Alguém precisava de mais um Rambo? Só mesmo a conta bancária de Stallone... O incrível é que, segundo os primeiros resultados das bilheteiras internacionais, a produtora Millennium terá um êxito-surpresa e nos EUA chegou a ficar muito perto de Ad Astra com Brad Pitt....Afinal, a ideia de ver Rambo a matar e a esventrar muitos mexicanos atrai muita gente. Este Rambo - A Última Batalha, de Adrian Grunberg, está a ser vexado pela imprensa em todo o mundo e não é exagero. O capítulo número cinco da saga do ex-veterano da Guerra do Vietname é excessivamente jurássico, estupidamente complacente com a máxima da fantasia machista do herói castigador e sem qualquer noção de política de espetáculo cinematográfico..Nem mesmo as cenas de ação são filmadas com intensidade ou qualquer sobra de realismo. Stallone é uma pobre máquina de matar. Ser Rambo ou outra personagem de Sly de série B é igual - aliás, desta vez nem há a fita na testa nem o cabelo comprido, apenas um surpreendente chapéu de cowboy..John Rambo já não mora aqui, apenas um tipo com fúria de matar que tenta vingar a sua afilhada de origem mexicana, uma jovem que atravessa a fronteira para conhecer o pai e acaba por ser sequestrada por um bando de criminosos para ser rentabilizada como prostituta. Primeiro, Rambo, sozinho e sem muita munição, tenta o resgate. Depois, já mais furioso, é tempo de enfrentar um exército de sicários no seu rancho americano, local com armadilhas militares e um túnel em que há explosivos e caminhos secretos. No grande combate (será mais justo chamar-lhe matança) o arsenal bélico de Rambo é já ilimitado....De salientar que a saga Rambo começou com A Fúria do Herói (1983), brilhante drama de ação de Ted Kotcheff, que adaptava um romance de David Morrell em que Rambo, em plena agonia, era abatido pelo seu próprio mentor depois de ter percebido que se tornara uma autêntica máquina de guerra. Na altura, a Orion não deixou que Richard Crenna pusesse uma bala de misericórdia na cabeça do herói caído. Compreensivelmente, David Morrell já veio a público dizer que este novo capítulo é uma trapalhada e uma vergonha....A partir daí, o filme mudou de mãos e os novos produtores quiseram fazer cinema de ação puro e duro e tornar Rambo símbolo de um imperialismo americano. Seguiu-se Rambo II - A Vingança do Herói (1985), de George P. Cosmatos, que o fazia regressar ao inferno do Vietname. Aqui a densidade psicológica da personagem já não era humana, mas sim a de um super-herói de bazuca nos braços..Rambo III (1988), de Peter MacDonald, levava-o ao Afeganistão e punha-o a matar russos em tempos de Guerra Fria. O filme fazia uma pipa de dinheiro e o franchise era inevitável. Em Portugal, a popularidade de Rambo junto de uma geração de miúdos da década de 70 era um caso de estudo sociológico. Por estas alturas, Stallone já tinha a rivalidade de Arnold Schwarzenegger como "herói de ação"..Com um orçamento menor, John Rambo (2008), do próprio Stallone, era uma abordagem interessante à estética série B e a iconografia da personagem estava salvaguardada. A ação passava-se em Burma e Rambo parecia estar num transe violento e remetido para o submundo de Banguecoque. Aliás, havia uma espécie de fim de ciclo que este novo filme trai por completo. E, à exceção dos Rocky, os filmes realizados por Stallone parecem sempre ter um ponto de vista, sobretudo o injustamente esquecido O Beco do Paraíso (1978) e o muito contido Rocky Balboa (2006)..Como cineasta, parece sempre que se interessa mais pelas personagens do que pelas cenas de ação, estando a ganhar grande expectativa o seu regresso atrás das câmaras em Tough as They Come (estreia para o ano), sobre um herói de guerra do Afeganistão que perdeu os seus membros. Não é de mais recordar que Sly Stallone já foi nomeado para os Óscares por três vezes: ator secundário em Creed, ator em Rocky e argumentista nesse mesmo primeiro Rocky, em 1977 nomeado para dez Óscares e grande vencedor desse ano..É precisamente por isso que dá dó vê-lo a arrancar o coração de mexicanos neste novo Rambo, filme de violência gratuita e com um ritmo aborrecidíssimo. Exercício teimoso de um cinema de ação jurássico,celebra a eliminação de mexicanos em território de Trump. Incompreensivelmente, leva-se também muito a sério, sobretudo na glorificação da vingança de Rambo. Nesse sentido, e aqui está a surpresa maior, não deixa de ser excessivamente sentimentalão, sobretudo quando o nosso herói tem a fragilidade paternal exposta..Seja como for, é um negócio garantido - o anterior John Rambo fez mais de cem mil espectadores por cá e Rambo é sempre Rambo. Os portugueses são fãs de Stallone, artista que neste ano foi alvo de homenagem do mais exigente dos festivais: Cannes!