Putin nomeia sucessor de Medvedev após demissão do governo
O presidente russo, Vladimir Putin, propôs esta quarta-feira a realização de um referendo sobre reformas da Constituição para reforçar os poderes do parlamento, desencadeando os rumores sobre que jogadas estará a preparar para o final do mandato, em 2024. Em resposta, o governo de Dmitri Medvedev demitiu-se e o presidente já propôs um novo primeiro-ministro: o atual diretor-geral dos Impostos, Mikhail Mishustin.
"Considero necessário submeter ao voto dos cidadãos do país o conjunto das revisões da Constituição propostas", disse Putin no seu discurso anual ao parlamento e às elites políticas, sem adiantar quaisquer datas. No poder (ou como primeiro-ministro ou como presidente) há 20 anos, Putin está impedido de se candidatar a um novo mandato presidencial.
Putin sugeriu como uma das emendas à Constituição que os deputados passem a nomear o primeiro-ministro e os membros do executivo, direito que pertence agora ao chefe de Estado. A ideia passa por ser o Parlamento russo a eleger o primeiro-ministro, com o presidente a não ter direito a recusar e a ser obrigado a nomeá-lo. Atualmente, o Parlamento confirma a escolha do presidente para o cargo.
O primeiro-ministro, Dmitri Medvedev, disse depois de uma reunião com Putin que as propostas implicam mudanças significativas ao balanço de poder do país. "Nós, enquanto governo da Federação da Rússia, devemos dar ao presidente do nosso país os meios de tomar todas as medidas que se impõem. É por esse motivo (...) que o governo, no seu conjunto, entrega a sua demissão", indicou Medvedev -- cuja popularidade era inferior a 30%, frente a quase 70% de Putin.
O presidente russo aceitou de imediato a demissão, pedindo contudo aos ministros que se mantenham nos cargos de forma interina até um novo governo ser formado. "Quero agradecer-vos por tudo o que foi feito, exprimir a minha satisfação pelos resultados obtidos, mesmo se nem tudo foi alcançado", disse Putin.
Menos de uma hora depois, era conhecido o nome do sucessor de Medvedev: o atual diretor-geral dos Impostos, Mikhail Mishustin. Apontado como um tecnocrata sem ambição política, não é visto como um potencial sucessor de Putin na presidência. O seu mandato termina em 2024 e havia quem pensasse que o primeiro-ministro que agora nomeasse podia ser visto como um eventual sucessor.
Entre os potenciais candidatos falava-se do presidente da câmara de Moscovo, Sergei Sobyanin, do ministro do Desenvolvimento Económico, Maxim Oreshkin, ou do ministro da Energia, Alexander Novak.
Mishushtin, de 53 anos, tem um doutoramento em Economia e uma longa carreira como funcionário do governo, com uma algumas pausas durante as quais geriu o seu próprio negócio. Desde 2010 que estava à frente dos serviços de impostos, que modernizou com um programa que permite aceder ao minuto a todas as faturas emitidas na Rússia.
O nome deve ser aprovado na próxima semana no Parlamento russo, onde o partido de Putin tem uma confortável maioria.
Putin indicou no discurso que pretende criar o cargo de número dois do Conselho de Segurança da Rússia e oferecer a posição a Medvedev, segundo o site Russia Today. Medvedev foi presidente russo entre 2008 e 2012, quando Putin foi primeiro-ministro.
Entre as propostas de alterações estão ainda o reforço dos poderes dos governadores regionais, a proibição dos membros do governo e dos juízes de obterem residência no estrangeiro e a obrigação de os candidatos à presidência terem vivido nos últimos 25 anos na Rússia.
Putin defendeu, no entanto, que o país deve manter um sistema presidencial. "A Rússia deve continuar uma república presidencial forte e é por isso que o presidente manterá o direito de definir missões e prioridades do governo", disse, indicando que é a favor de o chefe de Estado cumprir apenas dois mandatos (ele vai no seu quarto mandato, segundo consecutivo após quatro anos como primeiro-ministro).
Adiantou que o presidente deve manter o direito de demitir o chefe do governo e os ministros, nomeará os principais responsáveis ao nível da defesa e segurança e poderá destituir os presidentes do Supremo Tribunal e do Constitucional.
O atual mandato de Putin termina em 2024 e já são muitas as especulações no país sobre os seus planos para o futuro. Ao dar mais poderes ao Conselho de Segurança, um órgão consultivo que criou em 2000 e ao qual preside, e transferir mais poderes para o Parlamento, Putin pode preparar o terreno para manter influência no país no final do mandato.
Vladimir Putin, 67 anos, está nos comandos do país há mais de 20 anos, mais do que qualquer outro líder russo ou soviético desde Josef Estaline. Em conformidade com a lei atual, que apenas permite dois mandatos presidenciais consecutivos, terá de deixar a chefia de Estado no final deste mandato.
Putin ainda não disse o que fará a seguir, mas os críticos acusam-no de querer continuar no poder de alguma forma. Uma das fórmulas podia passar por dar mais poder ao Parlamento e depois assumir o cargo de primeiro-ministro com poderes reforçados. Outra seria continuar a liderar o Conselho de Segurança, que Putin defendeu que deve ter mais poderes sob a nova Constituição.
Um dos principais opositores de Putin, Alexei Navalny, disse esperar que qualquer referendo seja "uma porcaria fraudulenta" e que o objetivo do presidente é ser "o único líder vitalício".
No discurso sobre o estado da nação, o presidente russo referiu ainda a necessidade de incentivar o crescimento da população, defendendo que as autoridades devem fazer mais para encorajar os nascimentos e apoiar as jovens famílias.
Prometeu assim que o governo vai atribuir mais subsídios às famílias que tiverem filhos.
Putin salientou que os baixos rendimentos continuam a ser um grande obstáculo ao aumento da população, considerando que o país está a enfrentar as consequências do colapso financeiro pós-soviético, que levou a uma queda acentuada de nascimentos.
A Rússia conta atualmente com cerca de 147 milhões de habitantes.
O último referendo na Rússia foi o de 1993, que permitiu adotar a constituição proposta por Boris Ieltsin.