Na última sessão da secção Cannes Premiere o Festival ganhou um herói. Chama-se Dario Argento e aos 81 anos torna-se ator de corpo inteiro em Vortex, depois de uma vida inteira a filmar o horror. É a nova excentricidade de Gaspard Noé, cineasta franco-argentino que desta vez não filma sexo nem violência física. Filma uma outra violência, aquela que diz respeito aos horrores da demência na terceira idade. Filme-experiência sobre esse bafejar invisível da morte e onde além do cineasta de Suspiria há também Françoise Lebrun, mítica atriz de Jean Eustache e do não menos mítico A Mãe e a Puta (1973). Mas é em Dario Argento que todos os olhares estacam, uma presença de uma verdade assustadora..Da Palma de Ouro justíssima para Titane nasceu também um novo rosto, ou melhor, corpo. É o de Agathe Rousselle, atriz, editora, fotógrafa e manequim. Nos seus olhos está uma intensidade fatal, uma energia nervosa. A perfeição para um papel em que do seu corpo sai óleo em vez de sangue. Sem esta transformação "body horror" o filme de Julia Ducournau seria outro. Rouselle torna-se literalmente numa disrupção monstruosa que é sinal destes tempos de novos corpos....Herói foi ainda Song Kang-ho, ator coreano celebrizado por Parasitas e este ano jurado. O heroísmo passa não só pela coragem de premiar um gesto de provocação como Titane, mas também por estar em ponto de rebuçado no thriller Emergency Declaration, pequena grande surpresa de Han Jae-rim, exibido na seleção oficial fora de competição. Ele é um detective a tentar investigar o caso de um ataque terrorista num avião com um coranavirus. Sim, um thriller a fantasiar um contágio viral em tempos de pandemia. Acima de tudo, entretenimento à Hollywood como Hollywood já não sabe fazer....Mas mesmo sem prémio de interpretação, Tilda Swinton foi uma das vencedoras de Cannes. Esteve com três filmes, foi a mais fashionista das estrelas na carpete vermelha, prometeu vir a Portugal e era frequentemente apanhada a ver cinema, coisa rara nos atores que estão em Cannes. Em The French Dispatch, de Wes Anderson, fazia um boneco algo caricatural, em The Souvenir- Part II, de Joanna Hogg, voltava a contracenar com a filha Honor Swinton Byrne, mas é em Memoria que se sente toda a sua vocação para se "apagar". Neste caso num limbo entre o sono e a morte no certeiro espetáculo hipnotizante de Apichaptong Weeresathakul. Swinton, já agora, é também a produtora deste filme agraciado com o prémio do júri..Depois, impossível uma galeria de heróis não ter os Sparks, anteontem felizes na gala a receber o prémio de realização de Annette, o musical criado por eles e dirigido por Leos Carax. Os manos Mael foram a banda-sonora permanente do festival e tiveram direito a sessão surpresa de The Sparks Brothers, retrato de um duo que mudou a face da pop americana. Trata-se de um documentário de Edgar Wright previsto para chegar em breve aos cinemas portugueses..Herói para o futuro talvez possa ser David Pinheiro Vicente, cineasta português da Cinéfondation, onde esteve com o projeto ainda muito no começo da sua primeira longa-metragem. Chama-se Entre o Passado e o Futuro e vai ter como produtor Luís Urbano. O principezinho do cinema português esteve neste programa de residências e participou de um programa de pitching para financiamentos. Desta edição, elegeu Cow, documentário magnífico de Andrea Arnold, como filme preferido. A vantagem de estar nesta fundação é que dá créditos para o amanhã....Estes foram alguns dos super-heróis de um festival que salvou o cinema..A seleção oficial vai poder ser quase toda vista nos cinemas nacionais. As distribuidoras não andaram a dormir. Oficialmente são estes os filmes adquiridos para além de Annette, já em exibição com resultados desoladores..Benedetta, de Paul Verhoeven.A Hero, de Asghar Farahadi.Bergman Island, de Mia Hansen-Love.Petrov's Flu, de Kirill Serebrennikov.Tous s'est Bien Passé, de François Ozon.Titane, de Julia Ducournau.Tre Piani, de Nanni Moretti.The Story of My Wife, de Ildikó Enyedi.France, de Bruno Dumont.Les Olympiades, de Jacques Audiard.Flag Day- Sean Penn.Red Rocket- Sean Baker.Drive My Car- Ryusuke Hamagushi.Ahed's Knee- Nadav Lapid.The Worst Person in the World- Joachim Trier.Memoria- Apichaptong Weeresathakul.The French Dispatch- Wes Anderson
Na última sessão da secção Cannes Premiere o Festival ganhou um herói. Chama-se Dario Argento e aos 81 anos torna-se ator de corpo inteiro em Vortex, depois de uma vida inteira a filmar o horror. É a nova excentricidade de Gaspard Noé, cineasta franco-argentino que desta vez não filma sexo nem violência física. Filma uma outra violência, aquela que diz respeito aos horrores da demência na terceira idade. Filme-experiência sobre esse bafejar invisível da morte e onde além do cineasta de Suspiria há também Françoise Lebrun, mítica atriz de Jean Eustache e do não menos mítico A Mãe e a Puta (1973). Mas é em Dario Argento que todos os olhares estacam, uma presença de uma verdade assustadora..Da Palma de Ouro justíssima para Titane nasceu também um novo rosto, ou melhor, corpo. É o de Agathe Rousselle, atriz, editora, fotógrafa e manequim. Nos seus olhos está uma intensidade fatal, uma energia nervosa. A perfeição para um papel em que do seu corpo sai óleo em vez de sangue. Sem esta transformação "body horror" o filme de Julia Ducournau seria outro. Rouselle torna-se literalmente numa disrupção monstruosa que é sinal destes tempos de novos corpos....Herói foi ainda Song Kang-ho, ator coreano celebrizado por Parasitas e este ano jurado. O heroísmo passa não só pela coragem de premiar um gesto de provocação como Titane, mas também por estar em ponto de rebuçado no thriller Emergency Declaration, pequena grande surpresa de Han Jae-rim, exibido na seleção oficial fora de competição. Ele é um detective a tentar investigar o caso de um ataque terrorista num avião com um coranavirus. Sim, um thriller a fantasiar um contágio viral em tempos de pandemia. Acima de tudo, entretenimento à Hollywood como Hollywood já não sabe fazer....Mas mesmo sem prémio de interpretação, Tilda Swinton foi uma das vencedoras de Cannes. Esteve com três filmes, foi a mais fashionista das estrelas na carpete vermelha, prometeu vir a Portugal e era frequentemente apanhada a ver cinema, coisa rara nos atores que estão em Cannes. Em The French Dispatch, de Wes Anderson, fazia um boneco algo caricatural, em The Souvenir- Part II, de Joanna Hogg, voltava a contracenar com a filha Honor Swinton Byrne, mas é em Memoria que se sente toda a sua vocação para se "apagar". Neste caso num limbo entre o sono e a morte no certeiro espetáculo hipnotizante de Apichaptong Weeresathakul. Swinton, já agora, é também a produtora deste filme agraciado com o prémio do júri..Depois, impossível uma galeria de heróis não ter os Sparks, anteontem felizes na gala a receber o prémio de realização de Annette, o musical criado por eles e dirigido por Leos Carax. Os manos Mael foram a banda-sonora permanente do festival e tiveram direito a sessão surpresa de The Sparks Brothers, retrato de um duo que mudou a face da pop americana. Trata-se de um documentário de Edgar Wright previsto para chegar em breve aos cinemas portugueses..Herói para o futuro talvez possa ser David Pinheiro Vicente, cineasta português da Cinéfondation, onde esteve com o projeto ainda muito no começo da sua primeira longa-metragem. Chama-se Entre o Passado e o Futuro e vai ter como produtor Luís Urbano. O principezinho do cinema português esteve neste programa de residências e participou de um programa de pitching para financiamentos. Desta edição, elegeu Cow, documentário magnífico de Andrea Arnold, como filme preferido. A vantagem de estar nesta fundação é que dá créditos para o amanhã....Estes foram alguns dos super-heróis de um festival que salvou o cinema..A seleção oficial vai poder ser quase toda vista nos cinemas nacionais. As distribuidoras não andaram a dormir. Oficialmente são estes os filmes adquiridos para além de Annette, já em exibição com resultados desoladores..Benedetta, de Paul Verhoeven.A Hero, de Asghar Farahadi.Bergman Island, de Mia Hansen-Love.Petrov's Flu, de Kirill Serebrennikov.Tous s'est Bien Passé, de François Ozon.Titane, de Julia Ducournau.Tre Piani, de Nanni Moretti.The Story of My Wife, de Ildikó Enyedi.France, de Bruno Dumont.Les Olympiades, de Jacques Audiard.Flag Day- Sean Penn.Red Rocket- Sean Baker.Drive My Car- Ryusuke Hamagushi.Ahed's Knee- Nadav Lapid.The Worst Person in the World- Joachim Trier.Memoria- Apichaptong Weeresathakul.The French Dispatch- Wes Anderson
