O novo policial de Joël Dicker regressa ao registo do seu primeiro grande sucesso em livro, A Verdade sobre o Caso Harry Quebert. Até no título isso acontece, pois chama-se O Desaparecimento de Stephanie Mailer . Nada contra, afinal Quebert era um tesourinho para quem queria ler um policial com o cenário dos Estados Unidos e não tinha paciência para o estilo próprio dos escritores lá do sítio, como os dos james elrroy's da vida..Dicker inovou em Quebert e isso lançou o autor, mesmo que o sucesso nunca se tenha repetido de forma fulgurante nos tempos que se seguiram. Daí que estivesse na altura do autor recuperar a fórmula mágica de um livro que se tornou o melhor equívoco editorial do ano 2012 e venceu prémios impossíveis para o género policial, pois eram concedidos por instituições destinada ao género sério da literatura. Talvez porque se caracterizava aquela narrativa como indo além desse género literário, impregnado de uma certa vivência da cultura europeia transposta, mesmo que parecesse - nada contra, pelo contrário - inspirado na coleção dos melhores quadros do pintor norte-americano Edward Hopper..Com Quebert e um editor inteligente, Bernard de Fallois, o suíço Joël Dicker vendeu milhares de livros mal estes chegaram às livrarias francófonas, curiosamente poucos meses após a dupla ter lançado Os Últimos Dias do Nossos Pais, vencedor do prestigiado Prémio dos Escritores de Genebra..É na Feira do Livro de Frankfurt que tudo cresce, pois Quebert tem os direitos comprados para mais de trinta línguas. Sorte grande para os editores porque duas semanas depois Quebert recebia o Grande Prémio do Romance da Academia Francesa, e estava na short-list de prémios literários como o Goncourt e o Femina, vencendo até o Goncourt dos pequeninos (Goncourt des Lycéens). Segue-se o grande negócio da editora Penguin para o publicar nos Estados Unidos e Joël Dicker está lançado. Até passou por Lisboa duas vezes, a primeira delas para promover Quebert e a segunda O Livro dos Baltimore..Agora, oito anos após A Verdade sobre o Caso Harry Quebert, Joël Dicker regressa numa sequela de registo e de argumento com O Desaparecimento de Stephanie Mailer. Ou seja, para quem gostou do primeiro é hora de pegar no segundo, que saiu esta semana..Está tudo lá. Os capítulos curtos, com vários protagonistas, pistas que levam ao engano, acontecimentos inesperados que deixam o leitor desconcertado. Tudo isto ao longo de quase sete centenas de páginas, extensão semelhante à de Quebert, numa verdadeira maratona de leitura. Sendo que o leitor jamais estará certo do autor do crime antes de fechar o livro, porque as distrações sem fim amontoam-se de forma quase desesperante. Nada que incomode os fãs, claro..Também estão lá alguns enganos narrativos que não existiam no primeiro livro, designadamente nas duas últimas páginas em que ata as pontas soltas de um modo pouco profissional, quase lamecha, como a de um marido perdoar a infidelidade da mulher e serem ainda mais felizes e o de uma mulher que recebe a confissão de outra infidelidade, a do marido, numa longa carta e esta torna-se um best-seller quando passada a livro. Há mais alguns erros na fórmula, como alguns tempos perdidos na história e que de pouco servem ao leitor..Tudo começa no presente: uma jornalista encontra-se com um dos dois polícias que tinha investigado o assassinato de uma família na pequena estância balnear de Orphea na noite de 30 de julho de 1994. Na breve conversa informa-o de que o culpado não foi aquele que eles acusaram mas outra pessoa. Muda-se a página, e a jornalista Stephanie Mailer caminha para a morte pouco depois, deixando os dois polícias que investigaram o caso em apuros de consciência no verão de 2014..O pressuposto de partida é bom, diga-se. Joël Dicker não se poupa a reviravoltas e se o leitor não ficar preso à trama que o autor desenvolve para a primeira centena das seiscentas páginas também não terá interesse algum neste género literário. Pois as personagens estão por norma bem caracterizadas, os acontecimentos surpreendem e a ignorância mantém-se até ao final de O Desaparecimento de Stephanie Mailer..O regresso de Joël Dicker ao seu registo de sucesso faz lembrar aquela canção muita antiga de Carmem Miranda, "Disseram que voltei americanizada", mas realmente é essa a sensação perante o novo romance do autor. O cenário norte-americano está-lhe no sangue e o livro, se desejar ter sucesso, não se pode livrar deste estigma..Quanto à promoção em torno deste novo livro, o facto de se afirmar que Joël Dicker se supera, fica sempre bem. Aliás, as críticas que suportam o livro na contracapa são sempre boas. Algumas até melhores do que O Desaparecimento de Stephanie Mailer..O Desaparecimento de Stephanie Mailer.Joël Dicker.Editora Alfaguara.672 páginas.PVP 24,50 euros