo muito próximos do conhecimento das conclusões da investigação criminal", afirmou.
25 de setembro
Numa operação do MP e da PJ são detidos sete militares da PJM e da GNR suspeitos de terem forjado a recuperação do material em conivência com o presumível autor do roubo. Entre os detidos está o diretor da PJM e o comandante da GNR de Loulé, bem como um civil que é o principal suspeito do assalto.
Marcelo Rebelo de Sousa - que se tinha mostrado sempre preocupado - disse que quer ver tudo esclarecido e revelou preocupação com uma suposta "guerra entre polícias"