Novas informações reveladas pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), numa reunião na sede no município com o presidente da Junta de Freguesia de Carnide, colocam no Ministério da Administração Interna e na PSP toda a responsabilidade pelo estado de degradação da maior esquadra daquele bairro lisboeta, encerrada desde outubro passado..No encontro realizado na passada quarta-feira, em que também estiveram presentes vários vereadores, Fernando Medina garantiu a Fábio Sousa, o autarca comunista de Carnide, que, apesar das instalações da esquadra serem propriedade da câmara, nunca lhe foram solicitadas obras pelo MAI ou pela PSP. Mais, Medina frisou que nem sequer foi consultado antes de a decisão de encerramento ser tomada..Contactado pelo DN, o gabinete do presidente da Câmara de Lisboa reconfirma esta posição: "A CML desconhecia o mau estado de conservação do espaço municipal ocupado pela PSP em Carnide, pois nunca lhe foi reportada qualquer necessidade de serem feitas obras naquele local; a decisão de encerramento da esquadra não foi da CML.".Por seu lado, Fábio Sousa sublinha que esta revelação de Fernando Medina "veio demonstrar ainda mais toda a má-fé do MAI neste processo - não exclui apenas a junta de freguesia, que só teve conhecimento do fecho da esquadra no próprio dia, como a própria câmara"..O presidente da junta acrescenta que Medina "assume a responsabilidade pela manutenção do edifício e garantiu que poderá fazer as obras necessárias a qualquer momento, logo que o MAI lho peça"..Para Fábio Sousa, "esta disponibilidade mostra que é possível reabrir a esquadra, pois não só a junta está pronta a fazer obras como a própria câmara". O presidente da junta lamenta que "uma decisão com um impacto tão grande na segurança da população tenha sido tomada de forma unilateral, sem consultar as forças vivas da sociedade, incluindo os seus representantes locais"..Questionada pelo DN sobre o inexistente pedido de obras à câmara, o MAI não respondeu..MAI diz que está a "articular".Na mesma reunião, Fernando Medina assegurou também que nunca foi informado sobre qualquer plano de reorganização das esquadras da PSP no concelho de Lisboa, para o qual o MAI remeteu, na altura do encerramento, a decisão sobre o futuro das instalações em Carnide. Ao DN, o gabinete de Medina confirmou que "a CML desconhece que haja da parte da PSP e do MAI alterações ao que está definido no atual dispositivo territorial do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP", bem como "qualquer nova proposta de dispositivo por parte do MAI"..Confrontado pelo DN sobre as declarações de Medina, o porta-voz de Eduardo Cabrita diz que "o trabalho de reordenamento do dispositivo em Lisboa está, como já foi afirmado, a ser feito em articulação com a Câmara de Lisboa". E acrescenta que "para a próxima terça-feira está marcada uma reunião entre o secretário de Estado adjunto da Administração Interna e o vereador da Segurança e Mobilidade da CML, na qual o tema da reorganização do dispositivo do Comando Metropolitano de Lisboa e em particular a questão específica de Carnide serão abordados"..Fábio Sousa, por seu turno, reforça as críticas ao ministério de Eduardo Cabrita: "Não é assim que se cuida da segurança das pessoas. Não se pode fazer um plano para reorganizar o dispositivo de esquadras numa cidade sem ter em conta as realidades locais.".Esta esquadra, que tinha cerca de 70 agentes, servia uma população de cerca de 30 mil habitantes, numa área muito movimentada da cidade, que conta com grandes plataformas comerciais, hospitais, muito comércio e salas de espetáculos. Está muito próxima da zona histórica da freguesia, onde a população é idosa e com grande necessidade de acompanhamento e assistência de proximidade..Segundo disse ao DN o Ministério da Administração Interna, quando começaram a surgir os protestos da população "face à dimensão e natureza das obras necessárias, a reabertura da esquadra está em análise no quadro do reordenamento do dispositivo na cidade de Lisboa", acrescentando que "as decisões nesta matéria assentam exclusivamente em critérios de natureza operacional"..Declarações confusas.As declarações e as respostas do MAI e dos seus responsáveis sobre o "plano" e a "reorganização" do dispositivo" são um pouco confusas a contraditórias. Em reação à notícia do DN sobre o plano da PSP, já iniciado em 2011, no âmbito do qual foram já fechadas 14 esquadras e que previa o encerramento de mais algumas, o MAI nega que tal exista. Porém, o novo diretor nacional da PSP, Manuel Magina da Silva, deu a entender que atualmente as esquadras são de mais. "Quanto mais instalações policiais tivermos, menos polícias teremos nas ruas para acorrer às necessidades do cidadão aflito", declarou Manuel Magina da Silva numa entrevista à TVI..Nesse plano de 2011, na altura da troika, o "valor elevado" de algumas rendas acabou por pesar na seleção das 13 esquadras a encerrar. Esse era um dos três principais critérios. Os outros dois eram a degradação de as instalações ser irreversível e a baixa produtividade - poucas queixas apresentadas e atendimentos ao público..Apesar de negar a existência de qualquer plano, fonte oficial do Ministério da Administração Interna confirma que "para a reorganização do dispositivo das esquadras da PSP em Lisboa mantêm-se válidos os critérios referidos em 2011"..A esquadra de Carnide, por sinal, não preenchia nem preenche nenhum desses critérios. O presidente da junta de freguesia, o único eleito pela CDU (por duas vezes com maioria absoluta), quer "acreditar que não há" leituras políticas a fazer, "mas é evidente a falta de diálogo com o governo"..Entretanto, em declarações públicas, o secretário de Estado da Administração Interna, Antero Luís, confirmou que "há uma ideia do Ministério da Administração Interna de fazer uma reorganização do dispositivo em que se inclui as duas áreas metropolitanas e a questão das instalações e o número de instalações". No entanto, completou a ideia precisando que essa reorganização "não está em discussão no seio do MAI" nem com a polícia, admitindo que "em determinada altura há de ser colocado"..A ordem de encerramento.Segundo explicou o Ministério da Administração Interna, "a PSP, após pedir uma avaliação das condições de salubridade da esquadra de Carnide e face ao relatório recebido, considerou adequado e propôs à tutela o seu encerramento". Esta decisão teve por base um relatório das autoridades de saúde que registou a "insalubridade" das instalações. O documento, assinado pela delegada de Saúde, dizia que as condições da esquadra estavam "seriamente comprometidas, configurando situação de insalubridade atentatória do bem-estar e saúde a que os funcionários e o público em geral se reservam"..O relatório foi concluído a 19 de agosto de 2019 e a ordem de encerramento foi dada a 18 de outubro, dois meses depois e logo a seguir às eleições legislativas..No passado dia 17 de fevereiro, poucas horas antes do protesto da população, o DN visitou as antigas instalações, acompanhado por dois assessores do Ministério da Administração Interna e pelo subintendente Francisco Alves, que comanda a 3.ª divisão da PSP, a que pertence a esquadra de Carnide. Conforme já tinha sido atestado pela delegada de Saúde, as condições são deploráveis, com cinco tampas de esgoto dentro das salas, infiltrações e mau cheiro..Nesse dia, Antero Luís sublinhou que era "impossível reabrir a esquadra de Carnide" sem uma solução definitiva em relação aos esgotos, dando conta de que esta situação já foi transmitida ao presidente da junta de freguesia..O MAI afirmou que tinha pedido à junta de freguesia para identificar outras instalações que possam albergar a esquadra, mas Fábio Sousa disse que "o MAI e a câmara sabem bem que não há edifícios disponíveis - só terrenos livres, que obrigará a uma construção de raiz. Enquanto isso, têm de ser feitas obras e reaberta a antiga".