O ex-eurodeputado social-democrata continua a querer apostar na formação de jovens quadros ao dirigir a Universidade de Verão do PSD, que começa na segunda-feira em Castelo de Vide. Carlos Coelho frisa que o PSD precisa de "clareza" nas propostas para ter um bom resultado eleitoral. Mas está preocupado. .Apesar de não ter sido eleito eurodeputado continua a dirigir a Universidade de Verão (UV) do PSD. O que tem de especial esta iniciativa para continuar ligado a ela? A UV começou em 2003 e significa um investimento sério na formação política de jovens quadros. Se achamos, e muitas vezes com razão, que a política precisa de mais rigor e de mais qualidade, temos de oferecer aos jovens que estão dispostos a ter intervenção cívica a oportunidade de se prepararem para isso. A política não é um hobby, um dirigente político tem de perceber um bocadinho de economia, de ciência política, de ambiente, de comunicação. Tem de ter uma valência multidisciplinar e capacidade de trabalhar em grupo, de se expressar, de convencer, de escrever, e a Universidade de Verão é uma semana intensiva em que jovens quadros que o desejam têm oportunidade de desenvolver estas capacidades..Esta UV tem alguma novidade em relação às anteriores? Por exemplo, nesta edição decidimos ser muito mais amigos do ambiente e reduzimos significativamente o papel, há muitos aspetos da tramitação interna que passam a ser feitos apenas pela via digital; abolimos as garrafas de plástico em todas as sessões na sequência de apelos dos alunos de anos anteriores, vamos distribuir uns cantis por todos os participantes e instalámos um sistema de distribuição de água à entrada da sala de aula..Os temas deste ano tiveram em conta a proximidade das eleições legislativas? De quatro em quatro anos temos este problema [risos]. Acho que nunca desgraduamos a qualidade da universidade em função de interesses meramente eleitorais; isto é, não transformámos um espaço de formação num espaço de propaganda eleitoral. E isso vê-se não apenas pelo tipo de temas mas também pela circunstância de termos oradores de diferentes partidos. Se me pergunta se a abordagem do Dr. Joaquim Sarmento sobre economia, que foi autor do programa eleitoral do PSD, vai estar mais em linha com o que o PSD propõe para estas eleições, é uma inevitabilidade. Filipa Roseta, cabeça-de-lista em Lisboa, vai fazer um jantar-conferência sobre habitação, que é um dos grandes problemas das áreas urbanas, e vai dizer o que defende o programa do PSD para essa área..Mas admite que o mau resultado das eleições europeias para o PSD e até para o CDS será tema de debate? Há um debate político que vai ser feito pelo professor Miguel Poiares Maduro [PSD] e pelo Dr. Adolfo Mesquita Nunes [CDS] sobre os novos desafios das democracias, que pensamos moldar mais em termos de futuro, mas que admito possa ter alguma ligação com a atualidade política..As críticas ao governo e à geringonça cabem neste fórum de formação e debate político? Pode vir por arrastamento, mas o que nos interessa é que os alunos percebam a importância estratégica da dimensão do ambiente, por exemplo, nas políticas atuais. É mesmo um espaço de formação. O António Vitorino [PS] vai falar das migrações, que são uma das grandes questões da atualidade. É mais importante sublinhar essa dimensão e porque não podemos cair no discurso da extrema-direita que, infelizmente, está a fazer o seu percurso nalguns países, e não é só Itália. Enquanto espaço de formação aberto, a UV não é uma ferramenta de construção do discurso eleitoral. Isso é para os partidos. O PSD e a JSD devem fazê-lo no âmbito da sua iniciativa política legítima, explicar porque é que as nossas posições são as mais sólidas e porque é que o governo está a funcionar mal nas áreas em que está a funcionar mal. A UV não tem essa lógica e é isso que justifica que em anteriores sessões houvesse jovens de outros partidos a participar nela, jovens socialistas e democratas-cristãos. Foram atrás do espaço de formação e não do espaço de manipular as consciências ou de formatar as pessoas para um discurso partidário..Mas o encerramento é destinado ao discurso do líder do PSD. Sim, e é legítimo porque é o PSD que promove esta iniciativa. No domingo será o momento em que o Dr. Rui Rio dirá o que quiser dizer. É expectável que a um mês das eleições legislativas ele não vá falar da descoberta da Lua, nem de outros temas mais esotéricos, que vá fazer um discurso mais político..Que avance já para um registo de campanha e com propostas eleitorais? A um mês das eleições não me parece muito razoável que não haja propostas concretas. O tempo é relativamente limitado, hoje as pessoas dão menos atenção à política do que davam quando eu era mais novo e, portanto, nenhum partido pode reservar para os últimos cinco dias de campanha a apresentação das suas propostas eleitorais porque será demasiado tarde..É então desejável que o PSD acelere, atendendo aos resultados eleitorais e às sondagens? Parece-me que é evidente que para que o PSD tenha um bom resultado tem de ser claro quanto ao seu projeto, tem de ser clara a diferença entre o PSD e os outros partidos que são candidatos às eleições legislativas, e isso faz-se através da apresentação das propostas eleitorais..A "crise das direitas", como classificou o Presidente da República após as eleições europeias - que o afetaram também a si porque acabou por não ser eleito eurodeputado -, preocupa-o? Sou do PSD, militante, e preocupo-me sempre quando o meu partido não ganha uma eleição, seja ela qual for. E fico mais preocupado quando há uma diferença sensível entre a votação do partido que ganha e o meu partido. Fiquei preocupado com as eleições europeias e espero que as legislativas traduzam outro resultado..O que seria importante fazer para inverter esta tendência de queda do PSD? Espero que os protagonistas do PSD sejam capazes de expressar as diferenças e de convencer os portugueses de que a alternativa de governação que vale a pena é aquela que é oferecida pelo PSD..Acabou por não ser eleito, era o sétimo da lista do PSD, e após tantos anos no Parlamento Europeu. Que desafios tem pela frente? Em Bruxelas vou aceitar um desafio que me fizeram, que é de lançar e dirigir o Observatório de Schengen, que vai ser uma plataforma de pressão sobre as instituições europeias relativamente às políticas de circulação e controlos de fronteira. Vamos lançar neste ano até dezembro. Para Portugal tenho uma iniciativa com pessoas de partidos diferentes, ligada à sociedade civil , que sublinhe o esforço que tenho feito com a Universidade de Verão, que é a necessidade de reforçar a componente pedagógica. Temos de aproximar a Europa das pessoas, particularmente os mais jovens, e isso inclui fazer atividades nas escolas e de divulgação. Essa associação também será lançada até dezembro..Neste momento em que a Europa atravessa um desafio terrível, não é frustrante não estar no Parlamento Europeu? Eu queria ser eurodeputado e fiquei desapontado quando o meu partido me colocou em sétimo lugar na lista, mas aceitei o desafio e fiz campanha, embora o resultado tivesse correspondido ao que eu receava, a não eleição. Em qualquer circunstância não se defende só a Europa, no Parlamento Europeu. Há outras oportunidades, espero fazê-lo em Bruxelas enquanto presidente do Observatório de Schengen e em Lisboa no âmbito desta associação..Mas dada a situação que se vive na União Europeia, o PSD não deveria ter apostado em pessoas com mais experiência nas eleições europeias? Não estou em condições de avaliar as escolhas porque sou parte interessada e tenho uma análise sectária..O partido fez-lhe entretanto mais algum desafio? Estes projetos em que me vou empenhar não têm cariz partidário, no Observatório de Schengen há pessoas desde os socialistas europeus até aos democratas-cristãos, passando pelos liberais. E em Portugal a mesma coisa, com esta associação. Olhei para estas iniciativas numa lógica transpartidária..E é nessa lógica que quer estar agora? É, é, é..A Europa está coesa para enfrentar os desafios que tem pela frente, nomeadamente o Brexit e as migrações? A Europa está com vários problemas e há áreas em que não está a ser capaz de dar resposta, as migrações são um exemplo claro. Quando há um ministro de um Estado membro, estou a falar de Salvini, que manda fechar as fronteiras, que é contrariado pelo poder judicial e que, numa primeira fase, não quer dar consequência ao Estado de direito, isto é cumprir decisões judiciais, é um péssimo sinal. Quando há um conjunto de países, não estou só a falar da Hungria de Orbán, que estão com uma lógica quase trumpiana de meu país primeiro e nada de solidariedade europeia, isto deve-nos preocupar. Agora na resposta ao Brexit, o que se tem visto é uma grande coesão, os outros 27 Estados membros a dar apoio às propostas da Comissão Europeia e do presidente do Conselho na resposta às autoridades britânicas. E percebe-se porque até em países com governos relativamente eurocéticos, aquilo que não querem ouvir falar é da saída do Reino Unido. E se não tivermos uma resposta coesa relativamente a ameaças que possam pôr em causa o projeto europeu, como é o Brexit, arriscamos a destruir esse projeto. Há dimensões da luta institucional em que a Europa tem estado coesa, a resposta ao Brexit é a mais evidente, há políticas concretas em que, infelizmente, não temos conseguido, e a resposta às migrações é o exemplo mais eloquente..Poderá existir alguma inflexão no Brexit com este novo governo britânico? A lógica aponta para que o Brexit não ocorra. Porque é mau para o país que quer sair e é mau para os países que ficam. Não estamos perante uma decisão sem consequências. Agora quando há algum protagonismo mais emocional e menos racional, tudo é possível. O atual primeiro-ministro britânico [Boris Johnson] é um bocadinho excêntrico e ele, em função de uma obsessão, porque ele é um separatista e vive no sonho de um Reino Unido fora da União Europeia, pode levar mesmo o país a uma rutura, a um Brexit sem acordo, que é o pior cenário. O Banco Central da Inglaterra fez uma avaliação e prevê um quadro de retração do produto entre 4% e 6%, uma destruição massiva de emprego e a necessidade de 20 anos para o Reino Unido recuperar a situação económica que teria à data do hard Brexit. Se isto não é uma tragédia, não sei o que é que é.