Os livros da semana: Ana Teresa Pereira, George Orwell e Fareed Zakaria
Impossível fugir à perseguição literária de Ana Teresa Pereira
Nas três partes em que o mais recente livro de Ana Teresa Pereira se divide há sempre alguém que espreita sobre o ombro de outro personagem para ver o que este está a fazer. É assim também que o leitor continua a sentir-se com as histórias da escritora e em Os Perseguidores essa sensação de que as páginas foram escritas com um destinatário universal não desaparece. Mais, tal como a personagem da terceira parte diz - "Inclinava-me sobre o ombro dele a vê-lo trabalhar. Tinha esse direito" -, o leitor não deixa de se sentir à vontade para devorar este trio de situações, que chegou às livrarias nas últimas semanas de dezembro, sem incómodo algum e até de uma única vez.
Em A Firefly Hour existe um cenário pouco habitual na escritora, o da cidade de Nova Iorque, com quase sexo comprado e sensações físicas despudoradas, inesperadas e insistentes, bem como de um jazz a repetir-se em vez das imagens de filmes antigos como os de Audrey Hepburn que pontuam a narrativa em Os Perseguidores, na qual também regressam os lugares e as palavras habituais e a que quem a lê se acostumou: charneca, nevoeiro, lago, palco, lábios flores... Em todos os textos existe uma rua que separa a morada da protagonista do seu interesse no outro lado da via. De todos eles, é em A Lagoa que se pressente ser verdade o que alguém atrás dissera: "Nunca acabas as tuas histórias"; afinal os livros que trouxeram Ana Teresa Pereira até aqui nunca se fecharam para sempre depois de serem publicados. O que exige aos leitores continuarem sempre na sua excecional companhia literária.
Os Perseguidores
Ana Teresa Pereira
Editora relógio D'Água
Viver as distopias de George Orwell em várias edições simultâneas
Se até há pouco tempo era principalmente a editora Antígona que persistia em manter dois dos títulos de George Orwell sempre à disposição dos leitores, neste início de 2021 quem quiser um volume de 1984 ou de A Quinta dos Animais pode entrar em crise de identidade pois vai ter nas livrarias várias edições, sendo que no caso de 1984 apenas a verá com esse título mas no da A Quinta dos Animais poderá adquirir o mesmo texto sob o nome de O Triunfo dos Porcos.
Assim sendo, a editora Bertrand lança em janeiro a "sátira ao totalitarismo através de uma revolução levada a cabo pelos animais da Quinta do Solar contra a tirania dos humanos", ou seja O Triunfo dos Porcos, e em fevereiro o romance 1984.
Por seu lado a Livros do Brasil volta a editar Orwell, primeiro a Quinta dos Animais, com prefácio de Jorge Sampaio, e seguidamente 1984.
Quanto à Porto Editora, as edições que vai disponibilizar de 1984 e de A Quinta dos Animais conta com, respetivamente, capas de autoria de Vhils e de GonçaloMAR.
Também a D. Quixote vai publicar a sua edição destes dois livros, O Triunfo dos Porcos e 1984, ainda este mês.
Não esquecer que 1984 tinha sido objeto de uma ótima adaptação sob o género de novela gráfica pelo artista brasileiro Fido Nesti lançada no fim do ano passado na Alfaguara.
Sai também pela Edições 70 o volume Ensaios, com textos dispersos do autor sobre cultura, história, sociedade e política.
Esta chuva de versões em tempo quase tão distópico como o que George Orwell descrevia dever-se-á à libertação dos direitos de autor após 70 anos da morte do escritor, no entanto lembre-se de que a Antígona tem uma grande parte da obra no catálogo, como Homenagem à Catalunha.
1984, Quinta dos Animais e Ensaios
George Orwell
Várias editoras
Fareed Zakaria: fazer uma previsão em 2017 e passá-la à escrita agora
O nome Fareed Zakaria é por demais conhecido dos espectadores de televisão através do seu programa no canal CNN, daí que dar o salto para o formato livro não seja um passo difícil. Até porque Zakaria não foge às imagens e às letras quando deseja expressar as suas ideias, como o faz a dado momento neste volume quando pega na narrativa de T.E. Lawrence de Os Sete Pilares da Sabedoria e a casa com o filme Lawrence da Arábia para referir que "nada está escrito" no mundo que está a ser inaugurado em consequência da pandemia de covid-19. Alerta, no entanto, que as "forças começam a ganhar balanço" e a civilização encontra-se num estado em que "as pessoas podem escolher a direção que pretendem tomar" porque "agora estamos mais livres". Zakaria recorda que nem sempre a história esteve nas mãos dos habitantes do planeta e que por várias vezes "seguiu por um caminho já traçado", situação diferente da que se vive, pois "o novo coronavírus deixou a sociedade de pernas para o ar mas a mudança torna-se mais fácil do que nunca". Entre os argumentos que arrebanha, está o da resposta à pandemia, como de existir uma concordância generalizada no confinamento ou de se aceitar o teletrabalho como forma de continuar a atividade profissional. Neste último caso considera que as "empresas alteraram políticas que num contexto normal lhes levariam anos a rever", bem como o facto de os governos terem aberto os "seus cofres com uma maior disponibilidade", a par de uma maior colaboração internacional. Como suporte deste livro está uma "previsão" do autor de 2017, em que referia o "estalar de uma crise devido aos vírus". Só lhe faltava escrever.
Dez Lições para um Mundo Pós-Pandemia
Fareed Zakaria
Editora Gradiva