"Taxista de profissão, as ruas na palma das mãos, Lisboa no coração, naturalmente" - assim é Zé Manel Taxista, a personagem criada por Maria Rueff há já 20 anos. Depois de passar pela televisão, pela rádio e pelos jornais, o Zé Manel chega finalmente ao palco.."Tenho o GPS nos fios do meu bigode como os gatos, conheço Lisboa de olhos fechados", diz Zé Manel. Com óculos escuros, cabelo "lambido" e aquela maneira nasalada de falar que se tornou a sua imagem de marca, ele conduz o seu táxi pelas ruas de Lisboa, entretanto invadidas por turistas e tuk-tuks. Será que ele lida bem com isto? Essa é a proposta do espetáculo musical Zé Manel Taxista - Uma Comédia com Brilhantina, que se estreia hoje no Auditório dos Oceanos do Casino Lisboa. A atriz Maria Rueff conta-nos todos os pormenores:.Como surgiu a personagem do Zé Manel?.Foi no Herman 98, um talk show que o Herman José fazia no Teatro São Luiz, com público que pagava o seu bilhete para assistir. Havia a necessidade de um pretexto cómico para levar os convidados para dentro de cena e os alfinetar de alguma forma, e o Herman lembrou-se que eu poderia fazer um taxista. E propôs-me que fosse especificamente um taxista e não uma..Inspirou-se em alguém que conhecia?.Quando eu era miúda, havia um trolha, que era um homem muito querido, que ia fazer uns biscates a casa dos meus pais, o Arnaldinho. E eu sempre o imitei porque ele tinha esta forma "fasquiada" de falar, de bom malandro de Lisboa. Quando o Herman me propôs o taxista eu lembrei-me logo dele e depois foi só trabalhar a partir daí..Não costuma fazer muitas personagens masculinas, pois não?.Para uma atriz não é fácil construir uma personagem masculina. Tive esta sorte de já ter a voz trabalhada. Depois, uso os óculos escuros para esconder as maçãs do rosto, o blusão para disfarçar o peito, o cabelo foi inspirado num dos convidados, o professor Herrero, que tinha um penteado assim. Mas é de facto muito difícil para uma mulher fazer o travesti ao contrário. Fiz no São Carlos, na ópera O Morcego de Strauss, fiz a Rã que era um carcereiro em travesti. Na televisão, imitei o Luís Jardim dos Ídolos e devo ter feito mais um ou outro..Quem é o Zé Manel Taxista?.O Zé Manel tem um lado de bom malandro, do desenrasca, do piropo não ordinário, do benfiquismo ferrenho (mas o benfiquismo do futebol, não tem que ver com estas maroscas dos clubes). Portanto, é o típico lisboeta. Eu cresci na Graça, observando figuras assim, que ao mesmo tempo têm um código de honra muito grande, do fazer tudo pelos outros. Isso é algo que eu espero que não se perca, que se via muito nos bairros que eram quase como aldeias, toda a gente se conhecia e protegia. É essa a alma que o Zé Manel transporta. Depois o Ricardo Araújo Pereira e o Miguel Góis, que são cocriadores do Zé Manel, deram-lhe o lado benfiquista. Uma das rábulas foi com o Eusébio e o boneco ganhou logo muita popularidade. (E eu beijei os pés do Eusébio!).E a personagem teve tanto sucesso que nunca morreu....Usei-o no Programa da Maria, por pedido do Emídio Rangel, e na altura criámos-lhe uma família. Depois ganhou crónicas n'A Bola, escritas pelo Ricardo e pelo Miguel, que deram origem a um livro, O Futebol É Isto Mesmo ou então Uma Coisa Completamente Diferente. Também deu origem a um disco, que foi feito por sugestão do Tozé Brito, com crónicas e músicas, e fizemos o convite aos Xutos, ao Sérgio Godinho, ao Jorge Palma, ao João Gil, ao Herman José e ao Fernando Tordo. No espetáculos, usámos essas melodias como uma partitura para este espetáculo, mas a escrita é completamente nova. O Zé Manel continua todos os dias na rádio, na Antena 1. Nos mundiais entrei em direto depois dos jogos de Portugal. E volta e meia ainda o faço com o Herman no Cá por Casa..Como é que surgiu este espetáculo?.Foi ideia da minha filha. Estava a ouvir o disco com a Laura, que tem 14 anos, ela é que perguntou porque é que eu não fazia um espetáculo com o Zé Manel. Há muitos miúdos que conhecem o Zé Manel só da rádio mas nunca viram o boneco em si. E porque não? Até porque eu tinha vontade como alfacinha de mostrar o que nós, o que vivemos sempre em Lisboa, sentimos perante esta cidade-Disney, cheia de turismo, com uma economia útil mas que expulsa os locais das suas casas..Como é que o Zé Manel vive nesta cidade, com o trânsito caótico e estes turistas todos?.O Zé Manel confronta-se com esta realidade e tem de se adaptar aos novos tempos. Obviamente que é tudo tratado com humor, mas alfinetando as situações que é preciso alfinetar. Para ver se não nos acontece como aconteceu em Barcelona, se não perdemos a nossa essência e transformamos isto numa feira popular, sob pena depois de os turistas não virem porque é uma coisa a fingir que é Lisboa e não a verdadeira "Lisboa boa"..E no palco aparece a luta entre os taxistas e a Uber?.Isso foi uma coincidência. O que está em causa são questões muito sérias e nós não entramos nisso. Claro que para o Zé Manel os motoristas da Uber são personae non gratae , quase não se pode dizer a palavra Uber à frente dele, mas depois o filho dele conduz um Uber. Nós brincamos com a situação. É um retrato caricatural..Isto é um espetáculo musical. A Maria canta?.Canto, quer dizer, "acorneto". É ainda mais difícil porque não uso o meu aparelho vocal em pleno. É o Zé Manel que canta, com a sua rinite.. Zé Manel Taxista - Uma Comédia com Brilhantina Autores: Maria João Cruz, Filipe Homem Fonseca, Mário Botequilha, Rui Cardoso MartinsEncenação: António PiresInterpretação: Maria Rueff, FF, Rafael Barreto, Rúben Madureira, Sissi Martins e Filipe Rico, Marta Mota, Sara Martins, Tiago CoelhoCasino Lisboa De quinta a sábado às 21.30; sábado e domingo também às 17.00 Bilhetes de 18 a 22 eurosColiseu Porto Ageas 8 de fevereiro, 21.30, e 9 de fevereiro, 16.30 Bilhetes de 12 a 27,50 euros