Ordem dos Psicólogos: "Preconceito, violência e estigma sobre homossexualidade é que podem causar sofrimento psicológico"

A Ordem dos Psicólogos reage à reportagem da TVI sobre terapias de conversão de homossexuais, frisando que estas terapias "não têm qualquer fundamento" e que a atuação de Maria José Vilaça, a psicóloga que surge na reportagem como ministrando tais terapias, foi objeto de participação ao respetivo órgão deontológico -- a juntar à sobre o mesmo assunto que aguarda há dois anos conclusão.
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"De acordo com toda a evidência científica disponível, o muito amplo consenso entre investigadores e profissionais e a posição das principais organizações profissionais de Saúde e de Psicologia internacionais, a homossexualidade não é uma perturbação mental nem implica qualquer tipo de incapacidade, sendo uma variante da sexualidade humana, não podendo ser, desta forma, associada a qualquer forma de psicopatologia. Pelo contrário, são o preconceito, a violência e o estigma social sobre a homossexualidade que podem causar sofrimento psicológico."

O comunicado da Ordem dos Psicólogos portugueses, suscitado pela exibição na TVI, esta quinta-feira, de uma reportagem de Ana Leal sobre "um grupo secreto" que levará a cabo terapias de conversão sexual, e do qual fará parte a psicóloga Maria José Vilaça, assim como do debate que se seguiu, também com intervenção da dita psicóloga, é claro na rejeição da ideia de que a homossexualidade possa ser vista como doença, logo, que tratá-la como tal consubstancia má prática profissional. E que portanto "intervenções como as "terapias de conversão" ou "reparação" (terapias que procurem reduzir ou eliminar a homossexualidade) não têm qualquer fundamento, quer do ponto de vista da sua validade científica, ética, da sua eficácia e benefícios, sendo, pelo contrário, assinaláveis os potenciais riscos e prejuízos para a saúde." De facto, prossegue o texto, "os esforços para modificar ou "curar" algo que não é um problema de Saúde Mental (e que, portanto, não necessita de qualquer tipo de tratamento ou terapia) podem causar grande dano (por exemplo, sofrimento emocional, depressão, auto-imagem negativa) e contribuir para reforçar o estigma social que também prejudica os indivíduos homossexuais."

Esclarecendo ter, "pelo teor e conteúdos" da reportagem e do debate, efetuado uma participação ao Conselho Jurisdicional, a direção da OPP, naquilo que parece um apelo a denúncias de situações deste tipo, frisa de seguida que "todos os cidadãos, com conhecimento de causa de situações que possam consubstanciar má prática profissional, devem disso dar conhecimento, com relato de todos os factos", ao dito conselho.

Recorde-se que foi feita em 2016, ao mesmo órgão, uma primeira participação relativa a Maria José Vilaça e à forma como se referiu publicamente à homossexualidade numa entrevista à revista Família Cristã. Nesta, a psicóloga afirmou que "ter um filho homossexual é como ter um filho toxicodependente, não vou dizer que é bom." A direção da OPP à época considerou as declarações de Vilaça "de extrema gravidade", sublinhando não se rever "nas afirmações proferidas" e que estas "não representam a opinião da OPP", não apresentando "qualquer tipo de base científica". A OPP considerou ainda que tais declarações "apenas contrariam a defesa dos direitos humanos, da evolução e equilíbrio social, e dificultam a afirmação dos psicólogos na sociedade que tem sido prosseguida com enorme dedicação e empenho por múltiplas/os psicólogas/os." Esta participação está porém ainda em análise no Conselho Jurisdicional e difere da atual porque se refere a declarações públicas, enquanto a atual tem a ver com eventual má prática clínica.

A direção da OPP volta no atual comunicado a reiterar que os psicólogos não podem participar em "quaisquer práticas discriminatórias", devendo respeitar "os direitos, os valores e as opiniões do outro (mesmo que diferentes das suas próprias), assim como a sua autodeterminação e autonomia." E adverte: "Seguindo os princípios do Código Deontológico da profissão, os Psicólogos são encorajados a reflectir sobre os limites da sua prática quando trabalham com clientes com identidades de género ou orientações sexuais minoritárias, assim como a considerar a necessidade de formação específica e o encaminhamento para outros profissionais sempre que necessário. Os Psicólogos devem ainda basear todas as suas intervenções em evidências científicas sólidas."

O comunicado da OPP refere ainda a sua preocupação "relativamente à forma não autorizada ou consentida de obtenção das imagens apresentadas na reportagem", que recorreu ao uso de "câmara oculta", facto que foi denunciado por Maria José Vilaça durante o debate (que acabaria por abandonar), "por indiciarem um crime de "Gravações e fotografias ilícitas" e do "Direito à Imagem", disposto no Código Penal e Código Civil Português."

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