Aumento do ruído e da poluição atmosférica nas zonas adjacentes ao Montijo, incluindo o Barreiro, a Baixa da Banheira ou a Moita, onde residem centenas de milhares de pessoas, impactos no território, com grande acréscimo de infraestruturas e rede de transportes viários ou ainda consequências para a biodiversidade local e a sua conservação, nomeadamente para as aves, eis alguns dos impactos que são expectáveis para um futuro aeroporto no Montijo, no local onde hoje está Base a Aérea n.º 6..Perante estes riscos, e ainda sem o estudo de impacto ambiental feito, as associações ambientalistas são unânimes em criticar o acordo que o governo celebrou na quarta-feira da semana passada com a ANA, a gestora dos aeroportos nacionais, para a concretização do projeto do aeroporto do Montijo e a expansão da capacidade do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa.."Lamentamos que o governo tenha esta posição de que a decisão está tomada sem que tenha sido sequer apresentado e discutido o estudo de impacto ambiental", diz Nuno Sequeira, da direção nacional da Quercus. "Esse acordo deveria ser o último passo neste processo, que tem sido gerido de forma irresponsável e inqualificável", sublinha..A mesma crítica faz a ZERO, que fala "em falta de transparência" e que decidiu avançar para os tribunais. "Até final de janeiro, início de fevereiro, vamos avançar com uma ação judicial para obrigar o Estado a fazer também [além de um estudo de impacto ambiental] uma avaliação ambiental estratégica, não apenas para o Montijo mas também em relação à expansão prevista do aeroporto em Lisboa", adianta, por seu turno, Carla Graça, da ZERO..Uma avaliação deste tipo, nota a dirigente ambientalista, "é obrigatória segundo as regras europeias para uma infraestrutura desta dimensão e implica uma análise mais vasta das suas consequências que abrange não só o impacto ambiental, mas também o impacto no ordenamento do território e nas atividades socioeconómicas, uma vez que há uma série de novas infraestruturas de edifícios e de rodovias que vão ser construídas", adianta Carla Graça..Em agosto, a ZERO já tinha avançado com uma queixa à Comissão Europeia a propósito do futuro aeroporto no Montijo, estando essa "queixa neste momento em análise, de acordo com as informações que temos de Bruxelas", adianta a dirigente..Embora o primeiro-ministro, António Costa, tenha afirmado, já depois de assinado o acordo com a ANA, no debate quinzenal na Assembleia da República, na última quinta-feira, que "não haverá aeroporto no Montijo" se o estudo o de impacto ambiental não o permitir, ZERO e Quercus consideram que a assinatura do acordo "é um fator de pressão inaceitável sobre a administração pública, para que o estudo venha a ser aprovado"..A ANA, a entidade que tem a responsabilidade de submeter à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) o estudo de impacto ambiental sobre o aeroporto do Montijo, prevê fazê-lo "nos primeiros meses de 2019, previsivelmente até final de março", adiantou ao DN fonte oficial da ANA..Após a entrega do estudo, a APA, tem de pô-lo em consulta pública durante 30 dias e só, depois, reunindo todos os dados, incluindo os contributos que saírem dessa consulta pública, a comissão de avaliação da administração pública vai pronunciar-se sobre essa documentação e dar - ou não - o aval ao aeroporto do Montijo. Previsivelmente, nunca antes de abril..Aumento do ruído e da poluição.Uma das questões que mais têm sido apontadas como potencialmente problemática para o futuro aeroporto no Montijo é a sua localização junto à Reserva Natural do Estuário do Tejo, que é também sítio Rede Natura 2000 e habitat protegido para as aves - três estatutos de proteção para a conservação das espécies ali existentes..Sendo um sítio de passagem de espécies migratórias entre o norte da Europa e África e local de nidificação de muitas outras - estima-se que anualmente, de setembro a março, passem por ali entre 150 mil a 200 mil aves de mais de 150 espécies -, "há dois tipos de riscos", alertam os ambientalistas. "O de um impacto negativo na conservação das espécies, mas também o risco para a segurança das aeronaves que as aves podem colocar", adianta Carla Graça..Uma das aves de grande porte que é uma das marcas emblemáticas da reserva é o flamingo. Mas, como sublinha Carla Graça, "as aves não reconhecem fronteiras administrativas e, por isso não se limitam a ocupar o território da reserva". O facto é que "já foram identificados núcleos de flamingos a nidificar na região, fora do território da reserva"..O flamingo, no entanto, é apenas uma da muitas aves que fazem ali invernada (passam o inverno). Outras são, por exemplo, os pernilongos e os borrelhos, os patos e as andorinhas-do-mar-anãs ou ainda as perdizes-do-mar, que gozam do estatuto de proteção e conservação que a reserva e a diretiva das aves implicam. Uma simples visita à reserva durante a época da invernada obriga ao mínimo ruído possível, para não perturbar a tranquilidade das aves, como se lê no site do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF)..É expectável, alertam os ambientalistas, que se coloquem problemas em relação à proteção dos habitats e a conservação das suas espécies. O nível de ruído na região, nomeadamente, "vai aumentar, dada a previsão de 26 movimentos de aviões por hora no futuro aeroporto", sublinha Carla Graça..Mas este não será o único problema. "Vai haver também um acréscimo de poluição atmosférica decorrente, não só do tráfego aéreo propriamente dito, mas também do trânsito terrestre que lhe estará associado por via terrestre, já que a expectativa é que através do aeroporto do Montijo cheguem anualmente a Portugal cerca de 10 milhões de passageiros, que terão depois de se deslocar para Lisboa e outras zonas do país", estima Carla Graça, sublinhando que "o projeto nada diz sobre desenvolvimento da ferrovia para garantir esse fluxo terrestre acrescido de passageiros"..Resta saber agora como todos estes problemas poderão ser compatibilizados com a proteção das aves, sendo certo que as respostas a todas estas questões terão de ser equacionadas pelo estudo de impacto ambiental..Primeiro estudo voltou para trás.O primeiro estudo de impacto ambiental para o aeroporto no Montijo, que a ANA submeteu à APA, em julho do ano passado, foi mandado para trás e não chegou sequer à fase de consulta pública. Embora o estudo não tenha sido tornado público, a APA requereu informações adicionais, e as questões relacionadas com as aves eram, aparentemente, algumas das que estavam em causa.."O que veio a público, na altura, foi que os detalhes em falta estariam relacionados com o impacto do aeroporto na avifauna e com as as questões de segurança que ela coloca à operação das aeronaves", lembra Nuno Sequeira.."Agora aguardamos o estudo que há de ser entregue à APA e ficar em consulta pública, para analisarmos o documento e emitirmos a nossa opinião, mas lamentamos que o governo tenha avançado para um compromisso sem este passo imprescindível", afirma o dirigente da Quercus..A ponderação de outras localizações é outra questão fundamental para os ambientalistas. "Era importante fazer um estudo comparativo entre as várias hipóteses de localização, incluindo, nomeadamente, Alverca e Sintra e os requisitos técnicos em termos aeronáuticos, além das questões ambientais", especifica Nuno Sequeira. Já Carla Graça lembra que o aeroporto de Beja poderia ser uma hipótese a equacionar, acompanhada de uma boa ferrovia, até para abrir novas oportunidades àquela região do interior do país", sublinha, por seu turno, Carla Graça..Na prática, os ambientalistas recusam que a opção Montijo seja um facto consumado, mesmo antes de haver um estudo de impacto ambiental. A ZERO avança, por isso, já nas próximas semanas, para a referida ação judicial, "para que seja reposta a legalidade e realizada uma avaliação ambiental estratégica"..Já a Quercus garante que analisará pormenorizadamente o estudo de impacto ambiental que há de ser submetido pela ANA à APA e que "fará tudo ao seu alcance para reverter os processos e proteger o interesse público, se avançarem decisões políticas sem o necessário suporte ambiental". Para os ambientalistas, a escolha do Montijo para o novo aeroporto na região de Lisboa é tudo menos irreversível.