Querido Mestrinho,. Tardámos em cruzar-nos nesta vida, mas parece que cuidámos de nos tratarmos bem..Muito bem!.Vi-o de braço no ar a lutar por democracia e liberdade, a usar a palavra como arma, a querer justiça no mundo, a abraçar causas com todo o corpo e a sua alma. Nunca me foi indiferente..Descobri-lhe a verdade e o rigor. Segui-lhe os passos e tive vontade de me cruzar na música. Retraí-me muito, achando que nunca nos iríamos entender..A sua honestidade foi desconcertante quando me respondeu ao convite para me produzir um disco. "Combinamos uma coisa: vamos TENTAR fazer um disco juntos!".Aceitei! Fizemo-lo de tal forma que acabámos rendidos à magia que aconteceu..Primeiro, porque bebi cada uma das suas palavras, as partilhas de experiências, toda a filosofia que invocou nas nossas imensas conversas e a sua paixão pela verdade absoluta das coisas..Depois porque o Zé Mário percebeu em mim a infância que não quero perder quando dos olhos me saltava a minha permanente sede de aprendizagem. Para isto contou ainda a cumplicidade que criámos no olhar..No fim de um disco que marca definitivamente a minha vida, ficou a verdade suprema das emoções, ficou uma amizade inesgotável, e gratidão a si e à minha Mestrinha Manuela de Freitas pela extrema dedicação que me ofereceram..Ouvi-lo dizer que ganhou uma filha e dois netos foi o meu maior prémio!.Saber que me reconheceu o mesmo rigor e profissionalismo que em si habita, receber os seus abraços fraternos em cada reencontro, beber o vosso café cheio de aromas, vê-lo vibrar com cada nota solta da minha voz e das guitarras, fazer parte da sua vida, são privilégios inigualáveis..Deixou-me agora sem chão, assim de repente, depois de uma tarde tão recente de mais tantas partilhas e vontades de voltarmos aos fados..A sua maior missão comigo cumpriu-se e não haverá palavra dita ou cantada em que me fujam todas as partilhas desta voz que está tão embargada..Obrigada, meu Mestrinho querido. Esta "sua menina" será sempre sua!.Katia Guerreiro*.Fadista