A revista Time elegeu Jeff Kinney como uma das "cem pessoas mais influentes do mundo" à conta do seu boneco desengonçado, o Banana. Entretanto, já vendeu mais de 200 milhões de livros em mais de 50 línguas e está agora a lançar mundialmente o 14.º volume da série O Diário do Banana: De-mo-li-ção..A digressão mundial passa por Portugal: "É a terceira vez que cá venho e os leitores deste país têm sido muito bons para mim." Além de que, faz questão de referir, "não me interessa o tamanho do país, pois há países muito grandes em que vendo menos per capita do que noutros com a dimensão de Portugal, onde há menos quantidades de livros vendidos mas muitas mais crianças a ler e interessadas..O Banana já conviveu com três presidentes dos EUA: Bush, Obama e Trump. O que pensa destes três protagonistas? Eu tento que as minhas histórias existam num cenário onde não há um lugar nem um tempo definido e sem preocupação de análises políticas ou qualquer outro assunto desse género. De qualquer maneira, o Banana é um miúdo muito autocentrado em si e nas suas circunstâncias, tanto assim que uma das brincadeiras neste livro é o facto de ele nunca mencionar aquilo em que o seu pai trabalha. A sua consciência não se afasta muito do que lhe interessa de imediato e os presidentes dos EUA, ou qualquer ocorrência que aconteça no mundo, não lhe interessam. Não tem esse tipo de preocupações por viver numa bolha muito própria e a exceção no Banana é estar preocupado com as alterações climáticas porque as crianças crescem atualmente a ouvir falar muito sobre o assunto e decidi explorar um pouco esse lado..Então, além das alterações climáticas, o Banana só pensa no seu mundo! Sim, afinal essa é a atitude própria das crianças da idade dele. Ainda não têm a personalidade formada e creio que o que lhes interessa é muito relativo e não ultrapassa os seus pequenos horizontes..Neste livro, o Banana decide fazer uma venda de garagem com toda a tralha que acumulou ao longo da vida. É a forma de lhe dar uma memória? Eu tento em cada livro explorar sempre um aspeto da infância novo e essa época na vida das pessoas tem um grande manancial por explorar. Neste volume, tento fazê-lo andar para a frente porque está tudo a acontecer na vida do Banana e a vida não lhe é fácil..Para cada livro é preciso uma boa ideia. Ao 14.º ainda lhe é fácil manter a imaginação? Sinto-me muito confortável no que tenho feito ao longo dos anos nos volumes anteriores, mas cada vez que usamos um tema deixamos de poder nadar nessas águas para sempre. É claro que o mundo das crianças é muito grande e daí que eu consiga ir inventando muitos novos assuntos. Além de que acho que tenho tido sorte..Os seus jovens leitores enviam-lhe ideias? De vez em quando enviam, porque sentem um grande compromisso com o herói..Vamos à velha pergunta: esperava este sucesso? Não, nem sequer que conseguisse publicar o primeiro livro! Diziam que a estrutura era muito estranha, que se assemelhava a um cartoon, e demorou três anos a ter alguma resposta positiva. Durante esse tempo fui-me convencendo de que não ia ter uma oportunidade de publicar, o que era contrariado pela minha outra parte, a do sonhador, que me dizia que talvez o conseguisse..O Banana é mesmo o que queria fazer ou preferia ter sido cartoonista? Com certeza que prefiro fazer isto, até porque funcionou, e se fosse um cartoonista num jornal poderia não ter a mesma sorte que estou a viver. Cada vez que é lançado um livro novo, é um momento para celebrar e fazer uma digressão, o que não me aconteceria a fazer outro tipo de trabalho. Estou muito feliz com o Banana..Pode dizer-se que tem um relacionamento de avô com o Banana, pois deixa-o fazer tudo o que ele quer? Essa é uma boa analogia e a verdade é que não tento dar lições de moral, antes contar histórias que pareçam verdadeiras aos leitores. A piada central do Banana é "aqui está um rapaz muito orgulhoso de si e que se leva muito a sério", mas o leitor apercebe-se de que nem sempre é bem assim. Ele nem é bom nem é mau, diria antes que é mais complicado e muito próximo de como eu era nessa idade. Quero que tenha alguma coragem porque os heróis podem ser aborrecidos se não tiverem esse comportamento. É bom ter heróis, se bem que os vilões são mais interessantes, pelo menos nos filmes da Disney..O Banana nunca será um vilão? Não, nunca será um vilão, mesmo que tenha alguns momentos breves em que se torna vingativo....Está preocupado com o politicamente correto tão em voga hoje em dia enquanto escreve as aventuras do Banana? O Banana é na maior parte do tempo politicamente correto, mas eu estou sempre atento para não o colocar em situações menos boas. Esforço-me por encontrar as palavras certas para contar as histórias e não provocar crises..O Banana tem sempre a mesma idade desde o primeiro livro. Nunca irá crescer? Penso que para um personagem destes é importante manter-se igual, basta ver o Astérix ou o Pato Donald, pois só desse modo é que têm uma magia especial. Apesar de o leitor crescer, eles só são de confiança se se mantiverem sempre iguais e o Banana vai ficar para sempre um teenager..Como é que se lembrou do Banana? Eu tentava ser cartoonista e durante três anos não fui a lugar nenhum na minha busca, até que tive esta ideia. Que não era assim tão diferente da profissão que ambicionava porque os livros do Banana são longas tiras de cartoons, ou seja, uma adaptação dos cartoons. Portanto, acabei por realizar os meus sonhos com o Banana..Sempre teve a intenção de fazer o argumento e os desenhos? Nunca seria capaz de entregar a ilustração a outra pessoa porque o trabalho fica muito mais interessante se houver uma visão única de autor. Ainda bem que sou capaz de desenhar bem o suficiente para fazer o Banana..E como é que inventa cada um dos livros? Eu passo uns meses a inventar as piadas, depois escrevo um guião e só depois começo a ilustrar e a pôr a história como eu desejo..Cada história tem um objetivo próprio? Têm um objetivo sim e o primeiro é o de divertir as pessoas. Se não o conseguir falhei o primeiro objetivo. Depois, o fazer cada vez mais jovens lerem e que o Banana faça leitores para toda a vida.O Banana é o herói de muitos jovens. Também tem os seus próprios heróis? Com este clima político pesado, os meus heróis são pessoas corajosas e de boa consciência e inteligentes. Enquanto era adolescente, os meus heróis eram cartoonistas e escritores, por exemplo Julie Bloom, que escreve histórias muito realistas para jovens e nas quais me revejo muito, ou J.R. Tolkien, cujos livros foram portas para chegar a outros mundos..Temos muita gente a criticar as posições racistas dos personagens de Mark Twain e de Enid Blyton. Tenta evitar situações dessas no Banana? Sim, especialmente porque o Banana é muito popular e as crianças que leem os seus diários estão espalhadas por todo o mundo. Portanto, é preciso ter cuidado com a construção dos personagens que entram nas histórias para evitar que crianças de todo o mundo se projetem nas atitudes do Banana, o que faço ao ter cuidado para que se revejam da melhor forma no que leem. Evito desenvolver as questões das identidades nacionais, raça ou crenças; creio que esses problemas com os autores referidos não acontecem comigo porque evito essas questões..Está cada vez mais difícil escrever uma história sem crises? Sim, é verdade. Temos de estar atentos e ser muito mais sensíveis ao que se publica. Nos EUA, estamos a ficar interessados nas vozes mais tradicionais e nas das minorias..Vende milhões de livros mas cada vez se lê menos. Receia a invasão dos outros meios ou haverá sempre um leitor para os livros? Isso exige uma resposta muito complexa... Eu próprio tenho uma livraria na terra onde vivo e em face do que vejo considero que as crianças preferem mesmo o livro físico, que é diferente de fazer um download e ler no ecrã. Um livro gera contacto e familiaridade com quem lê, portanto acredito que terá uma longa vida ou mesmo que existirá sempre..Vive em Plainville. Que terra é essa? É uma terra pequena para os Estados Unidos, em Massachusetts, com oito mil habitantes, mas a existência dessa livraria tornou a cidade menos deprimida. Talvez porque convidamos muitos autores de todo o mundo para ir à livraria e falar com as pessoas..Sente falta da vida antes do Banana? Não, até porque a minha vida não mudou assim tanto. Vivo na mesma cidade e, mesmo que agora esteja em Lisboa, e depois vá continuar a digressão que já passou por várias capitais, acabo sempre por regressar lá.