A ASAE está a investigar quem financia a greve dos enfermeiros nos blocos operatórios e já notificou a PPL, a plataforma que aloja o crowdfunding, o fundo solidário que recolheu 784 mil euros, para lhe fornecer todos os dados sobre os financiadores. Só que antes de dar as informações à ASAE, e mesmo tratando-se de uma polícia, a PPL entendeu primeiro pedir um parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD)..Yioann Nesme, sócio-gerente da PPL, disse ao DN que a ASAE notificou a plataforma na passada sexta-feira e que lhe deu um prazo de cinco dias úteis para responder. É nesse espaço de tempo que espera receber a resposta da CNPD quanto à legalidade de fornecer as informações. A Comissão Nacional de Proteção de Dados, por seu turno, confirmou que recebeu o pedido da plataforma digital..A PPL tem acesso a todos os dados que os meios de pagamento usados para fazer o donativo proporcionam - e esse pagamento pode ser feito por MB Way, PayPal, transferência bancária ou multibanco. Ou seja, praticamente a tudo..O financiamento da greve cirúrgica dos enfermeiros - que nesta segunda fase vai de 31 de janeiro a 28 de fevereiro - tem levantado suspeições públicas sobre a sua origem, sendo aventada nomeadamente a possibilidade de estar a ser financiada pelo setor privado da saúde. A polémica levou ASAE a avançar, mesmo que a lei sobre o financiamento colaborativo, que já tem um ano, não tenha ainda sido regulamentada. O diretor-geral desta polícia, Pedro Portugal Gaspar, fez questão de garantir que agiu sem ser a pedido do governo..Na entrevista ao DN/TSF, a bastonário da Ordem dos Enfermeiros até mostrou concordância com a revelação de quem são os contribuintes para o crowdfunding, mas lembrou que está em causa a proteção de dados pessoais. "Penso que tem de haver aqui uma pronúncia da Comissão Nacional de Proteção de Dados para ninguém cair numa ilegalidade. Os enfermeiros já são acusados de determinadas coisas e iriam ser acusados de ter divulgado ilegalmente dados pessoais", afirmou Ana Rita Cavaco..A polémica vai subindo de tom e entretanto o governo decretou a requisição civil para o cumprimento dos serviços mínimos. O Ministério da Saúde ainda aguarda o parecer da Procuradoria-Geral da República sobre a legalidade da paralisação e do seu funcionamento. E o PS já veio anunciar que vai falar com os outros partidos para a apresentação de um projeto que proíba contribuições financeiras anónimas no crowdfunding..Enfermeiros pedem que doadores alterem anonimato.E enquanto esse parecer não sai e decorre a fiscalização da ASAE, o grupo de cinco enfermeiros que gere o crowdfunding decidiu antecipar-se e na madrugada de sábado enviou um e-mail dos apoiantes no sentido de irem à plataforma alterarem a sua condição de anónimos..Catarina Barbosa, uma das gestoras do fundo, considera que esta é uma forma de deixar de haver suspeições sobre o financiamento da greve. Entende ainda que a avançar a investigação da ASAE, os doadores já estão identificados sem haver necessidade de o fazerem por ordem da justiça. E espera que até ao final desta semana, quando pedirem novamente os gráficos à PPL, muitas pessoas já tenham saído do anonimato..Yoann Nesme, sócio-gerente da PPL, avança que desde que foi enviado o e-mail, centenas de pessoas já foram alterar a sua condição de anónimas..Lúcia Leite, da Associação Sindical Portuguesa de Enfermeiros (ASPE) - que juntamente com o Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindep) convocou a greve cirúrgica -, faz questão de frisar que nada tem que ver com a recolha de fundos, mas também diz ser uma das maiores interessadas em que se mostre a forma transparente como estão a ser recolhidos os fundos. Para provar que não há recurso "a interesses ocultos"..A sindicalista considera, no entanto, que o organismo adequado para fazer esta investigação seria o Ministério Público, através da Polícia Judiciária, e não a ASAE..Mas lamenta que "se continue a falar na espuma" em vez de se falar nos reais problemas dos enfermeiros. "Somos uma sociedade em que se opta por donativos anónimos para que quem dá não seja acusado de vaidade e caridade. Parece-me contraditório com a publicação dos nomes de quem contribuiu para os enfermeiros", afirma..Quem fizer greve recebe 42 euros por cada dia.O crowdfunding para financiar a greve cirúrgica é gerido por cinco enfermeiros. Segundo estes, os 784 mil euros (424 mil angariados na segunda paralisação e 360 mil na primeira) foram dados sobretudo por enfermeiros a título particular ou em grupo, familiares e amigos. E garantem que está tudo dentro da lei, nomeadamente o pagamento dos 72 mil euros à PPL, 13 mil dos quais foram para o IVA. Com este fundo, é possível que um enfermeiro receba 42 euros por cada dia que adira à paralisação..Esta é a segunda paralisação dos enfermeiros - a primeira, nos blocos operatórios de cinco grandes hospitais, estendeu-se de 22 de novembro a 31 de dezembro e levou ao cancelamento ou adiamento de quase oito mil cirurgias..Estes profissionais da saúde exigem que os enfermeiros dos escalões mais baixos tenham um aumento de 421 euros, passando a ganhar cerca de 1600 euros mensais. Reivindicam igualmente a reforma antecipada aos 57 anos e 35 de serviço. E pedem que o governo estabeleça três categorias profissionais - enfermeiro, enfermeiro especialista e enfermeiro diretor.