O Presidente da República e o Governo continuam a falar a duas vozes sobre a evolução da pandemia covid-19 em Portugal. O Governo dramatiza, Marcelo Rebelo de Sousa desdramatiza. O contraste foi esta quinta-feira notório entre, por um lado, as palavras da ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, ao apresentar as conclusões de mais uma reunião do Conselho de Ministros; e, por outro, as palavras do Chefe do Estado, comentando essas conclusões..A ministra sublinhou, por exemplo, que Portugal se encontra, neste momento, "claramente na zona vermelha" da matriz de risco, pelo que não será possível avançar para a nova fase de desconfinamento que se deveria iniciar dia 28 (e que implicaria, por exemplo, o regresso dos restaurantes aos respetivos horários pré pandemia). O país "tem níveis de incidência preocupantes e não tem condições de avançar", explicou. E, além disso, "a expectativa que temos é que nas próximas semanas os casos continuem a aumentar"..Carregando nos adjetivos, Mariana Vieira da Silva afirmou que se vive agora "um momento crítico da evolução da pandemia" em Portugal, pelo que se impõe "reafirmar a necessidade de procurarmos cumprir as regras, ser cautelosos, usar a máscara [e] evitar ajuntamentos"..A situação - enfatizou - "é mais grave" e "estamos numa luta contra o tempo entre a vacinação e a progressão da doença e isso faz com que seja necessário pedir a todos um esforço suplementar neste momento"..Segundo explicou, há ainda 720 mil pessoas com mais de 60 anos que neste momento ainda não têm a vacinação completa e há estudos que provam que a efetividade das vacinas em relação à variante Delta têm uma boa resposta na vacinação completa, mas não com a primeira dose..Portugal registou, na última semana, um aumento de 34 por cento de novos casos de infeção e o número de doentes com covid-19 em cuidados intensivos subiu 26 por cento, adiantou a ministra. .Portanto, sendo embora evidente que, no que toca à pressão sobre o SNS, o país ainda está "longe" das linhas vermelhas definidas pelo Governo, a verdade é que "temos uma situação que é complexa e que exige a atenção de todos"..Ora enquanto o Governo falava em situação "mais grave" e "complexa" e em "momento crítico" com níveis de incidência "preocupantes", o Presidente da República, reagindo às conclusões do Conselho de Ministros, usava palavras como "esperança", desaconselhando "alarmismos generalizados".."Olhando para o país há um caminho que está a ser feito, esse caminho tem autos e baixos pontuais, mas apesar de tudo também os números continuam a oferecer razões para a esperança. Temos aqui uma situação em que é preciso estar atento em alguns concelhos mas em termos globais não há razão para alarmismos generalizados", disse Marcelo Rebelo de Sousa, falando com jornalistas em Guimarães, à margem das comemorações da Batalha de S. Mamede..Apesar do recuo anunciado no desconfinamento para algumas zonas do país, Marcelo Rebelo de Sousa reforçou a mensagem de otimismo que havia dado no discurso durante a cerimónia na qual recebeu a Medalha de Honra da Cidade de Guimarães. "Eu fiz um discurso de esperança, de confiança, porque é aquilo que eu penso. É o que eu penso, que neste processo há momentos de paragem pontuais, apesar de tudo o pais não é só Lisboa, nem é só o concelho de Lisboa. Nem são só os 22 concelhos mais afetados, o país é mais amplo", afirmou..Quando às medidas anunciadas pelo Governo, considerou que há uma "procura de equilíbrio". Ou seja, o Executivo procurou "chamar a atenção, fazer um alerta mas não alarmar", enfim, "não alarmar nem radicalizar em termos restritivos" e foi "essa a ideia de equilíbrio da parte do Governo". "Diria que são medidas já esperadas, só num concelho, especificamente em Lisboa, não em concelhos vizinhos, e por outro lado são restritivas mas menos restritivas do que já foram e, por outro lado, abrindo aporta à flexibilidade para os que têm vacinação.".O Conselho de Ministros analisou o mapa pandémico do país (ver mapa ao lado) e determinou os concelhos que recuperam, o que ficam em alerta (podendo recuar na próxima semana, sendo um dos concelhos o Porto), os que ficam sujeito às medidas para as zonas de risco elevado e os que passam a situação de risco muito elevado (confirmando-se Lisboa)..Ao mesmo tempo, decidiu também que no próximo fim de semana (das 15.30 de sexta às 6.00 da manhã de segunda) será renova a proibição de entradas e saídas da Área Metropolitana de Lisboa (cujos concelhos são Almada, Amadora, Barreiro, Loures, Mafra, Moita, Montijo, Odivelas, Oeiras, Palmela, Seixal, Setúbal, Vila Franca de Xira, Lisboa, Cascais, Sintra, Sesimbra e Alcochete). Contudo, neste aspeto há uma novidade: quem tiver certificado digital de vacinação ou teste negativo (que não seja auto teste) pode entrar ou sair da AML..As medidas implicam que em 28 concelhos do continente - os que estão num nível de risco elevado ou muito elevado (ver mapa) - o teletrabalho será obrigatório..A legislação em vigor estipula que o teletrabalho é obrigatório "independentemente do vínculo laboral, sempre que as funções em causa o permitam e o trabalhador disponha de condições para as exercer, sem necessidade de acordo escrito entre o empregador e o trabalhador", mas aplicado apenas a organizações "com estabelecimento nas áreas territoriais definidas pelo governo mediante resolução do Conselho de Ministros". O regime de organização do trabalho prevê que cabe ao empregador justificar casos em que não seja possível adotar o teletrabalho, e que o trabalhador pode contestar a decisão junto da Autoridade para as Condições do Trabalho num prazo de três dias úteis..joao.p.henriques@dn.pt