Governo italiano responde com 10 mil milhões para apoiar empresas e famílias
O governo italiano, reunido em conselho de ministros, deverá aprovar nesta quarta-feira de manhã um pacote de medidas de ajuda às empresas e às famílias que, somadas a anteriores, deverá atingir os 10 mil milhões de euros. Roma deve contar com o apoio da União Europeia para aumentar o défice na sua luta contra o covid-19 e a crise económica que daí advem.
O apoio às famílias deve passar pela possibilidade da suspensão da prestação do empréstimo da casa.
A vice-ministra da Economia, Laura Castelli, disse que as medidas de apoio à família poderiam incluir "a suspensão do pagamento de retenções [salariais] e contribuições" a vários fundos fiscais."Estamos preocupados e por isso pressionamos o sistema bancário a dar o máximo possível [para a] suspensão das hipotecas", disse.
Para pais trabalhadores que lidam com o encerramento das escolas, o governo debatia a formulação da ajuda na terça-feira à tarde, entre uma licença parental de 12 dias paga a 30% para rendimentos médios-altos e de 80 a 100% para rendimentos baixos ou, em alternativa, um valor de 600 euros.
A suspensão das prestações para a segurança social por parte dos trabalhadores independentes e a extensão do subsídio de desemprego para trabalhadores sazonais dos setores do turismo, dos espetáculos e da pesca são outras medidas.
No que respeita ao setor empresarial, o executivo prevê alocar até 2 mil milhões de euros para o lay-off em todos os setores produtivos. As pequenas e médias empresas com cinco a 50 empregados serão alvo de ajudas de até 500 milhões de euros.
O documento prevê também um regime de conversão de ativos por impostos diferidos em créditos fiscais, no valor de mil milhões. O crédito vai também ser utilizado no setor do turismo, que vale 13% do Produto Interno Bruto de Itália.
A proposta de decreto, como foi adiantada por vários meios de comunicação, prevê "medidas para acelerar o investimento" com "identificação de obras prioritárias" e exceções à lei para contratação e adjudicação sem concurso público.
A Bolsa de Milão perdeu mais 3% na terça-feira, depois de ter caído 11% na segunda-feira, durante o crash no mercado global provocado por um colapso no preço do petróleo.
Alguns bancos estimam que a economia italiana contraia em 1% entre abril e junho e não falta quem tema pela capacidade da banca italiana em absorver este choque. "Como é provável que a atividade económica caia, os bancos poderiam ver uma queda na qualidade dos ativos e um aumento nos empréstimos e provisões não rentáveis", advertiu o Rabobank
Os economistas do Citi disseram que a última etapa de restrições italianas provavelmente resultará em "uma contração acentuada, semelhante à recessão de 2008-09". "Ainda é muito difícil, nesta fase, avaliar a extensão do declínio, mas isto provavelmente será muito maior do que a nossa estimativa original de 0,5-0,6%", disseram. A estimativa original do Citi foi baseada apenas em restrições para a Lombardia e outras partes industriais do norte que representam cerca de 40% da produção total da Itália.
Com as despesas italianas a aumentar em cerca de 10 mil milhões de euros, ou seja, cerca de 0,6% do PIB, Roma necessita da aprovação de Bruxelas.
"Vamos apoiar a Itália e o seu povo com todos os meios e medidas à nossa disposição", disse o vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis. O ex-primeiro-ministro da Letónia disse que a resposta europeia pode passar pela ajuda das PME através de linhas de crédito, não só em Itália mas em todos os outros estados-membros que necessitem.
"Nós podemos suportar o choque. Os nossos fundamentos económicos são fortes. As nossas economias serão capazes de se recuperar assim que este choque for absorvido", disse.
A Itália impôs na terça-feira restrições de viagem e uma proibição de reuniões públicas para ajudar a combater a propagação de uma doença que infetou mais de 10 mil pessoas e matou 977 pessoas em pouco mais de duas semanas. "Louvamos as autoridades italianas pelas medidas muito corajosas que estão a tomar. Sabemos que vão colocar uma grande tensão sobre o povo italiano, mas é melhor tomar essas medidas ousadas agora para proteger o maior número possível de pessoas contra o vírus", concluiu o vice-presidente da Comissão responsável pela economia.
O governo recebeu os líderes dos partidos de direita e extrema-direita. O primeiro-ministro Giuseppe Conte não descartou a possibilidade de adoptar medidas mais restritivas se necessário, disse durante o encontro que juntou os ministros Roberto Gualtieri (Economia), Federico D'Incà (Assuntos Parlamentares), o secretário do conselho de ministros Riccardo Fraccaro e os líderes das forças da oposição Matteo Salvini (Liga), Giorgia Meloni (Irmãos de Itália) e Antonio Tajani (Força Itália) e respetivos líderes parlamentares.
Conte garantiu que o executivo "continuará disponível e decidido, como sempre fez até agora, a tomar todas as medidas necessárias para combater a propagação do contágio com o máximo rigor e a atualizar essas medidas constantemente".
No final da reunião, o líder da Liga mostrou-se "preocupado". "Feche tudo agora, e salve os setores estratégicos, para recomeçar com saúde em breve", foi a mensagem de Salvini. "Chegou a hora de escolhas drásticas. Receamos que algumas pessoas subestimem a emergência de saúde".
Mais tarde, no Facebook, o ex-vice-primeiro-ministro reforçou a sua tese: "É hora de tomar medidas fortes, drásticas e não sujeitas a interpretações. Precisamos de uma intervenção forte, de um Estado forte com um governo forte".
Salvini criticou as "meias medidas" e apontou o dedo para o inimigo externo, para aqueles que querem "fazer guerra a Itália" com fins comerciais: "Ninguém pode permitir que nos humilhemos", clamou.
Também Giorgia Meloni, a líder dos Irmãos de Itália, apontou o alvo para fora das fronteiras, mas neste caso atacou a falta de cooperação da Europa: "Está totalmente ausente e tem de acordar."
Meloni também criticou os fundos alocados para combater a crise: "Já dissemos que pelo menos 30 mil milhões são um ponto de partida."
Por fim, o vice-presidente da Força Itália, Antonio Tajani criticou o governo pela gestão da emergência do ponto de vista da comunicação: "Os italianos precisam saber o que podem fazer e ainda há confusão."
Os italianos da região de Trieste fazem com frequência uma curta viagem até à Eslovénia para fazer compras e abastecer os automóveis com combustível mais barato. Na terça-feira à tarde, os carros atravessavam a fronteira com a vizinha Eslovénia em ambos os sentidos. Mas acabou: a Eslovénia declarou que vai fechar os 232 quilómetros de fronteira com a Itália, enquanto a Áustria mandou suspender as ligações aéreas e os comboios para o país que é o mais afetado pelo vírus fora da China.
Na fronteira austríaca, os meios de comunicação locais relataram que o tráfego era muito menos denso do que o habitual e que a polícia estava a parar os que se encontravam nos carros vindos de Itália para controlar as temperaturas dos viajantes.
As ligações aéreas com Itália sofreram cortes, da British Airways às low-cost Ryanair e Wizz Air a cancelar os voos.
O governo espanhol anunciou a suspensão de todo o tráfego aéreo com Itália por duas semanas, enquanto a Áustria disse que iria introduzir novas restrições nas chegadas a partir de Itália.
Não houve cancelamentos de viagens ferroviárias, segundo confirmou a AFP. A polícia, na principal estação ferroviária de Roma, Termini, verificava os motivos das viagem dos passageiros e recomendava que os passageiros mantenham a distância recomendada de um metro de outras pessoas.