Telma Monteiro é sinónimo de medalhas e isso é (talvez) o melhor elogio que podem fazer à judoca do Benfica. Em 14 europeus, conquistou 14 medalhas. Nos Europeus de Judo, que decorrem em Lisboa entre sexta-feira e domingo, vai tentar ganhar a 15.ª medalha de olhos postos no sexto título. E pode até dizer-se que ela já vai entrar no tatami como vencedora, uma vez que será homenageada e receberá a Ordem de Mérito do Governo..A cerimónia de distinção à melhor judoca portuguesa de sempre e única medalhada olímpica da atualidade terá lugar no sábado e contará com a presença do Presidente da República e de membros do Governo. Está prevista a transmissão de um vídeo a ilustrar momentos altos da carreira de Telma Monteiro, de 35 anos, que foi medalha de bronze nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016..A irmã, Ana Monteiro, antiga judoca internacional já retirada, que há mais de 20 anos a convenceu a ir treinar ao Clube Construções Norte-Sul, de Almada, estará presente e se for chamada a dizer umas palavras talvez a voz saia embargada com a "emoção" e o "orgulho" que sente na irmã. Para ela, "o segredo do sucesso de Telma é ela nunca se ter contentado" com aquilo que ganhou.."Lembro-me, quando ela ganhou a primeira medalha num europeu, de dizer que queria ganhar uma medalha em cada competição que participasse e à medida que foi conseguindo não se deixou deslumbrar", contou Ana Monteiro ao DN, acreditando que a irmã vai "chegar em grande forma" aos europeus de Lisboa e "lutar por mais uma medalha"..Porque isso "está no seu ADN". É uma atleta "provida de muito talento, uma capacidade mental e física fora do normal". Além disso, é "reservada, discreta e avessa ao estatuto de figura pública". Alguém que despertou para o judo a ver filmes na companhia da irmã mais velha: "Lembro-me de estarmos sentadas no sofá a ver filmes do Van Damme e acabarmos sempre à porrada [risos].".A judoca tem conquistado medalhas em todos os Europeus que disputou. Um registo impressionante que a tornam na terceira mais medalhada de sempre a nível mundial e dona de mais de um terço (14 das 34) das medalhas que o judo português já conquistou em europeus - a primeira foi em 1994, por Justina Pinheiro. Telma tem cinco ouros - Tampere (2006), Belgrado (2007), Tbilisi (2009), Chelyabinsk (2012) Baku (2015) -, duas pratas - Istambul (2011) e Praga (2020) - e sete bronzes - Bucareste (2004), Roterdão (2005), Viena (2010), Budapeste (2013), Montpellier (2014), Telavive (2018) e Minsk (2019)..Só há dois atletas mais medalhados do que a portuguesa: alemã Barbara Classen (15) e o holandês Anton Geesink (25), mas ambos competiam em mais de uma categoria no mesmo Europeu..Além da judoca do Benfica (-57 kg) e do campeão mundial dos 100 kg, Jorge Fonseca, a seleção conta com mais 16 atletas. Catarina Costa e Maria Siderot (-48kg), Joana Diogo e Joana Ramos (-52 kg), Telma Monteiro e Wilsa Gomes (-57kg), Rodrigo Lopes, João Crisóstomo e André Diogo (-66 kg) a competirem na sexta-feira. Bárbara Timo (-70kg), João Fernando (-73kg), Anri Egutidze e Manuel Rodrigues (-81 kg) no sábado. E Patrícia Sampaio (-78 kg), Rochele Nunes (+78kg), Jorge Fonseca e Diogo Brites (-100 kg) e Vasco Rompão (+100 kg) no domingo..Repetir as quatro medalhas do Europeu de Lisboa em 2008 - o maior número de medalhas numa prova até hoje - não é fácil. Nesse ano, mesmo sem a lesionada Telma Monteiro, Portugal viu João Neto sagrar-se campeão europeu e Pedro Dias, Yahima Ramirez e a atual selecionadora, Ana Hormigo, conquistarem o bronze..Entre os 18 judocas portugueses que a partir de sexta-feira competem na Altice Arena há quatro medalhados: Telma Monteiro (14), Joana Ramos (2), Rochele Nunes (1) e Jorge Fonseca (1). Este último, o único campeão mundial do judo português (2019), quer a medalha que lhe falta, porque diz que só com títulos é feliz: "Estou ansioso. Sinto-me muito motivado, o Europeu é um título que me falta, é uma das grandes provas mundiais que ainda não consegui.".Já Rochele Nunes é a melhor portuguesa do ano, depois de ter ficado à porta do ouro nos Grand Slam de Telavive e Tbilissi. Em Lisboa quer "cantar o hino" nos +78 kg, disse a luso-brasileira, destacando o bom ambiente na seleção..Derrapagem nos custos.Os Europeus têm lugar no Altice Arena. Desta vez o espaço habituado a organizar grandes eventos como concertos e que já recebeu um Master de ténis, um Europeu de atletismo e uma Champions de futsal, recebe cerca de 400 judocas (18 portugueses) de 45 seleções europeias - a Grã Bretanha desistiu por causa da covid-19..Desde terça-feira que todos os participantes do evento, desde staff, a jornalistas, atletas e treinadores, e até o técnico de luz do pavilhão, estão na chamada bolha e em isolamento num dos vários hotéis. Assim manda o exigente protocolo de segurança. "Todos têm de fazer dois testes PCR covid-19, entre cinco dias e 48 horas antes de entrarem na bolha. A entrada na bolha é feita da seguinte forma: chegam ao hotel fazem um terceiro teste, sobem ao quarto e ficam isolados até saberem o resultado e a partir desse momento estão livres de circular na bolha. A circulação tem de ser feita sempre em transporte oficial da organização, não se pode ir a pé apesar do hotel ser a 350 metros do pavilhão nem ir de carro próprio porque é proibido todo e qualquer contacto com o exterior", explicou Catarina Rodrigues da Federação Portuguesa de Judo e da organização..Os atletas são ainda obrigados a um quarto teste PCR no dia antes da pesagem (o judo funciona por categorias de peso). Tudo isto obrigou a organização a adaptar-se e a custos avultados, uma vez que teve de concentrar todo o alojamento em três hotéis e garantir-lhes transporte e alimentação, já para não falar do custo de mais de 2500 testes à covid-19. Isto apesar da parceria com o Laboratório de Análises Clínicas da Universidade de Coimbra, que montou um mini-laboratório no Altice Arena..Os constrangimentos ligados à pandemia fizeram as contas derrapar em cerca de 100 mil euros, segundo Jorge Fonseca, presidente da Federação Portuguesa de Judo. E esse número pode aumentar uma vez que não há receitas de bilheteira e há uma diminuição ao nível dos patrocinadores. Organizar o Europeu custa 1,8 milhões de euros, sendo que a Câmara Municipal de Lisboa (1,1 milhões) e o Governo através do Instituto Português do Desporto e Juventude (500 mil euros) são os principais dinamizadores financeiros..Não ter público é desolador para a ex-judoca Catarina Rodrigues, que destaca o facto de Portugal ter seleções muito fortes e com candidatos a medalhas em todas as categorias, garantindo que, apesar de todos os constrangimentos, o Europeu "nunca esteve em risco" e a federação investiu no sucesso desportivo mesmo em pandemia..As seleções fizeram vários estágios em Coimbra e todos os atletas continuaram a treinar apesar do confinamente, ao contrário do que aconteceu com outros desportos e federações. Daí que haja grande expectativa para estes europeus..O adiamento dos Jogos Olímpicos de agosto de 2020 para 2021 deu outra importância ao Europeu de Lisboa, que assim pontua para o ranking mundial. Com o apuramento ainda em aberto, os pontos conquistados podem garantir a presença em Tóquio a muitos atletas. E para outros será mesmo a garantia de se apurarem entre os oito primeiros do ranking mundial, posição que faz deles cabeças de série e lhes permite evitar os mais fortes e saber quem poderão ser os adversários no primeiro combate olímpico, uma vantagem importante..Talvez por já terem ranking para ir a Tóquio no verão, nove campeões europeus abdicaram de viajar até Lisboa. Casos dos franceses Shirine Boukli, Clarisse Agbegnenou, Madeleine Malonga ou Romane Dicko. Opção idêntica teve a húngara Hedvig Karakas, com quem Telma Monteiro perdeu na final de Praga, os russos Robert Mshvidobadze e Tamerlan Bashaev , o moldavo Victor Sterpu e o georgiano Tato Grigalashvili..isaura.almeida@dn.pt