O "George Clooney dos Açores" que lidera a crise sanitária no arquipélago e até tem um clube de fãs

O diretor regional da Saúde dos Açores é uma estrela nas redes sociais. Grupo de fãs de Tiago Lopes no Facebook foi criado no dia 5 de abril e já tem mais 33 mil seguidores. Uns pedem que seja condecorado, outros que se candidate a presidente do governo regional ou até que seja promovido a ministro da Saúde.
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Tiago Lopes entra pela casa dos açorianos todos os dias a meio da tarde com o boletim diário sobre o coronavírus. As gravatas, os pulôveres de todas as cores e feitios, cabelo grisalho e a clareza da mensagem do diretor regional da Saúde dos Açores têm cativado e até trazido algum sossego à população em tempos de pandemia. Ele é o rosto da gestão da crise sanitária nos Açores e tornou-se de tal maneira mediático que já ganhou um grupo de seguidores no Facebook. Criado no dia 5 de abril, o Fãs de Tiaguim - diminutivo carinhoso em dialeto açoriano para Tiaguinho - já se tornou viral e só em 24 horas ganhou 20 mil novos consignatários. Ao fim da tarde desta quarta-feira já tinha mais de 33 mil seguidores.

Todos parecem admirar a serenidade de Tiago Lopes na comunicação oficial dos números de infetados no arquipélago (72 e um morto). Uns dizem que "é o rosto da tranquilidade", outros dizem que "transmite segurança e competência no que diz". Até o tom de voz com que responde às perguntas mais difíceis e incómodas dos jornalistas ganhou adeptos. Já para não falar dos milhares de caricaturas, memes e adaptações gráficas. Há mesmo uma publicação de uma internauta que mete a cabeça de Tiago Lopes no corpo de um jogador da seleção e escreve: "Se a Madeira tem o Ronaldo, nós temos o Tiaguim." Uma outra destaca as semelhanças com o ator George Clooney e chama-lhe "o George Clooney dos Açores".

Brincadeiras à parte, os pedidos de condecoração são de perder a conta e há seguidores que vêm nele capacidade para "ser ministro da Saúde" ou mesmo "candidato a líder do governo regional".

O grupo começou por iniciativa de Rita Mendes. "O objetivo nunca foi criar um grupo de fãs. Via tantas publicações sobre o trabalho do Tiago Lopes no Facebook que resolvi criar um grupo que agregasse todo esse material que enaltecia o trabalho do diretor regional da Saúde", contou ao DN, "muito surpreendida com a dimensão" que o grupo de Fãs do Tiaguim já tem e com a forte adesão feminina. E cresceu tanto que Rita teve de pedir ajuda para o administrar. São já oito pessoas que filtram ofensas e conteúdo impróprio, tudo o resto é liberdade de expressão: "A verdade é que as críticas são na maioria positivas e as mensagens muito respeitosas. Até a mulher dele já é seguidora da página e comentou algumas publicações na qualidade de "fã número um'."

A administradora do grupo gostava que o diretor regional soubesse que a iniciativa "foi uma espécie de homenagem", pois, apesar de todo o cenário negro de pandemia, "ele consegue transmitir muita confiança no que está para vir" e "há um sentimento generalizado de que as medidas tomadas até agora são as indicadas para a situação".

"Sem jeito" com alguns elogios, confessa Tiago Lopes

Este fenómeno apanhou o diretor regional da Saúde dos Açores de surpresa. "Fui alertado para isso pouco antes desta conversa e para ser sincero ainda nem tive tempo de ir espreitar. Mas isto para mim é uma surpresa, não sei quem teve a ideia e o que pretendia", confessou ao DN Tiago Lopes, pouco depois de voltar a entrar pelas casa dos açorianos adentro para dar as últimas do boletim do covid-19.

Confessa que sempre foi algo introvertido e nunca ligou à moda. A escolha da gravata e dopulôver que tanto estão a dar que falar nas redes sociais é simplesmente para aparecer "mais arranjadinho e ter um cariz mais profissional", afinal ocupa um cargo de grande responsabilidade e a ocasião exige mais formalidade. Fora isso prefere roupa mais casual para ter mais liberdade de movimentos.

"Sem jeito" com alguns dos elogios, Tiago Lopes defende que tem tido uma postura normal face ao "enorme desafio"que é a luta contra o coronavírus. "O segredo, se é que o há, é o pôr-me no lugar de quem me escuta. Já quando lidava com doentes sentia da parte deles uma necessidade de informação séria e credível, que isso os acalmava. Agora, como diretor regional tento fazer o mesmo", explicou, lembrando que é muito difícil fazer passar a mensagem que realmente importa sem criar ruído.

Chamam-lhe Dr. Tiago Lopes por força do cargo que ocupa, mas é enfermeiro de profissão. Licenciado pela Escola Superior de Saúde da Cruz Vermelha Portuguesa (2003), fez várias pós-licenciaturas e pós-graduações em Gestão de Enfermagem, Reabilitação e Unidades de Saúde. Em 2014 começou a exercer no hospital da ilha Terceira. Tinha 31 anos quando chegou à liderança dos enfermeiros dos Açores e iniciou uma espécie de cruzada contra os serviços de saúde, nomeadamente o combate ao flagelo das listas de espera cirúrgicas na região.

Tornou-se uma voz inconformada na defesa do papel dos enfermeiros e começou a escrever sobre saúde no Diário dos Açores. Talvez tenha sido aí que aprimorou os dotes comunicacionais. Fazia questão de falar com clareza e usar informação credível. Agora tem pela frente o desafio mais importante da sua vida: confinar o vírus e tranquilizar 240 mil açorianos.

Região com 72 infetados e um morto

A região dos Açores tem 72 infetados com coronavírus. "O surto tem vindo a evoluir e é com alguma apreensão que acompanhamos a situação e tentamos quebrar algumas cadeias de transmissão. A que está mais ativa é na ilha de São Miguel", explicou Tiago Lopes ao DN, ainda antes de "lamentar" a primeira morte na região, em São Miguel, esta quarta-feira.

Identificar os focos de propagação tem sido uma das prioridades da Direção Regional da Saúde (DRS), sem esquecer a gestão e a reposição de stock de material médico necessário para o combate ao coronavírus. "Houve pontualmente em algumas unidades de saúde alguns profissionais que sentiram falta de determinado equipamento individual, mas conseguimos resolver a situação dentro da nossa realidade insular, com nove ilhas, com o stock que tínhamos da reserva estratégica e alocando entre unidades de saúde. Agora já recebemos aquele material que tínhamos encomendado atempadamente e estamos um pouco mais folgados, mas com este surto nunca estamos descansados, de um momento para o outro a situação pode descontrolar-se", admitiu.

A trabalhar no confinamento do vírus, Tiago Lopes confessa que houve algumas dificuldades acrescidas no desempenho do cargo em plena crise sanitária: "O vírus veio na pior altura. A DRS-Açores sofreu uma mudança muito profunda por via da extinção de uma entidade empresarial, cujas competências passaram para a DRS em janeiro. Ainda estávamos na fase de mudança de competências, de integração de funcionários e adaptação de novo contexto quando apareceu o surto na China, que em poucas semanas chegou à Europa, depois a território continental e depois aos Açores, e as nossas prioridades mudaram para dar a melhor resposta à situação, lidando com um inimigo invisível e oportunista."

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