Caetano Júnior, subdiretor do Jornal de Angola - o maior jornal de Angola e propriedade do Estado - e José Kaliengue, o diretor do jornal privado, O País, responderam ao desafio de traçar, em três pontos, os factos que vão marcar a visita oficial de dois dias do primeiro-ministro de Portugal a Angola..Caetano Júnior, subdiretor do Jornal de Angola."O primeiro facto relevante é o reatar das relações, o que propicia o reforço da cooperação. Nos últimos 8-10 anos, registou-se um hiato na ligação oficial entre os dois países, o que se refletiu nos diferentes domínios. Portanto, para países de longa história comum e até laços culturais, os últimos anos foram perniciosos para ambos, com as consequências a atingirem os respetivos povos, muito particularmente os imigrantes (cerca de 150 mil em Angola e 20 mil em Portugal). A visita de Costa também confirma o fim da "crispação" que havia, causada pelo "caso Manuel Vicente", felizmente resolvido a contento das duas nações..Outro elemento relevante é a possibilidade de assinatura de acordos, sobretudo na área da Economia. O fim da dupla tributação pode ajudar a relançar investimentos de empresários portugueses em Angola, porque ajudaria a reduzir despesas. Também pode incentivar angolanos a apostar no mercado luso. Por outro lado, um acordo na Agricultura é capaz de revitalizar o setor, no qual Angola tem um grande potencial. O país africano procura diversificar a economia e reduzir as exportações, o que também passa pela aposta na Agricultura e Portugal tem vasta experiência neste particular. Há ainda a expectativa de diversificação das áreas de cooperação..Finalmente, a visita de António Costa envia um sinal de retoma, de confiança, que deve existir na cooperação entre países que começaram por se cruzar ou conhecer há 500 anos e por razões que a história, que a existência humana condena. Portanto, têm ambos consciência de que devem aproveitar o facto de terem aspetos positivos comuns, de que precisam retirar o máximo proveito para benefício dos povos..José Kaliengue, diretor do jornal O País."Depois de anos de interrupção de visitas ao mais alto nível, criou-se um ambiente mais descomprimido, capaz de melhorar a perceção que cada um dos lados tem do outro. De Portugal poder-se-á deixar de ver Angola como um quadrado africano da corrupção e de Angola deixa-se de ver Portugal como o retângulo europeu da intriga e da ingerência. E isto é fácil de notar, basta olhar para a forma como os jornais e as televisões dos dois lados estão a retratar o assunto, com muito mais "carinho" e com uma vontade manifesta de "ajudar" a que o passado fique no museu e que se olhe para o futuro, como disse António Costa no Museu de História Militar de Luanda..Um relançamento da apetência por Angola da parte dos empresários portugueses, em busca de participação na linha de crédito de 1,5 mil milhões de euros avançada pelo primeiro-ministro para Angola e também como resultado do compromisso angolano de saldar a dívida de cerva de 500 milhões de euros do Estado angolano com empresas portuguesas. E tudo isso somado ao acordo para o fim da dupla tributação, o que constitui um apelo forte para a internacionalização das empresas portuguesas para Angola e para o relançamento das exportações. Mas nisso de exportações é válido para os dois lados, tal como para os investimentos, porque há dinheiro angolano que precisa mesmo de sair do país e Portugal é um destino seguro de investimentos..É relançada a cooperação política bilateral, assim como a cooperação judiciária. No plano multilateral os países sempre cooperaram, mas as ligações podem ser reforçadas, quer no papel de Portugal na União Europeia para o apoio à ação angolana na resolução das crises na RDC e na República Centro-Africana, por exemplo, quer no "apoio" de Angola na ação portuguesa na Europa, fazendo com que Portugal não pareça tão pequeno na dimensão territorial da sua economia e da sua cultura, fundamentalmente a língua, que tem um território, na verdade, que vai para além das fronteiras portuguesas e europeias".