Depois de Klaus, nomeado ao Óscar, a Netflix aposta de novo numa animação. The Willoughbys é uma realização de Kris Pearn a partir do livro de Lois Lowry, onde quatro irmãos maltratados pelos pais decidem ficar órfãos. Um conto de má parentalidade filmado com um humor que é capaz de agradar a miúdos e a graúdos. Uma bela animação que chega à Netflix em versão original e dobrada. Na original destaca-se a voz de Ricky Gervais na pele de um hilariante gato narrador..Os Willoughby é um espetáculo de cor e energia bastante recomendável. Em tempos de confinamento, não há volta a dar: será o filme mais visto pelas famílias. Aos poucos, o gigante de streaming começa a ser concorrência séria à Disney e à Pixar no setor da animação. Kris Pearn, ao telefone da sua casa na Califórnia aceitou falar ao DN..Este é um filme ideal para vermos em plena quarentena?.Sim, ao fim ao cabo é sobre crianças presas em casa com os pais...Muitos de nós estamos a passar por isso. Só espero é que quando isto voltar ao normal possamos também fazer o mesmo que estes irmãos e viajar mundo fora! Mas o grande tema do filme é a importância de podermos escolher quem amamos e o valor da família. Sinto que nestes dias isso tem uma validade muito forte. E acho que o mundo está a precisar agora de um filme divertido..Foi fácil fazer o "pitch" de um projeto sobre parentalidade cruel, por muito que seja baseado numa obra literária de Lois Lowry?.Tenho um sentido de humor retorcido e se acho que algo me parece cómico então torna-se fácil de propor. Se é para estarmos 4, 5 anos da nossa vida com um projeto então é bom que valha o risco. Esta história por ser inesperada ainda dá mais ganas de a contar....E como é que o humor do Ricky Gervais cresceu no guião?.O Ricky já estava inicialmente ligado ao projeto, era o produtor que pagou os direitos do livro. Mas quando entrei no projeto comecei a pensar na voz dele para o filme. Ele é alguém cujo tom é único! O facto de o colocarmos como narrador ajudava a dar ao projeto uma noção de conto. E ter um gato como narrador mudava tudo. Um filme com um gato como narrador fez com que o nosso designer de produção pensasse em texturas diferentes, as cores fossem outras. Enfim, o Ricky como gato tornou-se a base do filme. Com isso, experimentámos imaginar a câmara mais perto de tudo... O mundo aqui criado é como se fosse todo feito à mão..Mas ele trouxe as suas próprias piadas....Sim, sim! Ao longo destes anos de preparação tive uma meia dúzia de gravações com ele e isso fez com que utilizássemos diferentes possibilidades na montagem. A grande vantagem de termos um grande comediante como ele é que, além do mais, temos um excelente observador da estupidez humana. De alguma forma, não me atrevi a escrever para o Ricky. Apenas apresentava-lhe uma versão e ele depois dava o seu toque..Mas esse humor que às tantas é mesmo sofisticado não pode passar ao lado do público infantil?.Tenho uma convicção forte de contar histórias para um público vasto. O meu objetivo é criar camadas sem nunca deixar de ser uma comédia. Os Willoughby é tanto uma viagem emocional como filme de família. Tudo isso convém funcionar em simultâneo. Se temos uma piada mais sofisticada ou alguma referência qualquer, ao mesmo tempo, tento sempre colocar algo físico ou tolo para entreter os mais jovens. Tal como acontecia com Peter Sellers, o humor dele tanto era físico como não deslustrava a sua conceção molecular..Como estúdio, sobretudo agora e depois de Klaus, vê a Netflix a competir diretamente com a Disney/Pixar?.Na realidade todos estão a competir pela atenção do público...O que se passa com a Netflix é que já está em casa das pessoas há muito tempo e há cada vez mais gente a aderir. Falo por mim, gosto de estar a trabalhar com aqueles que me dão permissão para contar histórias fora do vulgar. Na Netflix a prioridade é construir um espólio cheio de diversidade. E o nosso filme explora um sentido clássico de animação. Estou a gostar da forma como tudo está a caminhar, cada vez há projetos menos estandardizados . É uma bela época para ser animador!.Conseguiu já espreitar a versão a portuguesa do seu filme. Está curioso?.Estou imensamente curioso. Mas apenas ouvi uma das canções da versão portuguesa quando estive em janeiro nos estúdios Skywalker nas misturas finais. Ouvi também a versão holandesa e umas quantas asiáticas - o resultado é espantoso. Vou passar alguns dias a ver o meu filme em diversas línguas....Acredita que este vírus pode vir a mudar o negócio de Hollywood?.O negócio já está a mudar. Veja o meu exemplo: já tenho a tendência de ver mais cinema em casa do que nas salas.. .O meu filme preferido o ano passado foi J'ai Perdu Mon Corps e encontrei-o na Netflix. Sou fã do sistema de bing watching [ver séries em maratona]. Por outro lado, é complicado fazer previsões sobre o que vai acontecer quando isto voltar à normalidade, tanto mais que o ser humano gosta de ajuntamentos...O que sei é que na animação, no cinema, a pressão de um filme ter de faturar 300 milhões não deixa de ser um fator de limitação... É muito bom existirem as netflixs que nos deixam contar estas histórias..Mas não me está a dizer que não existem expectativas na Netflix de números de audiências para o seu filme, pois não?.Sim, também há pressão. É o showbizz! No final das contas, temos de acreditar no nosso instinto. Olho para a animação como "stand-up comedy" em câmara lenta - temos 5 anos para dizer uma piada... Com Os Willoughby espero que consiga chegar ao maior número possível de pessoas..Mas tem a consciência de que fez um filme com bom humor....Sim! Adoro rir e isso ajuda.