Numa altura em que os estúdios Fox deixaram de ter Fox no logo e foram "apreendidos" pela Disney para ficarem 20th Century Studios, um filme como Free Guy- Herói Improvável pode ser uma resenha desta mudança. Uma extravagância que mistura conceitos de Pixels com The Truman Show e conceptualiza uma ideia de entretenimento cinematográfico a partir das regras (muito mais do que imaginário...) dos videojogos. Shawn Levy e a estrela que também é o produtor, Ryan Reynolds, estão a brincar com a muito lavrada maneira de Hollywood fazer produtos adolescentes a partir dos chamados "jogos de consola". Em outra instância, este é também um objeto que consegue oportunamente satirizar a teia dos dispositivos do cinema dos "super-heróis". E não é por acaso que os seus efeitos de gozo aproveitam a permissão da Disney de incorporar sabres da saga Star Wars ou personagens do filão Marvel (Chris Evans e o escudo do Capitão América têm direito a cameo). Free Guy é uma espécie de prova de uma maneira de filmar sequências de ação digitais e fantasiosas..A história mostra-nos como uma personagem secundária de um videojogo chamado Free City ganha vida. O "tipo da camisa azul" decide colocar óculos escuros e torna-se assim super-herói. Vê que no loop do seu dia-a-dia pode haver espaço para conhecer a rapariga dos seus sonhos, pedir algo mais do que o café rotineiro e combater os vilões. Lá fora, no mundo real, os criadores do jogo tentam encontrar provas de que o conceito do jogo lhes foi roubado por um empresário desonesto que tenta agora destruir Free City e lançar videojogos-sequelas..Em pleno confinamento de 2020, quando se pensava que o filme poderia ainda ser uma das primeiras estreias pós-covid, o DN participou de uma conferência com os atores via Zoom. Uma conferência que foi mais um matar-saudades de um elenco onde além de Ryan Reynolds pontificam Taika Waititi, Jodie Comer, Channing Tatum, Joe Keery e as vozes de Dwayne Johnson, Hugh Jackman ou Tina Fey.... "Este é um filme que é mesmo para ser visto no grande ecrã! Quando vi a descrição do projeto "comédia de ação" pensei que seria mais uma, mas aqui há muita emoção e coração", começa por dizer Jodie Comer, fresca do sucesso televisivo Killing Eve, ela que aqui é uma gamer/criativa de jogos cujo avatar é o interesse romântico do herói "improvável". "Nos filmes do Shawn Levy há sempre muito coração. Aqui é a conjugação da comédia, da ação e dessa componente do coração. Diria que Free Guy é uma possibilidade de um bebé resultante de Ready Player One com The Truman Show mas nutrido por alguém muito fã de Regresso ao Futuro", avança Joe Keery, a "próxima grande estrela de Hollywood", ator revelado na série Stranger Things, aqui o co-criador do videojogo em questão..Mas a estrela do filme é mesmo Ryan Reynolds, de novo em pose de "bom rapaz", neste caso empregado bancário que, afinal, quer mais da vida do que apenas a rotina habitual. "Quando li esta premissa achei que poderia dar um filme provocante! Gosto de descobrir novas camadas no cinema e este é um filme que traz consigo uma avalancha de alegria. Nestes tempos é preciso um filme assim, sobretudo neste contexto cultural. Free Guy chegou até mim na altura ideal, mesmo como espectador de cinema e de entretenimento. Estou muito entusiasmado com este projeto - é um filme para estes tempos", diz de sua casa num pequeno ecrã desta conferência. Nessa altura, Ryan não imaginaria que o filme voltasse a ser adiado. Na semana passada, para não deixar adormecer o hype, publicou um vídeo que já é viral a pedir atenção de Óscar à sua interpretação aqui de uma outra personagem: Dude, a sua versão super, hiper musculada, provavelmente a melhor ideia de humor do filme para ser conferida no último terço da história..Jodie Comer, que depois deste festival de efeitos visuais e de piadas meta-meta referenciais, é a musa de Adam Driver e Matt Damon em O Último Duelo, de Ridley Scott, conta também que começou este projeto literalmente na manhã seguinte a ter filmado a última cena da sua participação em Killing Eve: "fiquei muito feliz depois de seis meses de gravações estar a trabalhar com o Ryan Reynolds! Fazer este filme foi muito divertido. Nunca me irei esquecer do lado brincalhão dele. O Ryan e o realizador criaram uma atmosfera em que tudo o que fizesses poderia ser incorporado e na qual os atores tinham permissão para serem tontos ... Havia permissão para tentarmos as nossas coisas e improvisar. Nunca tinha feito nada assim e este filme pareceu algo que me transcendeu... Foi a introdução perfeita!" A atriz britânica diz isso mesmo tendo em conta que se tinha estreado em Hollywood num papel minúsculo em Star Wars: A Ascensão de Skywalker. A seguir, está já de novo às ordens de Ridley Scott em Kitbag, o tal projeto onde Joaquin Phoenix é Napoleão Bonaparte..Free Guy - Herói Improvável, se correr bem, pode dar sequelas e pode também elevar ainda mais o estatuto de Ryan Reynolds como realeza contemporânea de Hollywood. O ator diz-se encantado: "Foi a melhor experiência de cinema na minha vida e é mesmo o melhor filme que já fiz. Se Deadpool era o filme perfeito naquela altura para a cultura da BD, este diz-nos muito sobre o nosso lugar agora no mundo. E olhem que não sei onde estamos agora no mundo". Com a ajuda de Hulk, o seu Zé-Ninguém bancário é o herói virtual com o qual a Disney vai colocar todas as fichas neste verão....dnot@dn.pt