A Índia comemora 75 anos de independência hoje, dia 15 de agosto, e foram uns longos 75 anos ou umas curtas sete décadas e meia, dependendo de como se olha a história de uma nação, mas, quando vista num cenário global, é pertinente notar que a Índia hoje desempenha um papel muito mais importante na política mundial do que se poderia imaginar em 1947, quando o domínio britânico finalmente terminou e o país alcançou a liberdade. Muito do desenvolvimento deveu-se aos princípios democráticos e também ao crescimento da economia, que, combinados, levaram a Índia a essa posição..O ex-ministro do Direito da União Ramakant Khalap, em declarações ao DN, diz: "Quando olhamos para o crescimento no contexto internacional, a Índia cresceu, mas como a inflação em todo o mundo aumentou também afetou a Índia." Foram, explica, as atividades de desenvolvimento iniciadas nos primeiros e segundos 25 anos, perfazendo um total de 50 anos, que têm sido responsáveis por sustentar a crescente população do país, que tem sofrido um crescimento exponencial..Para pôr isso noutra perspetiva, o país, em 1947, tinha uma população de 340 milhões e hoje tem 1300 milhões, e ainda a aumentar. A par deste crescimento, houve também a evolução da taxa de alfabetização, que era de 12% na época da independência e que hoje subiu para 74%. O número atual indica que ainda há muito a fazer nesta área, mas, comparado com o que era na altura da independência, não deixa de ser um feito de monta. Simultaneamente, o PIB, que em 1947 era inferior a 30 mil milhões de dólares e correspondendo a meros 3% do PIB total mundial, cresceu, 75 anos depois, para 3,535 biliões de dólares e representa aproximadamente 8% do PIB global..O crescimento económico da Índia foi reconhecido pela comunidade global e recentemente o país foi convidado a juntar-se aos países do G7 durante a sua cimeira. Isso não poderia ter sido imaginado em 1947, mas a Índia transformou-se..Falemos agora um pouco de história. Os britânicos tiveram um longo domínio na Índia, começando com a Companhia das Índias Orientais, que, em 1757, ganhou o controle de todo o país ao vencer a Batalha de Plassey. A luta pela independência foi assunto de longa data. Houve muitas revoltas, começando com a rebelião de 1857 (muitas vezes conhecida como a Primeira Guerra da Independência), mas a verdadeira luta começou por volta da Primeira Guerra Mundial, com a entrada em cena de Mahatma Gandhi, Jawaharlal Nehru, Subhash Chandra Bose e outros..A batalha pela liberdade deu ao mundo a arma da não-violência que foi proposta pelo Mahatma Gandhi, que se tornou o líder da luta pela independência. A sua filosofia de não-violência e não-cooperação funcionou, com os britânicos a serem forçados a sair após um movimento de desobediência civil, em vez de qualquer revolução armada..A independência da Índia sob controlo britânico, já depois da Segunda Guerra Mundial, foi marcada pela divisão do país em Índia e Paquistão, com novas fronteiras a serem traçadas, levando milhares de pessoas a deslocarem-se entre as novas fronteiras para encontrar novas casas. À meia-noite de 15 de agosto de 1947, o poder em Nova Deli passou para as mãos dos indianos e a Índia optou por uma democracia parlamentar..Se desde então o país conseguiu superar os muitos obstáculos que existiam no seu caminho, foi definitivamente devido às suas fortes instituições democráticas. No entanto, hoje a sua política e a sua democracia estão a ser observadas de perto e a Índia também terá que olhar para dentro, pois há fatores no país que podem enfraquecer a sua posição no mundo global, porque não é apenas a economia que fortalece uma nação..Falando recentemente numa série de palestras intitulada Índia @75, o ex-governador do Banco Central da Índia, Raghuram Rajan, afirmou: "O futuro da Índia dependerá de quão forte ela pode tornar a sua democracia liberal e as suas instituições. Se puder fazer isso, acho que o seu futuro é ilimitado, se não o fizer, acho que é muito mais fraco. Comprometida ficaria a nossa alma como nação e o nosso lugar na comunidade das nações democráticas.".Numa nota semelhante, Rahul Tripathi, professor de Ciência Política da Universidade de Goa, diz: "A democracia indiana certamente amadureceu nos últimos 75 anos, a partir do ponto em que havia muita incerteza em torno da sua capacidade de sustentar a sua experiência democrática até ao presente, onde se destaca como um exemplo bem-sucedido de transição democrática. No entanto, pluralidade, diversidade e debate têm sido a força da nossa democracia, e esses valores precisam de ser protegidos para garantir que forças hostis à democracia não criam raízes firmes.".Constantino Xavier, académico no Center for Social and Economic Progress, em Nova Deli, acrescenta: "O crescimento económico é a prioridade mais importante para a política externa indiana. A influência da Índia no mundo pode ser aumentada por meio de ferramentas políticas, militares e culturais, mas pouco importam a menos que a pobreza seja eliminada através do desenvolvimento. Isso requer uma Índia mais aberta ao mundo, explorando a sua vantagem comparativa para aprofundar o comércio e a interdependência com outras economias.".Apesar do facto de que entre os 1300 milhões de pessoas da Índia há grandes setores da população que permanecem desprivilegiados e até vivem na pobreza, há histórias de sucesso que continuam a surgir. É significativo que, no mês passado, a Índia tenha escolhido uma mulher para presidente pela segunda vez, Draupadi Murmu. Esta escolha foi saudada como um momento histórico, principalmente porque Murmu é a primeira indiana das chamadas tribos a ser chefe do Estado e é também a mulher mais jovem presidente da Índia. O presidente da Índia é eleito indiretamente pelos membros do Parlamento e membros das Assembleias Legislativas dos Estados e dos territórios da União..A sua eleição como presidente foi vista como um símbolo de esperança, emancipação e reconhecimento para a população tribal marginalizada do país e também marcou uma mudança no discurso da política de justiça social da Índia..Embora o cargo seja em grande parte cerimonial, com a Constituição a estabelecer que o presidente deve agir de acordo com a ajuda e conselho do primeiro-ministro (desde 2014, Narendra Modi) e do Conselho de Ministros, um poder discricionário crucial é ratificar os projetos de lei aprovados pelo Parlamento, que se o presidente tiver reservas podem ser devolvidos ao Conselho de Ministros com recomendações. Se o Conselho de Ministros devolver o projeto de lei sem incorporar as recomendações, o presidente é, porém, obrigado a dar parecer formal ao dito projeto..Nesse contexto, a questão agora é se a Índia pode crescer ainda mais. Apresentando o orçamento para o ano financeiro de 2022-2023, a ministra das Finanças, Nirmala Sitharaman, optou pelo longo prazo e estabeleceu um plano para a Índia @100, ou seja 2047. Com o orçamento focado no crescimento, definitivamente conduz o país no caminho para recuperar o título de grande economia que mais cresce no mundo. Embora o plano tenha sido estabelecido, o resultado dependerá do desempenho geral..Mas não é apenas o crescimento económico que define a Índia de hoje. O país também é capaz de desempenhar um papel importante na comunidade internacional..Segundo Rahul Tripathi: "A Índia está pronta para desempenhar um papel maior nos assuntos globais, não apenas devido à sua crescente estatura, mas também pela maneira pela qual a geopolítica global se está a moldar. O mundo hoje está num estado de fluxo em que várias parcerias surgirão na ordem do dia. A Índia, com o seu potencial estratégico e económico, é vista como um país com o qual podem ser estabelecidos compromissos fiáveis.".No entanto, os planos do país também dependerão de fatores externos, e há países que esperam que a Índia assuma um papel de liderança no futuro. Constantino Xavier apresenta essa perspetiva quando diz: "Os países da Ásia e de África estão a acompanhar de perto a história de desenvolvimento democrático da Índia e a compará-la com o sistema de partido único da China. Por enquanto, a diferença de desempenho está a aumentar em favor da China, que avançou em quase todos os indicadores económicos, tanto de saúde como de educação, deixando a Índia muito para trás. Por mais lentas que sejam, democracias como a Índia têm uma maneira estranha de sobreviver e se recuperar, proporcionando um desenvolvimento sustentável e inclusivo de longo prazo. A política externa indiana continuará a concentrar-se em assegurar um ambiente pacífico para garantir o progresso económico, especialmente à medida que a rivalidade Estados Unidos-China se está a intensificar. A Índia não está disposta a ceder a um papel dominante da China na Ásia e respondeu aprofundando o envolvimento com o Japão, a Austrália e outros países do Indo-Pacífico que estão preocupados com o comportamento cada vez mais agressivo da China.".Foi uma combinação de vários fatores que levou a Índia a ser convidada para a cimeira do G7 e, no início deste ano, a desempenhar um papel importante na cimeira do QUAD, no Japão. O futuro da Índia na comunidade global também está a melhorar, com alguns analistas a projetarem que o país poderá um dia ser uma superpotência..Embora isso possa resultar de um esforço interno, os fatores externos desempenham um papel importante e as ruturas políticas no mundo podem perturbar o processo de crescimento. "Quando olhamos para os próximos 25 anos, temos que esperar que a política internacional não afete a paz do mundo. Qualquer surto em qualquer parte do mundo terá um impacto adverso em toda a situação económica mundial," alerta Ramakant Khalap. A atual guerra na Europa entre a Rússia e a Ucrânia e a tensão na Ásia entre a China e Taiwan, onde os Estados Unidos estão a desempenhar um potencial papel, entram em jogo..O país, a celebrar os seus 75 anos de independência, terá que equilibrar os seus desafios e objetivos internos, por um lado, e o fator externo, que ajudará ou impedirá o crescimento. Mas, como já provou, nenhum sonho é inatingível. A Índia tem um papel importante a desempenhar no cenário mundial e a sua hora chegará..dnot@dn.pt