"Há mais doentes que nos aparecem em estádio avançado com cancro do pulmão devido à pandemia"
Novembro é o mês de sensibilização do cancro do pulmão e os pneumologistas estão preocupados com a redução significativa das primeiras consultas em oncologia devido à pandemia. Isto numa doença que normalmente já é diagnosticada numa fase mais avançada.
Como consequência, há menos doentes com cancro do pulmão referenciados e os que são já chegam em fase muito avançada da doença e isso tem implicações "muito sérias", diz ao DN o cirurgião Paulo Calvinho que coordena a unidade de Cirurgia Cardiotorácica do Hospital de Santa Marta, em Lisboa.
O cancro do pulmão continua a ser a principal causa de mortalidade por tumores malignos em Portugal. Por ano, no nosso país, são detetados 5200 novos casos - segundo dados divulgados em 2018 -, e em 70% das situações o diagnóstico é feito já numa fase avançada da doença. Do início do ano e até 11 de novembro, já morreram 3600 pessoas. Cirurgião cardiotorácico há duas décadas, Paulo Calvinho defende, que " é preciso apostar na deteção precoce" e pede às pessoas que não deixem de procurar ajuda médica, mesmo em tempo de pandemia.
Os pneumologistas alertaram para uma grande diminuição das primeiras consultas em oncologia devido à covid-19. Qual é o reflexo da pandemia na cirurgia cardiotorácica do Hospital de Santa Marta?
A pandemia tem uma primeira fase, em que não sabemos exatamente o que vai acontecer e obedecemos aos planos de contingência da Direção-Geral da Saúde [DGS], em que há uma proposta para operarmos os doentes que sejam prioritários e muito prioritários, nos quais se incluem os doentes com neoplasia pulmonar. Elaborámos, nesse momento, uma estratificação de prioridades em relação aos doentes neoplásicos, aqueles que seriam mais prementes, com uma probabilidade de uma evolução mais rápida da doença em relação aos outros. E operámos nesse sentido. Isto foi na primeira fase, baseados nas linhas orientadores da DGS como do American College of Surgeons, no sentido de sermos consensuais e de termos algo fundamentado. Nesta primeira fase resumimos a nossa atividade a este tipo de patologias e rapidamente esgotámos a nossa casuística neoplásica.
Como se reflete a redução do número de primeiras consultas?
Houve uma diminuição de mais de 50%, na casa dos 60%, das primeiras consultas. Refletiu-se, obviamente, no número de doentes que nos são referenciados. Nós como especialidade de fim de linha, que não recebe doentes para estudo, que recebe os doentes em fase mais posterior, obviamente que se notou uma diminuição dessa referenciação.
E quais as implicações na cirurgia torácica?
Reflete-se que doentes não chegam, não vêm ao hospital, que os colegas estão assoberbados com o tratamento da pandemia, têm as unidades preparadas para o impacto... [Na primeira fase] nós tínhamos os números de Espanha e de Itália, que eram absolutamente assustadores. Portanto, tínhamos um plano de contingência caso houvesse este incremento muito significativo. Tínhamos as várias unidades do país preparadas para poder dar resposta à pandemia. E tentamos pela especificidade do hospital, onde tratamos a patologia cardiovascular e a patologia respiratória - que corresponde a cerca de 55% da mortalidade, segundo o último relatório da OCDE -, de preservar este espaço, um espaço livre de covid, no sentido de permitir a manutenção da resposta. E aquilo que nós percebemos é que estamos preparados e continuamos ainda preparados para essa resposta. No entanto, no caso particular da cirurgia torácica, da referenciação dos doentes com cancro do pulmão, isto diminui drasticamente.
A que se deve esta diminuição drástica?
Primeiro motivo: os serviços de saúde deixaram de estar preparados para os receber por causa dos planos de contingência e, por outro lado, os doentes também deixaram de vir porque tinham medo de ser contaminados com a covid-19. Isto fez que se refletisse em nós, na diminuição significativa da casuística do doente.
E no número de cirurgias?
Não. Não diminuímos o número de cirurgias, mantemos basicamente o mesmo número de cirurgias do que no ano passado, com uma ligeira redução inerente a uma programação destes casos relacionados com doentes que são prioritários e muito prioritários.
Depois da primeira fase da pandemia seguiu-se uma retoma...
Uma fase de abertura, em que deixámos de estar em plano de emergência. Uma segunda fase em que os doentes fundamentalmente têm medo de procurar os cuidados de saúde, porque têm medo de ficar contaminados, e esta referenciação, apesar de ter havido uma ligeira retoma, não foi o suficiente ainda para termos uma referenciação de forma a poder dar resposta às necessidades das pessoas. As pessoas continuaram a não procurar. Eu participo em três reuniões multidisciplinares do cancro do pulmão e há uma diminuição muito significativa do número de doentes que temos nestas reuniões. E quando os doentes aparecem, já aparecem em fase muito avançada.
Como chegam agora os doentes ao bloco operatório?
Vamos pôr as coisas de outra forma. Os doentes que chegam com cancro do pulmão aos centros especializados para tratar cancro do pulmão já chegam em fases muito avançadas, isto tem sido a constatação geral dos colegas da pneumologia oncológica, com quem tenho conversado, e na minha experiência é isso que acontece. As reuniões multidisciplinares são basicamente constituídas por doentes em fases muito avançadas.
É uma consequência da pandemia?
70% dos doentes com cancro do pulmão já aparecem numa fase avançada da doença. Se nós acrescentarmos a isto as dificuldades de acesso por medo e porque os serviços, principalmente os de saúde primários, estão absolutamente assoberbados com o despiste, o tratamento e o rastreio da covid, fazem que também esta referenciação não aumente. Ou seja, os 70% que nós tínhamos de doentes que apareciam em fase avançada aumentaram. Não tenho números certos para lhe dizer. Esses números estão a ser apurados. Tudo o que acontece vai ter um efeito mais tardio, portanto estes números vão começar a aparecer agora, de qual foi o real impacto na referenciação dos doentes com cancro do pulmão. O que nós sentimos na nossa prática é que os doentes que chegam para a discussão em reunião multidisciplinar estão em fase mais avançada da doença do que habitualmente estariam. Ou seja, os doentes que vêm para o bloco operatório também são doentes que estão em fase mais avançada da doença, sim. Temos menos doentes com cancro do pulmão em fase precoce da doença. Isto tem implicações muito sérias.
Mesmo sem dados oficiais, pode dizer-se que há um aumento de doentes em fase mais avançada da doença?
Há mais doentes que nos aparecem em estádio avançado com cancro do pulmão devido à pandemia. Os doentes em fase precoce não aparecem tanto. E não aparecem tanto porque é uma doença que dá poucos ou nenhuns sintomas. Os sintomas relacionados com esta patologia, o que chamamos o cluster de sintomas, são um pequeno cansaço, que se atribui à idade, uma tosse que apareceu porque até ficou constipado, uma pequena falta de apetite, mas atribuída ao stress. Iriam motivar uma primeira consulta e um primeiro despiste, mas neste momento, os doentes por sintomas tão ligeiros não procuram a ajuda [médica] e quando procuram já têm sintomas bem mais graves e a doença mais avançada. Eu opero mais doentes em fase mais avançada da doença. Não tenho aqui esses números, que não estão totalmente definidos. Operava mais doentes em fase inicial da doença. Agora, opero mais doentes em fase avançada da doença.
Destaquedestaque"Recomendo às pessoas que procurem ajuda precocemente, mesmo neste tempo de pandemia. Os circuitos seguros estão instalados, bem definidos."
Falou em implicações "muito sérias". Quais são?
Tem implicações na taxa de mortalidade. É o nosso medo e a nossa expectativa que vão morrer mais doentes com cancro do pulmão por causa da pandemia. Porque se os doentes não procuram ajuda e se não existe uma disponibilidade dos serviços de saúde primários para poderem receber e referenciar estes doentes, pois com certeza as coisas complicar-se-ão. Não se esqueça de que estou a falar de uma realidade que é Santa Marta, uma realidade sem covid, mas se olharmos para outras unidades como por exemplo o Hospital de Gaia, o Hospital de São João, eles têm circuitos livres de covid. São hospitais com covid e, portanto, isso também tem uma implicação na locação de recursos. Aqui, tentamos, e estamos a conseguir, ter estas áreas com circuitos bem identificados, livres de covid, e temos um hospital inteiro sem covid, mas o que está a montante de nós reflete-se na chegada destes doentes.
São efeitos transversais.
Estas implicações são globais. Primeiros os doentes que nós operamos e que temos operado neste momento são doentes em fase mais avançada da doença, têm indicação cirúrgica, mas implicam sempre tratamentos complementares, quimioterapia, radioterapia dirigidas, como a terapia dirigida às mutações genéticas, portanto são tudo terapias usadas nas fases mais avançadas da doença e que são extraordinariamente dispendiosas.
Implicações que se manifestam no doente, mas não só.
As implicações são a taxa de mortalidade, a diminuição da qualidade de vida e o aumento dos custos [no Serviço Nacional de Saúde - SNS], não só no tratamento destas doenças, porque elas são muito mais caras nos tratamentos na sua fase mais avançada e têm também uma implicação nos custos pelo aumento das prestações sociais porque são doentes que não vão ter a capacidade produtiva, mesmo que ainda estejam em idade de trabalhar. Vão precisar de baixa, vão precisar de assistência.
Falou no aumento da taxa de mortalidade. É uma preocupação ou uma certeza?
É uma preocupação com muita certeza. Eu vou explicar: quando um cientista ou um médico diz que nós temos a certeza de alguma coisa, temos de ter dados. Nós não temos ainda esses dados. Estão a ser levantados pelas várias sociedades científicas e penso que também pela DGS, de quais são os impactos que isto está a ter nas outras patologias, e nós ouvimos todos os dias os responsáveis e a tutela que falam sempre que temos de proteger os doentes não covid, que temos de continuar a tratar os doentes não covid. Portanto, é uma certeza não documentada que esta mortalidade e esta morbilidade, associadas ao não tratamento dos doentes com cancro do pulmão, são extremamente preocupantes.
E o diagnóstico tardio tem efeitos na recuperação da qualidade de vida do doente.
Não é só uma questão de mortalidade. É também uma questão de morbilidade e a questão do preço que nós sabemos que a qualidade de vida tem e que é caro. Temos doentes com aumento de prestações sociais e com tratamentos muito mais caros, os preços e os gastos que o SNS e a Segurança Social vão gastar com estes doentes vão subir de forma muito significativa. É importante alertar para a necessidade de manter uma awarness para o cancro do pulmão e a sua deteção precoce porque tudo isto vai fazer que o fluxograma e o outcome do doente seja melhor a todos os níveis. Em primeira análise, para o doente em si, porque vai ter uma recuperação mais rápida evitando, provavelmente, tratamentos complementares, os tratamentos são menos agressivos e menos dispendiosos e a recuperação e a integração mais rápida destes doentes no mundo do trabalho.
Destaquedestaque"Com qualquer sintoma que seja novo e não explicado, as pessoas deverão procurar ajuda médica o mais rapidamente possível, a fim de despistar uma doença."
Quem está em casa a proteger-se de uma doença pode estar ao mesmo tempo a negligenciar outra sem o saber. Que mensagem lhes daria?
É importante perceberem que temos circuitos absolutamente livres de covid. Temos nos serviços de oncologia e nos serviços de cirurgia torácica e nos que são dedicados à patologia oncológica, cardíaca e cardiovascular, circuitos livres de covid. Recomendo às pessoas para procurarem ajuda precocemente mesmo neste tempo de pandemia. Os circuitos seguros estão instalados, bem definidos. As pessoas não devem deixar de ir [ao médico].
Quais são os sinais de alerta?
Não temos sinais específicos para o cancro do pulmão. O que temos claramente são grupos e conjuntos de sintomas que nos podem alertar para o facto de que qualquer coisa não está bem. Se tenho uma pessoa que fuma, que tenha uma doença pulmonar crónica, um enfisema, uma DPOC [doença pulmonar obstrutiva crónica] com uma alteração do padrão da sintomatologia ou que não tenha estas patologias e comece com tosse, com um cansaço que não é explicável, falta de apetite, com dores articulares que não são justificadas, deve procurar ajuda. Não tem necessariamente de ter um cancro do pulmão, mas pode ter alguma coisa que, de facto, justifique esta sintomatologia e que se ela se prolongar no tempo a doença de base que motiva esta sintomatologia irá agravar-se. Existem outros sinais que são mais claros, como a expetoração com sangue. É um sinal de alerta. As pessoas não devem esperar que passe, devem imediatamente procurar um médico. Com qualquer sintoma que seja novo e não explicado, as pessoas deverão procurar ajuda médica o mais rapidamente possível, a fim de despistar uma doença. Não tenham medo de vir.
A pandemia pode originar mudanças profundas na gestão dos cuidados de saúde?
Temos de olhar para isto de uma forma global e temos de perceber que a covid nos fez ver que é possível a mobilização e a restruturação rápida de serviços para poder dar resposta a um flagelo mundial. Conseguimos rapidamente criar unidades de cuidados intensivos e alocar recursos humanos com as dificuldades que existem pela escassez e pela especificidade de atuação. Mas isto permite-nos ver também que podemos aproveitar claramente esta fase para fazer uma reestruturação mais profunda, para podermos antever o que vem a seguir à pandemia, no sentido de podermos melhorar a nossa capacidade de resposta.
O que se tem de fazer para melhorar a capacidade de resposta no caso do cancro do pulmão?
Obviamente, mais reforços, mas uma reestruturação de forma a conseguirmos melhorar a comunicação entre os cuidados de saúde primários e os hospitais e os centros que estão dedicados ao tratamento do cancro do pulmão de forma a acelerar todo este fluxo de doentes dentro do SNS.
Destaquedestaque"Fumar é responsável por cerca de 85% a 90% dos casos do cancro do pulmão, portanto, uma causa direta. O tabagismo é a causa do cancro do pulmão, e se nós deixarmos de fumar diminuímos de forma muito significativa a incidência do cancro do pulmão."
As chamadas "vias verdes", os centros dedicados ao cancro do pulmão.
Temos hospitais como o São João, que trabalha muito bem nesse sentido, é aquilo a que se chama as "vias verdes" do cancro do pulmão. Eu chamaria vias rápidas e com protocolos bem definidos, com a integração de várias especialidades, porque isto não é só a cirurgia torácica, ela é apenas uma das especialidades centrais no tratamento, diagnóstico e estadiamento do cancro do pulmão, mas existe a imagiologia que é fundamental ser reforçada, a medicina nuclear, a anatomia patológica, a anestesia, a pneumologia oncológica ou médica. São todas estas especialidades que se integram numa reunião multidisciplinar, mas que devem trabalhar de uma forma absolutamente una para que o doente seja o centro de facto da mobilização.
Isso não acontece agora?
Acontece com muita dificuldade, porque os recursos humanos escasseiam, os materiais e os técnicos. Temos na Península Ibérica, e Portugal não é exceção, entre três e quatro meses desde que um doente que tenha um possível cancro do pulmão chega até que lhe é oferecida uma terapia. É importante olhar para isto de forma a conseguirmos acelerar. E uma das formas de o fazer é utilizando o exemplo da pandemia, em que conseguiram mobilizar e reestruturar serviços para que a resposta fosse rápida. Dentro do cancro do pulmão também o devemos fazer.
Destaquedestaque "Do início do ano e até ao dia 11 de novembro, pelos registos, tinham morrido de cancro do pulmão, em Portugal, 3600 pessoas e de covid-19 tinham morrido 3103 pessoas."
É um dos cancros que mais matam.
O cancro do pulmão afeta cerca de 1,8 milhões de pessoas no mundo inteiro, e uma sobrevida que anda na casa dos 15% a 17% aos cinco anos e praticamente inalterada, apesar de todo o desenvolvimento tecnológico. Temos resultados ligeiramente melhores porque somos um país desenvolvido, mas de um modo geral estas mortalidades não se alteraram, principalmente pela dificuldade de acesso que os doentes têm aos sistemas de saúde, não estou a falar de Portugal em particular, mas de uma forma geral. Em Portugal, temos cerca de 5200 novos casos de cancro do pulmão por ano. Do início do ano e até ao dia 11 de novembro, pelos registos, tinham morrido de cancro do pulmão, em Portugal, 3600 pessoas e de covid-19 tinham morrido 3103 pessoas. Obviamente que a covid é aguda, é uma pandemia, é preciso ser controlada e os doentes precisam de ser tratados.
Desde o início do ano até 11 de novembro morreram quase o mesmo número de pessoas com covid e com cancro do pulmão. O que significam estes dados?
Que o cancro do pulmão tem de ser olhado com muita atenção em Portugal. É o cancro que mais mata e, portanto, temos de criar estruturas, que neste momento, estão a ser desenvolvidas, no sentido de uma diferenciação e deteção precoce desta patologia e, por outro lado, a criação de estruturas hospitalares ou de organizações intra-hospitalares para que o fluxograma destes doentes seja muito rápido.
O que se pode fazer para prevenir a doença?
Primeiro: não fumar, não fumar, não fumar. Obviamente que nós temos causas que são genéticas e que estão bem identificadas, mas eu não consigo dizer mais do que: não fumar. Fumar é responsável por cerca de 85% a 90% dos casos do cancro do pulmão e, portanto, uma causa direta. O tabagismo é a causa do cancro do pulmão e se nós deixarmos de fumar diminui de forma muito significativa a incidência do cancro do pulmão. Depois há o outro lado, que é o da deteção precoce. É preciso apostar na deteção precoce. Os rastreios ainda não estão validados entre a nossa população. Os recursos necessários para que isso aconteça são muito grandes e nós não estamos preparados. É preciso investir muito na imagiologia, nos cuidados de saúde primários, para se identificar um número grande de doentes com fatores de risco como são o tabagismo, a idade, as morbilidades associadas.
Destaquedestaque"É preciso investir muito na imagiologia, nos cuidados de saúde primários, para se poder identificar um número grande de doentes com fatores de risco."
O que era importante fazer para um diagnóstico precoce da doença?
É importante que nos cuidados de saúde primários, principalmente nas consultas de desabituação tabágica, os doentes façam um pequeno screeening, uma TAC de baixa resolução, na tentativa de perceber se porventura existe alguma alteração que seja suspeita e que consigam ter, após essa deteção, uma abertura rápida para o centro hospitalar que trata do cancro do pulmão no sentido de poder ajudar, é para vigiar, é para investir, é para diagnosticar, para repetir TAC. E é fundamental que este doentes com fatores de risco procurem ajuda e que seja feita pelo menos uma tentativa de deteção precoce. São dois momentos. Primeiro, a rapidez com que o doente deverá ter acesso aos cuidados de saúde diferenciados e, por outro lado, dentro dos cuidados de saúde primários, haver uma atenção especial a estes doentes e fazer-lhes uma TAC.
Olhando para o futuro, quais são as expectativas no combate a esta doença, sabendo que a situação não é das melhores, com a tendência de diagnóstico tardio?
A situação não é das melhores aqui e não é melhor na maior parte dos países do mundo. Não estamos, infelizmente, sozinhos nisto.
Depois da pandemia, vão existir mais recursos no combate a esta doença?
Estou otimista com uma mudança de paradigma por vários motivos. O primeiro é que as plataformas digitais permitiram aproximarmo-nos. Estamos a trabalhar de uma forma muito ativa nisto, de aproximarmo-nos dos nossos colegas de cuidados de saúde primários, no sentido de encontrar formas rápidas e fáceis de comunicação com os centros que tratam esta doença. Estou fortemente convencido de que esta pandemia veio mostrar que existem algumas fragilidades que não estavam a ser contempladas ou que estavam a ser trabalhadas de uma forma mais lenta...
Ficaram mais a descoberto essas fragilidades.
Nós sabemos que vai haver um aumento de fluxo de doentes, mas que, na realidade, mais tarde ou mais cedo, as coisas vão melhorar, que vai haver uma perceção por parte da tutela e por parte das estruturas organizativas que coordenam e comandam os nossos desígnios no sentido de alocar recursos materiais e humanos para que as respostas sejam atempadas e adequadas...
Está a falar da retoma da atividade que foi suspensa?
Na falada retoma.
Está otimista, mesmo com o esperado aumento de doentes?
Com certeza. Temos de ter perspetivas positivas. No nosso caso, a atividade cirúrgica não diminuiu de forma significativa, muito pouco mesmo.
Mas vai aumentar?
A minha expectativa é que aumente significativamente.
E isso não o preocupa?
Aumentar significativamente [a atividade cirúrgica]? Não, antes pelo contrário, significa que vamos tratar mais doentes, que vão criar capacidade e infraestruturas para que isso possa acontecer. E que as respostas em termos temporais e de qualidade sejam adequadas.
O que já se aprendeu com esta pandemia?
Aprendemos que somos muito mais flexíveis, muito mais inovativos e que não precisamos de estar presos a estruturas muito estanques e que podemos olhar para isto de forma mais global. Quem trata do cancro do pulmão já olhava para isto desta forma, lutando contra algumas paredes, mas penso que com o tempo elas se vão desfazer