Militares na segurança interna: "Dominar o poder de fogo é fundamental"
O Chefe de Estado-Maior do Exército francês alertou para a necessidade de treinar os militares empenhados na segurança interna a "controlar" o seu poder de fogo quando fazem os patrulhamentos. O general Jean-Pierre Bosser, que falava esta quarta-feira numa conferência organizada pela Academia Militar, reconheceu que esse era um fator a ter em conta quando se colocam militares, formados para missões no exterior, em patrulhamentos internos, como acontece em França no âmbito da Operação Sentinela, em vigor desde 2015, no âmbito da qual cerca de oito mil elementos das Forças Armadas estão empenhados no território nacional na prevenção terrorista.
Na plateia, alguns oficiais de polícia e muitos militares, ouviam atentamente o general que veio falar da experiência francesa nesta matéria, principalmente porque está neste momento em discussão entre o Sistema de Segurança Interna (SSI) e as Forças Armadas a utilização de militares em patrulhas de prevenção conjuntas com os polícias, em caso de ameaças graves à segurança nacional, como a terrorista.
Embora apenas tivesse dado um único em exemplo de utilização inadequada da arma por parte de militares, Jean-Pierre Bosser salientou que "o empenhamento de militares em território nacional deve ter uma preparação específica e tem um elemento chave que é o domínio do poder de fogo, muito diferente do que é utilizado em missões no exterior". O general revelou que em França "houve um caso em que um soldado abriu fogo e foi a loucura. Dominar este poder de fogo é fundamental".
As patrulhas militares, no âmbito do plano Sentinela, ativado em reação aos atentados terroristas em França de 2015, têm como missão a visibilidade dissuasora e a intervenção só em caso de ameaça em curso. Não têm poderes de polícia, como a de pedir identificação ou revistar um carro, por exemplo. "Não sentimos essa necessidade. A nossa missão é proteger a população e evitar que aconteçam atentados", sublinhou Jean-Pierre Bosser. Recordou alguns sucessos desse objetivo, como foi o do museu do Louvre, em Fevereiro de 2017.
Em Portugal, conforme o DN já noticiou, os cenários, as condições e os limites da intervenção dos militares em solo nacional estão definidos e enquadrados nas "Orientações para os Mecanismos de Cooperação entre as Forças Armadas e Forças e Serviços de Segurança (FSS), uma proposta da secretária-geral do SSI, Helena Fazenda, que já mereceu a concordância global do Chefe de Estado-Maior do Exército, Silva Ribeiro, depois de ouvidos os chefes dos ramos.
Reforço de patrulhas policiais para proteger pontos sensíveis, partilha de informação e apoio com meios - comunicações, instalações, transportes e sanitários - são algumas das ações em que as Forças Armadas (FA) vão poder participar, também armados, em operações de segurança interna, quando as polícias não tiverem capacidade para responder. Tal como em França, a coordenação operacional é da autoridade civil.
Esta sexta-feira o parecer das Forças Armadas sobre a proposta de Helena Fazenda deverá ser entregue no SSI, ficando por resolver apenas alguns "pormenores conceptuais", adiantou ao DN fonte da segurança interna que está a acompanhar o processo. Um desses "pormenores" pode ser uma das "linhas vermelhas" que fonte do Estado-Maior General das Forças Armadas já tinha antes antecipado ao DN. O SSI quer o "controlo operacional" destes patrulhamentos nas polícias, o EMGFA defende o "comando da hierarquia militar".
Para o politólogo José Fontes, professor da Academia e comentador de assuntos se segurança nacional, que assistiu à conferência, considera este plano operacional "é um bom caminho", mas adverte para a necessidade "urgente" de haver treino conjunto entre militares e polícias. "Vive-se ainda numa organização do século XIX, sem suficiente articulação nem exercícios conjuntos", afiançou.