Fernando Santos é intocável. Esta é a ideia reinante na Federação Portuguesa de Futebol, apesar da modesta participação de Portugal no Euro 2020. A estrutura da seleção nacional vai analisar o desempenho no torneio, onde a equipa das quinas foi eliminada nos oitavos de final, diante da Bélgica, mas parece claro para (quase) todos, dentro do organismo, que o problema não é o selecionador, que em 2016 liderou a Portugal ao título europeu..Agora, em nome da estabilidade - uma das bandeiras da presidência de Fernando Gomes - e do desejo da conquista do título mundial em 2022, no Qatar, o selecionador vai manter-se ao leme. Aliás, ao que o DN apurou, por causa do adiamento do Europeu por causa da pandemia, o projeto do Euro 2020 cruzou-se com o do Mundial 2022, com a renovação de Fernando Santos até 2024 a estar no centro destes dois projetos..A qualificação para o Mundial do próximo ano começou em março e prossegue já em setembro, com a receção à Rep. Irlanda e a deslocação ao Qatar, país que vai organizar o torneio entre novembro e dezembro do próximo ano. O selecionador já disse que vai ao Mundial para ganhar... Além disso, até ao final do contrato de Santos há ainda a Liga das Nações de 2023 e o Europeu de 2024..Nessa altura, já será o segundo selecionador com mais tempo no cargo de sempre - agora só é superado por Cândido de Oliveira, que teve três passagens pelo banco nacional. Fernando Santos é o treinador com mais triunfos e o mais bem sucedido, uma vez que foi o único a levantar troféus (Euro 2016 e Liga das Nações 2019). Falta o Mundial. Em 2018 não correu bem, mas todos acreditam que no Qatar é que vai ser. Aliás, segundo soube o DN, muitos da estrutura olharam para o Euro 2020 como etapa para esse sonho maior...."Foi curto! Esta geração tem nível para chegar mais longe e eu tenho a esperança que no Campeonato do Mundo, com alguma renovação e outros sub-21, possam ir mais longe." Este é o balanço da participação portuguesa feita pelo antigo internacional português António Simões, lembrando que é preciso pensar no futuro desta geração: "Não sei se quem manda pensa dessa forma, mas quem lidera este projeto desportivo tem de pensar num Portugal que está sempre lá e que tem de ir até ao fim mais vezes. Esse é o grande desafio.".O dedo apontado ao selecionador é coisa que não agrada a Simões. "O desgraçado do Fernando Santos até foi culpado de tudo... até na bola ao poste. Não pode ser. Temos direito à crítica, mas a critica implica conhecimento e perde crédito quando é feita por ignorantes. O povo português tem a cultura do jogo e a sensibilidade crítica, mas tem tendência para pedir a cabeça de quem lidera... mas foi o Fernando Santos que jogou?", questionou o antigo magriço, um dos responsáveis pelo melhor Mundial de sempre da seleção nacional (terceiro lugar em 1966)..Simões garante que não se trata de "gratidão", mas de "competência" e "conhecimento": "Teve o privilégio e o mérito de conquistar troféus e agora olhamos para ele como o grande responsável de não voltarmos a ganhar. Se foi contratado com base na competência então não deixou de ser competente por perder. Estamos fartos da competência? Parece que os portugueses às vezes se fartam da competência e querem é algo diferente." Esse é aliás um "aspeto cultural" que na sua opinião devia dar para as pessoas refletirem quando "pedem a cabeça de alguém"..Para Simões "é altura de tomar decisões e fazer ajustamentos para tirar o melhor partido da nossa riqueza futebolística". E, para isso, "é preciso que quem lidera saiba usar o poder quem tem". E uma das coisas a fazer é pensar mais à frente: "Nós temos aquele que foi o melhor do Mundo durante anos perto do final da carreira e é hora de refletir como vamos jogar quando não tivermos o Cristiano. Como é que vamos fazer sem ele? Isso não é dizer que ele não é importante é projetar, planear e antecipar.".Sem querer pôr-se no lugar de selecionador e questionar o porquê de entrar sempre com o mesmo trio no ataque (Diogo Jota, Ronaldo e Bernardo Silva) ou porque é que só mexeu nas laterais e no meio-campo, Simões tem uma critica a fazer: "Pareceu-me que houve jogadores em exaustão e que não deviam ter jogado tanto tempo sem o rendimento desejado. O Bruno Fernandes e o Bernardo Silva estavam fisicamente esgotados e faltou-lhes o discernimento necessário? Houve alguma falta de gestão? Mas para mim é uma dúvida e não uma certeza", defendeu..Olhando para os 26 eleitos para este Europeu fica claro que este é o grupo base para atacar o Mundial 2022. Tirando Pepe (38 anos), José Fonte (37), Cristiano Ronaldo (36), João Moutinho (34) e Rui Patrício (33) todos têm menos de 30 anos e, por isso, não se esperam reformas antecipadas..Mas se é difícil imaginar uma seleção sem Ronaldo, que aos 36 anos mostra uma forma invejável e marca trinta golos por época, o mesmo não se pode dizer de José Fonte, João Moutinho ou mesmo Pepe, que apesar da invejável longevidade, terá quase 40 anos no próximo Campeonato do Mundo..Fernando Santos torce sempre o nariz à palavra renovação, mas se sobram opções no meio campo, também é verdade que há um problema sério no centro da defesa. Para este Europeu foram chamados Pepe, José Fonte e Rúben Dias, pelo que é preciso encontrar alternativas. Domingos Duarte, Rúben Semedo ou Diogo Leite podem ser as opções mais imediatas..Olhando só aos factos, a seleção caiu nos oitavos de final do Euro 2020, que é a pior participação de sempre numa fase final desta competição. Nas anteriores participações, Portugal chegou aos quartos-de-final em 1996 e 2008, às meias-finais em 1984, 2000 e 2012, foi finalista vencido em 2004 e em 2016 conquistou o título. Por isso, Fernando Santos admitiu que "soube a pouco"..Um sentimento comum ao manifestado pelo Presidente da República e o líder da Federação. "Frente à Bélgica senti-me orgulhoso de ser Presidente de Portugal, porque mostrámos que somos verdadeiramente dos melhores. Depois podemos ganhar ou não, ter ou não sorte. Há dias assim", disse Marcelo Rebelo de Sousa, que ontem foi à Cidade do futebol receber a comitiva e apontou já ao Campeonato do Mundo: "Não deu no Euro mas temos o Mundial. A luta continua.".Fernando Gomes lembrou o "momento triste" pelo objetivo falhado, mas também orgulho pelo grupo: "Tudo faremos para estar presentes no Mundial do Qatar para mostrar que somos uma potência do futebol mundial.".Antes disso, Ronaldo lamentou a eliminação nas redes sociais e defendeu que a seleção ainda pode dar muitas alegrias. "Saímos da prova antes do desejado. Mas estamos orgulhosos do nosso percurso, demos tudo para renovar o título de campeões europeus e este grupo provou que ainda pode dar muitas alegrias aos portugueses", escreveu o capitão no Instagram, sem esquecer os "incansáveis" adeptos e garantindo: "Voltaremos mais fortes.".isaura.almeida@dn.pt