Pressão de milhares de emails não evitou IVA da tauromaquia a 6%
Nos últimos dias dezenas de deputados receberam milhares de mensagens email contra a descida da IVA da tauromaquia para 6%. Uma campanha organizada e dirigida pessoalmente a todos os deputados, aproveitando as suas moradas parlamentares eletrónicas - que no entanto não evitou a aprovação das propostas apresentadas nesse sentido pelo CDS, PSD e PCP.
A votação ocorreu pelas 23h30 de ontem à noite, no decorrer de uma longuíssima maratona de votações na especialidade (artigo a artigo) dos artigos do OE 2019 e das respetivas propostas de alteração. A votação decorreu na comissão parlamentar de Orçamento e Finanças. Socialistas e bloquistas votaram contra - mas por razões diferentes: o BE por causa dos touros; o PS por causa do IVA dos espetáculos culturais.
Os socialistas também levaram a votos, autonomamente a sua proposta de IVA dos touros a 6%. Só que esta proposta também dizia que o IVA na mesma taxa para os outros espetáculos culturais em geral só se aplicaria caso estes decorressem em "recintos fixos". Por outras palavras: na prática o PS mantinha nos 23% o imposto para tudo o que são, por exemplo, os festivais musicais de verão. Porque a proposta socialista criava esta exceção, os restantes partidos votaram contra, chumbando-a. O IVA dos festivais de verão e outros espetáculos ao ar livre de localização flexível vai mesmo ficar nos 6%, como as restantes atividades culturais.
Ainda no campo do IVA, foi também reduzida para 6% (dos atuais 23%) a taxa dos livros digitais, por aprovação de propostas do PEV e do PS (o CDS tinha uma proposta idêntica mas foi retirada porque a do PEV já tinha sido aprovada). A proposta aplica-se igualmente a publicações informativas online - ou seja, aos jornais digitais.
Antes de chegarem à questão do IVA da cultura, os deputados passaram vários minutos a discutir uma proposta do PEV (partido que não tem voto nesta comissão) que propunha alterar a autorização legislativa que o governo pediu à AR para baixar o IVA dos contadores de eletricidade. O governo, no essencial, só quer pôr o IVA a 6% nos contadores de 3,45 Kva (que só dão para residências unipessoais) e o PEV pretendia que essa redução fosse até aos contadores com potência de 6,9 Kva (residências familiares).
A presidente da comissão, Teresa Leal Coelho (PSD), insurgiu-se contra a proposta do PEV com o argumento de que o Parlamento não pode "ampliar" as autorizações legislativas que o governo pede (ou seja, obrigar o Executivo a ir mais além do que pretende). Apesar dos protestos do PCP e do BE - que argumentaram que esta ampliação já aconteceu várias vezes -, Teresa Leal Coelho, apoiada pelo PS, considerou a proposta "inadmitida". Por outras palavras: não foi a votos. E o mesmo aconteceu depois a propostas idênticas do PCP e do BE.
A esquerda tinha-se unido, porém, durante a tarde, para chumbar propostas do PSD e do CDS para revogar a sobretaxa ao imposto dos combustíveis criada pela primeira vez em 2016. PS, BE, PCP, PEV estiveram contra - o que significa que esse adicional se manterá exatamente como está.
Ao mesmo tempo, os deputados aprovaram uma proposta do PCP para que crie uma majoração de 0,06 euros/litros aos subsídios que agricultores e pescadores recebem para a compra de gasóleo colorido e marcado. A medida abrangerá quem tenha um consumo anual até dois mil litros.
Os comunistas, aliás, foram obtendo durante a tarde várias vitórias, que exploraram distribuindo em tempo real aos jornalistas cópias dos artigos aprovados. Um deles, que passou por aliança do PCP+BE com a direita (PSD+CDS), trava o aumento da tributação sobre as viaturas ligeiras compradas pelas empresas - algo que no entender dos comunistas atingiria sobretudo micro, pequenas e médias e empresas. Estará em causa, na ótica governamental, uma receita de cerca estimada de cerca de 40 milhões de euros.
Já o que foi chumbado foram as propostas do PSD e do Bloco de Esquerda que iriam criar mais taxação das mais-valias imobiliárias. Os dois partidos não foram capazes de se entenderem numa proposta única (porque o PSD só queria mexer no IRS e o BE também queria ir ao IRC). Votações cruzadas chumbaram ambas as propostas.
A comissão aprovou também que as obras na ala pediátrica do Hospital de São João se façam por ajuste direto. A proposta aprovada veio do PS e foi aprovada por unanimidade. Num primeiro momento, por lapso, o PSD votou contra. Mas depois o deputado Cristóvão Crespo anunciou que tinha havido um erro - o PSD afinal queria votar a favor (vários partidos anunciaram num momento ou noutro correções dos seus sentidos de voto).
O artigo determina expressamente que as obras se possam fazer sem "fiscalização prévia do Tribunal de Contas". Na nota justificativa, os socialistas explicaram que "a obra do Centro Pediátrico do Centro Hospitalar do Hospital Universitário do São João é uma necessidade premente e urgente", sendo certo que o partido "esteve e está comprometido com esta obra". Porém, "por vicissitudes várias, e já muito debatidas", a obra "não avançou no prazo oportuno" e agora esta proposta resolve esse problema.
Antes de ser votada a proposta do PS, já tinha sido aprovada uma outra, do BE, dizendo que o conselho de administração do Centro Hospitalar de São João "fica autorizado a iniciar o processo de construção da nova ala pediátrica, ficando, por isso, autorizado à utilização das verbas necessárias e já transferidas para o efeito".
Por unanimidade, os deputados da comissão aprovaram também, na especialidade, uma proposta do PEV para que em todas as unidades do SNS seja ministrado "o medicamento que se destina a tratar a atrofia muscular espinhal, aos doentes com tipo I e com tipo II".
Na nota justificativa, os ecologistas consideraram que "cada dia que passa, sem a possibilidade de acesso ao medicamento, é mais um dia onde a situação destes doentes se agrava a olhos vistos". Portanto, "o governo deve garantir disponibilidade financeira para que esse tratamento seja assegurado, nos casos de avaliação médica nesse sentido".
Os deputados aprovaram também - com os votos contra do PS e a abstenção do CDS - uma proposta do PCP para serem acrescentadas três vacinas ao Plano Nacional de Vacinação: contra a meningite B; contra o rotavirus e contra o vírus do papiloma humano (HPV) nos rapazes (já é obrigatória para as meninas).
Hoje o plenário reunirá de manhã para votar artigos já aprovados na especialidade que os partidos desejem avocar. À tarde reunirá a comissão parlamentar para mais votações na especialidade. Para amanhã está marcada a votação final e global do OE 2019.