Dizer que o adeus correu mal seria um exagero, mas a verdade é que também não correu lá muito bem. Não ao início, pelo menos. Custou muito a Maria da Graça Francisco aceitar que estava a ser descartada após trinta anos a dar tudo à empresa. "Foi um choque, pensei que não sabia fazer mais nada. Numa hora tinha uma equipa a meu cargo numa multinacional, na seguinte estava a ser chamada para me dizerem que iam reduzir custos e saía eu." Aquela falta de lógica assustava a gestora de 57 anos quase tanto como o corte em si: como podia ser boa profissional se acabava assim com o mundo virado do avesso? Porquê ela? Despedida? O que faria com 55 anos, nova de mais para se reformar, velha de mais aos olhos dos empregadores?.Infelizmente, estas são questões a que perdemos a conta nos dias que correm, lamenta o médico psiquiatra Vítor Cotovio, familiarizado com este trio de estereótipo, discriminação e preconceito baseado na idade a que se convencionou chamar idadismo (do inglês ageism). "Para o bem e para o mal, vivemos numa sociedade em que predomina a economia de mercado, muito dominada pela quantificação das coisas. Isto faz-nos mercantilizar também as relações humanas e a crença de que as pessoas podem já não ser tão produtivas quando passam aquele limiar que a sociedade considera aceitável, ali pelos 45 a 50 anos", diz..Uma bitola que nunca convenceu Maria da Graça Francisco, nem por sombras: "Costumo dizer que sou velha de idade mas jovem de coração, e enquanto for jovem de coração adapto-me ao que surgir no caminho e dou o meu melhor", diz a gestora, que acredita que se tivéssemos de ficar no mesmo sítio teríamos raízes, não pés. Se tantos imigrantes de Leste eram professores, médicos, engenheiros e fizeram o que foi preciso, incluindo tarefas domésticas, ela faria outro tanto. "Achei que nenhum empregador voltaria a querer-me com a minha idade, mas na prática apenas estive seis meses desempregada." Mal lhe deu tempo para desfrutar dos serviços de transição de carreira da Transitar, uma consultora especializada em outplacement que fazia parte do pacote negocial.."Ajudaram-me a utilizar o LinkedIn, a renovar o currículo e a desbloquear uma série de coisas relacionadas com um negócio - que tentei montar caso o resto falhasse - de controlo de gestão de empresas na área da economia social.".Foi então que uma amiga lhe ligou uma noite, eufórica, a dizer que a sogra da irmã precisava de uma pessoa com as suas características para a parte administrativa e de organização de uma pequena cadeia de restaurantes com takeaway, a Dez Prá Uma. "Em fevereiro faz um ano que lá estou e só penso na quantidade de mundo que andei a perder por ter permanecido na minha zona de conforto durante trinta anos", ri-se, pragmática..A idade é só mais um critério.Não existe uma idade a partir da qual somos demasiado velhos, acredita Yves Turquin, diretor executivo da Transitar, que trabalha com perfis etários entre os 30 e os 63 anos. "Entendemos que sénior não se traduz por velho - é experimentado - e que a inutilidade está na cabeça de cada um, já que mesmo um avô pode tratar dos netos e facilitar a manutenção do emprego da filha ou da nora." Seja como for, o estatuto de desempregado é ainda estigmatizante para os seniores, mais do que para os jovens. "Com o pormenor de considerarmos juniores os candidatos até aos 45 anos e seniores os acima de 45", distingue o responsável, ciente do peso que esta segmentação possa ter, embora não sirva como desculpa para parar (como não serviu a Maria da Graça Francisco).."Sendo o grupo dos idosos muito heterogéneo, as decisões devem ser tomadas tendo em conta não apenas a idade, mas também outros fatores com influência no resultado final pretendido", concorda Manuel Teixeira Veríssimo, professor de Geriatria da Faculdade de Medicina de Coimbra. A idade, só por si, não deve ser critério para nada: esse é um preconceito tão violento como o racismo ou o sexismo, ainda que não tão falado ou condenado. "Uma forma particular de idadismo é a que o próprio Estado pratica obrigando a que ninguém possa trabalhar na função pública a partir dos 70 anos, independentemente das suas capacidades", diz o médico..E, sim, é verdade que a cada faixa etária estão associados rótulos que fazem o idadismo afetar também os jovens, condenando-os a carreiras precárias apesar de serem das gerações mais preparadas. Contudo, a sociedade é particularmente dura perto da reforma, como se de repente quem tinha valor ativo se tornasse um peso. "É fulcral desmistificar a noção de que o envelhecimento da população é a causa dos problemas sociais, quando a longevidade é uma conquista das sociedades modernas", diz Manuel Teixeira Veríssimo. O desafio reside em ter idosos integrados, felizes e produtivos, com pouca incapacidade. "Isto faz-se com um envelhecimento ativo e saudável ao longo da vida, para que no final os problemas sociais não condicionem a pessoa mais do que a doença que achamos que ela vai ter", reforça o gerontologista..Segundo Sibila Marques, autora do ensaio Discriminação da Terceira Idade (ed. Fundação Francisco Manuel dos Santos), um exemplo paradigmático é o do filme da Pixar Up - Altamente, em que um idoso de 78 anos parte numa aventura com um menino de 8. "Os grandes fabricantes de brinquedos assumiram não estar dispostos a produzir os bonecos associados ao filme porque simplesmente não acreditavam que as crianças estariam interessadas em brincar com um idoso de 78 anos como herói", explica a psicóloga, defensora de uma mudança de paradigma. Up não só se revelou um êxito de bilheteira como um bom indicador de que "as nossas sociedades podem ser influenciadas e tornar-se menos preconceituosas a longo prazo"..Valorizar as pessoas.Aos 51 anos, Ana Sepúlveda podia perfeitamente ser igual às mulheres de 51 anos de há umas décadas, com um recato que algumas franjas da sociedade parece esperar ver ainda nas mulheres de meia-idade. Podia ser igual se não fosse tão pouco dada a convenções. "Não ligo a comentários redutores, até porque a biologia nos trocou as voltas e estamos mais novos agora", diz a presidente da associação empresarial Age Friendly Portugal, destinada a promover o desenvolvimento da economia da longevidade no país. Por ela venha mais meio século, pois ninguém lhe dá o que já tem e jamais vai aceitar que lhe digam o que fazer, esteja com que idade estiver.."Quando me separei foi uma grande preocupação porque, para alguns amigos, uma mulher quase com 50 anos já não se casa, não refaz a sua vida afetiva, estava condenada a ser só e mal amada até morrer", lembra a oradora, divertida. Também ao meter-se nas artes marciais há uns quatro anos, em especial jiu-jitsu brasileiro, nunca dizia a idade para não repelir os parceiros de treino. "Uma vez estávamos à conversa no tapete e uma aluna de 20 e muitos anos anunciou que estava a ficar velha para o jiu-jitsu e que há coisas que nem aos 40 se começa." Nessa altura Ana trocou olhares com o instrutor, João Santos, e riram-se ambos. "Só pensei: "Hum, se eles soubessem a minha idade..." A relação que têm comigo mudava de certeza.".Para Ângelo Campota, mentor do projeto de intervenção social A Avó Veio Trabalhar em conjunto com a designer Susana António, é a velha história de se conseguir fazer a melhor limonada com os limões azedos que a vida nos der. "A nossa ideia foi sempre valorizar as pessoas como pessoas. Dar-lhes um propósito", diz o psicólogo, fascinado com a energia destas 80 senhoras entre os 55 e os 80 anos que os procuram desde 2014. "Começámos no Centro Social e Paroquial de São Paulo, no Cais do Sodré, em Lisboa, com meia dúzia de avós, duas vezes por semana. Até percebermos que aquilo que fazia mesmo falta era um espaço onde elas se sentissem parte de um todo.".Do Cais do Sodré mudaram-se então para a Rua do Poço dos Negros em 2015, com maior margem de manobra para se sentarem à volta da mesa a trabalhar nas coleções originais que Susana cria com as avós, lançando-as de seis em seis meses na loja online e noutras mais alternativas, como A Vida Portuguesa. Em maio deste ano passaram finalmente para uma casa grande o suficiente para montarem teares (ainda por Lisboa, junto à Rua de Morais Soares) e continuarem a aprofundar estas relações incríveis de amizade e trabalho. "Agora é receber o avô de 92 anos que era fotógrafo e se quer juntar a nós", orgulha-se Ângelo Campota. A ver como reage ao ímpeto destas avós flamejantes que não param um segundo..Pressões à parte, o psiquiatra Vítor Cotovio não tem dúvidas de que envelhecer é pior para as mulheres devido a um ideal de beleza feminina conflituante com encantos mais maduros, ao passo que os homens podem perder tónus e cabelo que ninguém lhes cobra: "A sociedade ainda vê com maus olhos que elas queiram casar-se de novo, namorem homens mais novos, assumam o seu corpo e a sua sexualidade." Muitas vezes são as próprias mulheres as primeiras a crer nesses estereótipos castradores enredados no preconceito da idade, o que faz que lhes seja difícil libertarem-se para viverem como desejam. "Talvez no final não haja uma forma de envelhecer bem", conclui o médico. Mas muito pior é focarmo-nos nas rugas e esquecermo-nos de que estamos vivos..Sem emprego aos 50 anos?.Renove o currículo Mais idade traduz-se numa carreira mais longa, maior diversidade a nível profissional, possivelmente em mais formações, pelo que esses podem ser pontos a favor na disputa de um lugar com alguém menos experiente. Sublinhe-os devidamente no currículo, que deve ser preciso e de fácil leitura..Redes sociais Numa altura em que boa parte das relações humanas (incluindo as laborais) passam pelo digital, ter presença nas redes pode dar-lhe maior visibilidade até mesmo em processos de recrutamento. Crie um bom perfil no LinkedIn e escolha com critério em que outras redes sociais quer aparecer, tendo em conta as especificidades..Reinvente-se Ficar no emprego pode ser traumático, sobretudo se a pessoa for empurrada para ele sem ter voto na matéria. Contudo, esta pode ser também uma oportunidade para investir em si mesmo e reciclar-se, o que pode muito bem levar a oportunidades profissionais inesperadas (e ainda melhores) no futuro..Atualize conhecimentos Ter 50 ou mais anos é uma idade tão boa para aprender como os 20 em que andávamos da faculdade, com o mundo todo pela frente. Nunca é tarde para apostar num novo percurso universitário, fazer ações de formação ou alargar conhecimentos através de cursos especializados na sua área ou noutras..Crie o seu próprio emprego Quando há pouco falávamos em melhores oportunidades de futuro, criar o seu próprio negócio pode ser uma ótima opção a considerar. Lógico que não é lançar-se à toa no desconhecido: há que pesar muito bem os prós e contras e os incentivos de um novo projeto. Mas tendo a experiência e o know-how, porque não?.A idade de ouro.Julia Roberts Aos 52 anos, a eterna Pretty Woman empresta as suas invejáveis pernas às campanhas de colãs da Calzedonia. Bem podiam ser 25 anos que era igual..Iris Apfel Ícone da moda intemporal, do alto dos 98 anos não há nada que impeça a designer de interiores de usar vermelho vivo nos lábios e nas unhas, óculos de massa pretos inconfundíveis e uma profusão de pulseiras nos braços..Valerie Von Sobel Outro ícone da moda, com 78 anos. A artista plástica é considerada uma das mulheres mais atraentes da sua geração..Daphne Selfe Tem 91 anos, trabalha como modelo desde 1949 e é hoje a profissional mais velha do mundo. Porque isto melhora, de facto, com a idade, garante Selfe..George Clooney São mesmo 58 anos. 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