Começou ontem oficialmente o histórico Cinanima, este ano sob a batuta de Pedro Serrazina, realizador de animação, o nome ideal para dar um novo fôlego a um festival que quer recuperar o prestígio perdido. Na 45.ª edição olhamos para a programação e encontramos sangue e ideias inovadoras. Um festival em rota de outro ciclo que quer agitar as águas e trazer animação para um público adulto e ser sobretudo um encontro cultural, onde as exposições e as instalações podem ganhar um peso igual ao da passagem de filmes..Na abertura, foi bonito ver no Centro Multimeios de Espinho casa cheia com Where is Anne Frank, o novo e bem singular filme de Ari Folman, uma animação que imagina a amiga imaginária de Anne Frank nos nossos dias. Prova de vida de um público que ainda acredita que este não é um festival obsoleto. Yoni Gooodman, o diretor de animação do filme, esteve presente e esta quarta-feira tem uma conversa com o público alguns quilómetros a norte, no Porto, nos Maus Hábitos.."Este festival só poderá sobreviver se tiver alternativas à mera passagem dos filmes. Tem de ter as exposições, as conversas com os realizadores, as masterclasses, tudo o que as pessoas não encontram nas plataformas, onde também há tanta animação. A animação está, aliás, em toda a parte, diria até que a animação já é a imagem real! Não faz sentido os outros festivais que não são de animação terem em competição curtas experimentais que são animação... Temos de reclamar isso para nós, com tempo vamos lá", diz-nos visivelmente entusiasmado Serrazina, claramente um diretor artístico a querer mudar um rumo mas também a avisar que é preciso apoio do público e da autarquia de Espinho..Das exposições que Espinho tem à disposição de todos desde ontem destaca-se a Imagines- Nostrae Animae, a partir do trabalho de 11 grandes ilustradores portugueses para a Animanostra, onde se incluem desejos e uma espécie de cadernos de esboços de nomes como Filipe Abranches, João Fazenda, Catarina Sobral ou André Letria... Uma maravilha para ver na Junta de Freguesia de Espinho.."Este ano há uma intenção de trazer certos temas para debate na programação. Questões contemporâneas a que cada vez mais o cinema de animação não fica alheio. O festival quer realmente ter uma consciência social, política e cívica", complementa o diretor. Acima de tudo, o objetivo é pensar num cinema de animação expandida, um cinema para interpelar os espectadores. E se há outros festivais de imagem real que canibalizam o cinema de animação, Pedro Serrazina lança uma espécie de ameaça: "Porque não nós no futuro também começarmos a pensar em exibir cinema de imagem real? Por exemplo, a maneira como aquelas imagens do cinema de Pedro Costa, trabalhadas uma a uma, não serão animação, se quisermos extrapolar?! E, depois, há o digital: fronteira que já não é uma linha, mas sim um espaço enorme onde a imagem real e a animação se encontram. Tudo se mistura no digital... Em último caso, é sempre a imagem manipulada"..Considerações à parte, o Cinanima prossegue em vários espaços de Espinho até domingo, embora no sábado tenha o seu pique com o simpósio Olhares sobre a Animação Portuguesa, possibilidade para conferir uma tendência muito nacional de incorporar o real neste género. Serrazina concorda e nem acredita ser uma moda: "O cinema de David Doutel e Vasco Sá é uma prova disso e vamos poder sentir tal intenção no Olhares sobre a Animação Portuguesa. Olhamos para esses filmes e vemos retratos de Portugal e um repositório de elementos que podem ser nossos. O lado documental na animação portuguesa premeia a ficção. Aí a animação até tem uma vantagem: permite a interpretação poética da realidade"..dnot@dn.pt