Há cerca de duas mil pessoas (1936) a cumprirem prisão domiciliária com pulseira eletrónica. Estes valores, a 20 de setembro, representam um aumento de 22 por cento face a todo o ano de 2018, quando estavam neste regime 1578 detidos..Permitir uma melhor reinserção, nomeadamente os laços familiares e sociais, resolver os problemas de sobrelotação das cadeias e a redução de custos financeiros foram as razões que levaram a avançar com a prisão domiciliáriacom pulseira eletrónica para crimes menos graves, com penas até dois anos. Em termos económicos, as contas fazem-se assim: comparando os dois sistemas, reduz-se de 44 para 13 euros o custo diário por preso, segundo o Relatório Justiça (2015-2019), divulgado recentemente pelo Ministério da Justiça..O regime foi criado em novembro de 2017, com uma alteração ao Código Penal (Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto) que extinguiu as penas de prisão por dias livres - aquelas em que os condenados recolhiam aos estabelecimentos prisionais apenas ao fim de semana, ficando toda a semana em liberdade. Ainda há reclusos neste regime, mas estão a cumprir sentenças anteriores..tabela 2 Infogram.Os detidos na habitação podem trabalhar ou estudar, por exemplo, desde que tenham autorização do juiz. Existe uma central de comando com as informações sobre as deslocações autorizadas - sempre que o detido infringir, o GPS dá sinal na central. Foi o que aconteceu com Elton Camará, um dos acusados no caso do ataque à Academia de Alcochete que, depois de ir ao médico, esteve fugido várias horas até ser encontrado nesta quinta-feira pelas autoridades na casa de um amigo.."A prisão por dias livres era geralmente ineficaz no plano da ressocialização e desorganizava por completo a gestão dos estabelecimentos prisionais", afirma o presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses..Manuel Brandão Soares acrescenta: "O cumprimento da pena no domicílio é para os casos menos graves e tem a vantagem de permitir a manutenção dos laços de inserção familiar do condenado, cuja rutura é muito frequente e negativa e, quando ocorre, pode funcionar como elemento favorável à repetição do crime.".Na prática, a prisão em casa com vigilância eletrónica permite que os condenados - ou em prisão preventiva - sejam ainda mais vigiados, ao contrário do que acontecia com a prisão por dias livres. "Muitos condenados - por condução com álcool, por exemplo - apresentavam-se no estabelecimento prisional à sexta-feira embriagados e a conduzir automóveis", conta o presidente dos juízes..A ministra da Justiça, Francisca van Dunem, quando em 2018 fez o balanço do primeiro ano da entrada da lei em vigor, disse que o regime surge "como um instrumento de intervenção alternativo ao encarceramento, sendo que o seu futuro sucesso se sustentará mais na capacidade dos serviços de reinserção social em mobilizar o condenado para frequência de programas, atividade e tratamentos reabilitativos do que na intensidade e severidade do controlo ou supervisão penal tecnológica"..Violência doméstica no topo.Do total de 1936 detidos em casa, a grande fatia diz respeito ao crime de violência doméstica - são 925, um terço a mais se comparado com os números de 2018. De resto, 436 estão no regime domiciliário por obrigação de permanência na habitação (são em regra os preventivos), 527 cumprem pena, seis porque a execução da pena mudou, 26 estão a adaptar-se à liberdade condicional, nove por crime de perseguição (stalking) e sete por crime de incêndio..Ao mesmo tempo que se assiste ao crescimento de penas domiciliárias, vão descendo apenas de prisão cumpridas por dias livres - as existentes dizem respeito a condenações anteriores à entrada em vigor do novo regime. A média anual sempre esteve nos cerca de 500 casos, atualmente há 154 pessoas que passam os fins de semana nos estabelecimentos prisionais.."A aplicação do novo regime de penas curtas implicou o aumento da capacidade de resposta em matéria de vigilância eletrónica não só na perspetiva do número de aparelhos mas também na de técnicos e meios de apoio. Na comparação entre os dois sistemas, numa perspetiva financeira, reduz-se de 44 para 13 euros o custo/preso", refere o Relatório Justiça (2015-2019)..A necessidade urgente de aparelhos.As penas vigiadas através de pulseiras eletrónicas foram também notícia pela compra urgente de aparelhos. No início do ano passado, o Público noticiou que o Ministério da Justiça assinou à pressa a portaria que prevê a compra, sem concurso público, de 1500 pulseiras até 2019, embora soubesse que iria precisar de mais aparelhos desde 2015. A previsão de gastos rondava 1,1 milhões, sem IVA..A secretária de Estado da Justiça, Helena Mesquita Nunes, argumentou então que o ajuste direto se deveu ao facto de os técnicos da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais não quererem correr o risco de terem de trabalhar com um sistema diferente..Já em agosto de 2018, o Conselho de Ministros aprovou o prazo contratual de cinco anos (2020-2024) para aquisição de equipamentos de vigilância eletrónica, por forma a "garantir alguma estabilidade ao sistema de vigilância eletrónica" que é "um garante da fiscalização das decisões judiciais e da proteção das vítimas".