Drones da Força Aérea ainda a meio gás. PSD aperta o cerco a Cravinho

O PSD quer explicações pelo facto de, pelo segundo ano consecutivo, não estar operacional a capacidade dos 12 drones de deteção de incêndios anunciada no ano passado. O Tribunal de Contas assegura que "a qualquer momento" pode fiscalizar o contrato de 4.5 milhões
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A bancada parlamentar do PSD quer explicações do ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, sobre a situação dos 12 drones da Força Aérea Portuguesa (FAP) para apoio à vigilância florestal e deteção de incêndios, na sequência da nova suspensão dos voos destas aeronaves, anunciada pelo Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA), depois de ter caído mais um destes aparelhos na quarta-feira. Cravinho já tinha assumido "falhas" neste processo que reconheceu ser "complexo", mas nunca anunciou qualquer inquérito ou auditoria.

Os voos foram, entretanto reativados este sábado, depois do relatório preliminar da Comissão Central de Investigação da Inspeção Geral da Força Aérea (IGFA), feito em apenas dois dias, ter indicado que era "reduzida a probabilidade" de voltar a acontecer de novo a avaria que motivou o acidente. O IGFA não divulgou o relatório. .

Foi o quarto incidente desde o verão do ano passado a envolver estes drones e a segunda vez que a FAP parou a operação de apoio ao Dispositivo Especial de Combate aos Incêndios Rurais (DECIR).

Conforme o DN noticiou, a queda deixou a aeronave completamente despedaçada, junto à base aérea de Beja, quando regressava de uma missão de vigilância.

Este era um dos 12 drones adquiridos por ajuste direto (após consulta a outras duas empresas) em 2020 pelo valor de 4.5 milhões à empresa portuguesa UAVision.

A reativação dos voos diz, no entanto, respeito a apenas 3 dos 12 drones. De acordo com dados do Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) estão disponíveis para estas missões sete drones Ogassa.

Quatro designados de "asa fixa": um que está na Base da Ota para formação e treino, dois a operar a partir da base de Beja e outro na Lousã.

Na base de Macedo de Cavaleiros estavam três do tipo VTOL (Vertical Take-off and Landing), com capacidade de levantar e aterrar verticalmente. Mas estes tinham sido suspensos há alguns dias pela FAP, antes da queda de Beja, por salvaguarda de segurança, por terem sido verificados "comportamentos estranhos" na aproximação à pista, semelhantes aos que sucederam antes de um dos acidentes no ano passado. Ao que o DN apurou, voltaram à fase de testes e não estão a ser utilizados nas missões dos incêndios.

"O Ministro tem de explicar a detalhe porque é que uma capacidade constituída por 12 drones que anunciou para 2020, pelo segundo ano consecutivo não existe. Recordo que no passado dia sete de julho o Sr. Ministro disse no parlamento que nesse estavam operacionais seis drones com cinco equipas dos três Ramos. Onde estão esses drones agora, porque não estão todos a voar? O que nos parece é que o Ministro anuncia sucessivamente uma capacidade fantasma e que o tão apregoado sistema de drones de deteção de incêndios rurais continua, pelo segundo ano, em fase de testes", assinala Ana Miguel Santos, coordenadora do PSD para a área da Defesa Nacional a subscritora das perguntas enviadas ao Ministro esta sexta-feira.

O contrato assinado previa que todos estes drones, bem como um conjunto de outros equipamentos relacionados, estivessem entregues até quatro de agosto do ano passado. Tanto Cravinho, como o ministro do Ambiente, José Matos Fernandes (os drones foram financiados pelo Fundo Ambiental) surgiram em cerimónias públicas a anunciar a entrada em ação das aeronaves, mas os prazos apontados foram derrapando.

Numa delas, a 18 de julho de 2020, João Gomes Cravinho chegou a garantir que na primeira quinzena de agosto desse ano todos os 12 drones estariam operacionais.

O DN questionou o ministro da Defesa sobre se perante os sucessivos incumprimentos, pretendia tomar alguma medida, mas o seu Gabinete não respondeu.

A FAP também não diz se entende estarem reunidas as condições para uma renúncia do contrato que assinou com a empresa UAVision.

A aquisição, recorde-se, foi feita ao abrigo do regime excecional de combate à pandemia, - que isentou o contrato de visto prévio do Tribunal de Contas (TdC) - sob a justificação de que, devido à doença provocada pela covid-19 que resultaria numa "eventual menor disponibilidade de recursos humanos", seriam necessários "meios complementares que confiram eficácia para as ações inseridas nas fases de prevenção, supressão e socorro, estabelecidas no quadro de gestão integrada de fogos rurais, bem como na vigilância da orla costeira, de áreas protegidas e de pedreiras". Também sobre esta última vigilância, o previsto no contrato não tem sido cumprido.

Questionado o TdC, fonte oficial diz que, apesar de estar isento da fiscalização prévia "o Tribunal pode, a qualquer momento, decidir uma fiscalização sucessiva", embora não indique se e quando o vai fazer, apesar de tudo o que já é do domínio público sobre o tema.

Mas em relação ao enquadramento legal do contrato, Ana Miguel Santos deteta uma contradição no discurso de João Cravinho: "se a aquisição foi feita ao abrigo do regime excecionalíssimo, para situações de urgência relacionadas para a pandemia, então porque é que o Ministro tem sempre vindo a dizer que se está a edificar uma nova capacidade, para o futuro, com estes drones? Se é para o futuro, não é urgente. É claramente contraditório e levanta dúvidas sobre a legitimidade para usar o regime excecional, além do que, estes drones nada têm a ver com o combate à pandemia, como é óbvio".

Para a deputada, isto demonstra que "o governo usou abusivamente de um regime excecional para remendar uma coisa que não consegue fazer a tempo: planear".

Entretanto, por decisão do EMGFA esta sexta-feira e segundo informação divulgada pela Comando Operacional da Madeira, esta estrutura vai ceder os seus drones para apoiar as patrulhas de vigilância florestal da Marinha no no DECIR.

Nesse âmbito, também os drones Raven do Exército serão utilizados nestas missões. Para colmatar a falha dos drones, a FAP apoiará através de aeronaves tripuladas o que, de resto, estava já a fazer desde que determinou a suspensão dos voos dos drones das três bases.

Desde maio que o EMGFA, através do Comando Conjunto de Operações Militares, assumiu a coordenação deste processo. Na altura, numa apresentação feita para jornalistas, o contra-almirante Nobre de Sousa, subchefe do Estado-Maior deste Comando, explicou que a "edificação da capacidade" seria com "a celeridade possível", uma vez que só em outubro de 2022 estará concluída a formação de todas as equipas que vão operar as aeronaves.

Garantiu o CCOM que o emprego dos drones na vigilância e deteção de incêndios rurais será feito sob a coordenação da GNR e com o envolvimento da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), entidades com a competência legal para esta função, cabendo às Forças Armadas decidir que meios vão empregar na resposta aos seus pedidos.

Atualizado às 14.10 com uma correção: o IGFA funciona, como é o caso da investigação aos acidentes civis, de forma autónoma na Autoridade Aeronáutica Nacional e não como, por erro tinha sido escrito, na dependência do CEMA que é a AAN. As nossas desculpas pelo erro

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