"Até varrer o chão da sala onde se vai ensaiar é importante. Prepara-se o sítio onde se vai trabalhar"
O movimento súbito da cortina em direção à plateia é um dos sobressaltos do Macbeth de Nuno Carinhas, até ao dia 22 no Teatro Nacional de S. João (TNSJ), no Porto. A lentidão do início, no despertar das Três Moiras, contrasta com uma quase vertigem, porque as cenas sucedem-se com enorme rapidez. O texto corre como mel, na nova tradução de Shakespeare feita pelo poeta Daniel Jonas: violento e poético, aflitivo quase sempre e divertido por momentos. Dois livros essenciais acompanham a peça: a nova tradução e o Manual de Leitura, com textos que ajudam a refletir e a compreender. O diretor artístico do TNSJ, nascido em Lisboa em 1954, conta como foi da pintura para o teatro.
É a primeira vez que Shakespeare aparece no seu percurso?
Sim, como encenador. Já fiz outros enquanto cenógrafo e figurinista. Acho que é um acidente. Há tantos autores para fazer pelos quais nunca passámos que este é mais um. É só porque ele tem este lado paterno do teatro universal que parece mal dizer que é a primeira vez que se encena. Mas eu comecei a encenar muito tarde, portanto não é de espantar.
Tirou o curso de Pintura na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, como se chamava na altura. Foi para o teatro como ator amador e depois foi lá parar pela pintura?
Na Escola de Belas Artes tive um professor, Justino Alves, que arranjou maneira de irmos partilhar um espetáculo do Ballet Gulbenkian. Essa experiência da cenografia antes de o ser, porque éramos estudantes, foi muito importante porque pudemos estar perto. O teatro e a dança fugiram a par em determinada altura. Mas creio que as duas andaram sempre juntas.
Na sua vida ou em geral?
Na minha vida, porque eu lia teatro muito cedo e imaginava aquelas situações, aquelas personagens, a maneira como estariam vestidas, o ambiente em que se movimentavam. Para quem tem uma memória visual forte, isso é uma condição para se poder inventar ambientes e personagens e partir para a construção. Sempre me fascinou a construção, como acho que fascina qualquer criança. O chamado making off do teatro é fascinante porque se está a assistir à feitura real de determinadas coisas, seja a construção da memória das personagens através dos textos, seja a feitura de projetores, seja o que for, a pintura do palco, ou mesmo varrer o chão de uma sala onde depois se vai ensaiar, que é uma coisa importante.
Porquê?
Porque limpa-se o lugar onde se está, porque se prepara o sítio onde se vai trabalhar. É inimaginável que alguém trabalhe num laboratório sujo e nas artes é mais ou menos a mesma coisa. Se bem que possa haver grandes acumulações nos ateliês dos pintores, há de haver um dia em que tudo é reordenado. A limpeza pode querer dizer várias coisas, uma delas é uma ordem pessoal e essa ordem é absolutamente indispensável para que depois se volte a organizar as coisas necessárias. Essa vivência das coisas primordiais para que se possa trabalhar e dar construção aos espetáculos foi uma coisa que vivi desde muito cedo e que me fascinou em absoluto. A fase da pintura é mais introspetiva. De qualquer maneira, sou uma criatura mais dada à intimidade e portanto não é difícil pensar em mim muitas horas seguidas fechado em qualquer sitio a pensar alguma coisa. E houve uma fase em que com certeza isso pesou mais.
Deixou a pintura?
Não, ela é que me deixou. São atitudes muito diferentes e é preciso um tempo diferente de fabricação para estar e o teatro ocupa a cabeça 24 horas por dia quando se está a pensar nele.
Entrou no teatro pela cenografia e pelos figurinos?
Muito pelo texto. Ler teatro começou a ser muito cedo uma atividade. O meu pai tinha uma biblioteca de teatro muito boa e eu passei praticamente da banda desenhada para a leitura de peças de teatro, uma coisa que recomendo.
Porquê?
Porque é uma leitura acompanhada. A leitura de diálogos é sempre fascinante. Para algumas pessoas, é cansativa a descrição. Eu sou grande leitor de romances - entretanto tornei-me - mas pode ser cansativo estar a especular sobre uma situação, sobre uma personagem. Nos diálogos há um sobressalto, começam as personagens a falar umas com as outras. O teatro é permanentemente diálogo, para além de algumas didascálias que podem aparecer pelo meio. É muito mais vivo do que estar a ler descrições.
Há muitos textos de teatro publicados em Portugal nos últimos anos.
Sim, felizmente.
Não era difícil conseguir muitas das obras que hoje estão publicadas?
Antes do 25 de Abril existiam. Provavelmente por causa da censura, o teatro era uma arte mais ou menos militante e resistente. Havia sempre autores contemporâneos muito fortes que não eram passíveis de ser mostrados em Portugal. Mas editava-se muito teatro, às vezes em traduções em segunda mão, não diretamente do original, feitas a partir do francês ou do inglês.
Sim, por exemplo os russos não eram traduzidos diretamente.
Com certeza que não e agora sim, temos esse enormíssimo privilégio. Depois do 25 de Abril foi um ramo da literatura que se perdeu mas que depois se acrescentou bastante dado que a dramaturgia nacional também começou a desenvolver-se.
Esta tradução do Macbeth foi encomendada pelo TNSJ ao grande poeta e grande tradutor Daniel Jonas. É uma tradução de uma qualidade extraordinária. Por que sentiu necessidade de encomendá-la?
É missão de um teatro nacional renovar as traduções. Mesmo quando estamos a tratar dramaturgos estrangeiros, estamos a falar em português, sempre. É o grande privilégio deste lado patrimonial do teatro, fazer avançar - ou recuar - a língua, fazer agitar a língua de uma forma muito viva. E é sempre muito bom quando se pode ter o tradutor connosco nas primeiras discussões que se tem sobre um texto, um texto difícil como é o Macbeth ou os textos clássicos. Tive sempre muito boas experiências com a tradução. Lembro-me de que foi sempre uma preocupação do TNSJ desde que o Ricardo Pais tomou a direção do teatro. O segundo espetáculo produzido na casa foi O Grande Teatro do Mundo [Calderón de la Barca] que eu encenei. Foi convidado o José Bento e foi uma tradução felicíssima. Um ano ou dois a seguir encenei A Ilusão Cómica [Corneille], a tradução foi encomendada ao Nuno Júdice e era brilhante. São traduções inspiradas, porque pode ser-se bom tradutor e não se estar inspirado no momento em que se traduz. Tenho tido a sorte de ter tradutores muito inspirados e no caso do Daniel Jonas, mais uma vez.
Torna a peça muito mais acessível, no sentido em que não estamos com a preocupação de tentar perceber o texto, estamos imersos no texto. É uma tradução muito atual e tecnicamente deve ter sido muito difícil, o ritmo é extraordinário.
O Daniel conseguiu que a tradução fosse muito económica, em poucas palavras. Às vezes em português é difícil porque temos de convocar muitas palavras e o Daniel, ao querer respeitar uma determinada métrica, conseguiu fazê-la com muito poucas palavras. Não é uma tradução hermética, é acessível sem descaracterizar a dificuldade. Há uma coisa importante e que é um dos paradoxos da peça, é que Macbeth é um poeta. Quando pensa em voz alta, pensa de uma forma elaborada, está sempre a falar da natureza, dos animais, faz muitas comparações. É muito interessante ser um poeta a traduzir outro poeta. Esta encenação foi feita sob os auspícios de dois poetas.
Como escolheu os atores?
São atores que conheço razoavelmente bem, com quem já trabalhei em circunstâncias diversas. Para mim era importante ter um ator que fosse de alguma maneira íntimo do Shakespeare, e quem fez o Hamlet tem essa intimidade, para além de outras peças que o João Reis fez, nomeadamente O Mercador de Veneza que esteve em Almada há uns anos com uma encenação do Ricardo Pais. Podendo, era ótimo ter o João Reis e tê-lo num regresso ao TNSJ, ao Porto, onde ele esteve praticamente uma década, se não mais, com papeis notáveis. Cresceu, desenvolveu-se, formou-se enquanto ator e apeteceu-me vê-lo regressar a mais um herói shakespeariano. Talvez bem contrário a ele próprio - aliás, é difícil encontrar um facínora que seja ator.
Um deste gabarito seria difícil, sim, felizmente. Ele consegue ser intenso sem ser excessivo.
E até piegas a certa altura, depois de matar o Rei tem uma fragilidade muito grande que não chega a ser ridícula, é patética quase, aquela fragilidade imensa perante a imagem do sangue. Se imaginarmos que um guerreiro profissional tem um rebate de consciência porque o sangue de alguém se lhe verteu nas mãos... mas aqui esse alguém tem rosto e os outros, no campo de batalha, provavelmente não têm. Aliás, o sangue do Rei é uma coisa poderosa depois para Lady Macbeth que não se consegue desfazer dele.
A Emília Silvestre também é uma escolha intencional? É uma ótima Lady Macbeth.
É uma atriz com quem gosto muito de trabalhar, fizemos Ah, Os Dias Felizes do Beckett, o mais recente foi esse. Já temos um currículo de cumplicidade grande.
Podemos falar também dos outros.
Um elenco muitíssimo disponível. Foi muito interessante podermos ter, e isto é o privilégio de estar no Porto - para os atores não é sempre um privilégio, aliás é uma coisa má - elencos disponíveis na sala de ensaios durante seis horas seguidas, todos os dias.
É muito económica a escolha dos atores, são só dez. Esta peça pode ser representada por muitos mais.
O dobro. Não havia dinheiro para tanto, sejamos sinceros.
E há os cenários e os figurinos que são seus. Estava na plateia no meio de estudantes e quando as cortinas começam a mexer-se ouvi "que bonito, que lindo". É de uma força aquele movimento das cortinas! Já tinha utilizado esta ideia?
Uma cortina que se movimenta no sentido da plateia, não. Foi um movimento que me apareceu neste espetáculo. Já tinha trabalhado com cortinas mas não neste movimento. Precisava de algum material e de algum mecanismo que me fechasse e abrisse o espaço como uma espécie de espaço mental de Macbeth. E consegue-se neste espetáculo de uma forma muito artesanal, inclusivamente são movimentadas à mão por maquinistas, nem sequer é um sistema elétrico, é um sistema manual. De vez em quando, quando se ousa ainda estas coisas, é o fascínio do teatro, esta artesania.
Há uma coisa curiosa na peça que é a mistura de quase picaresco, há umas referências sexuais divertidas que cortam um pouco a tragédia em que estamos e põem a sala a rir.
Nomeadamente na personagem do porteiro. Ele aparece no meio dos espetadores, passa por um espaço que é o nosso e que é diferente do que nós estamos habituados. E é um ator muito forte, o João Cardoso - também um velho cúmplice - que nos dá de uma forma muito vibrante, com aquele vozeirão que tem e uma intencionalidade muito grande, e aquela forma picaresca de estar... Primeiro assusta um bocado a presença dele na plateia, mas quando passa para o palco tem esse lado da quase anedota sexual e do álcool. É uma cena que antecede, ou é simultânea, à desgraça da peça, a morte do Rei. Mas o Shakespeare é um mestre nesse aspeto, e é preciso, no meio de tanta desgraça, haver um momento de descompressão ou que nos faça pensar de outra maneira. Essa impotência que é falada pelo porteiro corresponde a alguma coisa que de maneira bastante mais dramática é tratada na peça, as alusões de Lady Macbeth ao próprio Macbeth. Quantas vezes na peça se fala do que é ser homem, "és homem", "primeiro tens de sentir à homem", "quem faz mais homem não é". Há uma série de alusões ao estatuto do homem em confronto com o estatuto feminino, bastante misógino, que nesta peça vem ao de cima sistematicamente.
Logo no início há a sensação de que ela é "mais homem" do que ele.
Ela pede para se desfazer do seu sexo, não necessariamente para se travestizar de homem, mas para tirar dela tudo aquilo que pode adocicar a força e a maldade, há ali a evocação da maldade.
Disse que foi encenador muito tarde, mas o tempo é uma coisa relativa...
É muito relativa, só em Macbeth é que não é relativo, porque ele toma conta do tempo e abrevia-o. Mas eu sou de esperas, espero o tempo que for preciso.
É diretor artístico do TNSJ, com uma programação para este ano. O que destaca?
Temos a vinda do Teatro Praga com Despertar da Primavera [de Frank Wedekind], do qual o TNSJ é coprodutor [de 13 a 16 de julho] e também uma estreia, O Homem da Guitarra, de Jon Fosse, com o Manuel Wiborg, no Teatro Carlos Alberto [de 6 a 16 de julho]. No Carlos Alberto temos agora [de 15 a 18 de junho] o João Brites com o Inferno de Dante, do qual somos coprodutores também, com o TNDMII e O Bando. E um espetáculo do Giacomo Scalisi, que se chama Pasta e Basta, um Mambo Italiano [texto de Afonso Cruz, de 15 a 18 de junho], em que se fabrica e se come pasta italiana em cena, no Mosteiro de São Bento da Vitória. Estes dois passam-se no âmbito do FITEI, o festival de expressão ibérica, doqual o Macbeth também faz parte.
Falou do Teatro Carlos Alberto e do Mosteiro de São Bento da Vitória, os outros dois polos do TNSJ. É difícil coordenar estes espaços ou até completa o trabalho do TNSJ?
É muito agradável porque são espaços com características completamente diferentes. O lado neoclássico do TNSJ, de teatro à italiana, é uma das salas com uma escala mais interessante e bem resolvido do ponto de vista arquitetónico. Os atores sentem-se muito abraçados e nós sentimo-nos sempre muito próximos do palco. O Teatro Carlos Alberto teve uma renovação muito recente e o Mosteiro de São Bento da Vitória é um espaço clássico, com arcadas, com um pé direito imenso, onde agora temos uma exposição permanente sobre cenografia e figurinos do Teatro de São João, o património do teatro, que é visitável. Programar esses três espaços quer dizer pôr os espetáculos no melhor sítio possível, no sítio que é mais propício. Não há qualquer tipo de preconceito em relação a estrear aqui ou ali. Aliás, eu pensei a certa altura estrear o Macbeth no Teatro Carlos Alberto, depois essa ideia não foi para a frente, mas havia essa possibilidade.
Estão a preparar tudo para o próximo ano?
Estamos programados até ao fim de 2018, porque é inevitável, mesmo que não saibamos qual é o nosso orçamento - e isso quase todos os anos acontece, só sabemos o que nos cabe depois da aprovação do Orçamento de Estado. Temos que avançar com compromissos. Nestes anos difíceis que passámos todos chegávamos a um momento em que se percebia que não havia dinheiro e cortava-se na produção própria da casa, porque me custava muito não respeitar os compromissos que tinha assumido com os colegas, os parceiros.
Vai continuar a fazer encenações, tendo a programação de três salas?
Tenho uma boa equipa, tanto administrativa como as outras que estão à volta, o que me poupa bastante quando estou a encenar. Aliviam-me, embora eu descure um pouco o trabalho de responder a emails, que não é só responder a emails, porque a responder resolve-se problemas. Essas coisas às vezes têm de esperar mais tempo. Mas o ritmo hoje, em qualquer coisa que se faça, está alterado, temos de nos adaptar a isso. Eu não sou muito tecnológico, tenho alguma dificuldade em conciliar os livros e as palavras impressas manuseáveis num sistema eletrónico, ou substituir uma coisa por outra. Portanto, isso sofre. Mas o dia-a-dia do teatro é assegurado por mais de 80 pessoas, e é desejável que se faça produções próprias, é por isso que existe um diretor artístico convidado, para imprimir a sua própria identidade, a sua maneira de fazer.
Fizeram dois livros para esta peça. Um é a tradução do Macbeth pelo Daniel Jonas e o outro documento precioso é o Manual de Leitura. O que é?
É o que normalmente se chama programa. É uma resenha de textos encomendados, na maioria, No caso do Macbeth são pessoas da literatura que se dedicam diretamente ao estudo de Shakespeare e à literatura inglesa, como um texto de uma leitura psicanalítica, ou outras leituras encomendadas a outras pessoas que podem contribuir para novas leituras. Muitas são mesmo novas porque são pessoas que nunca foram convocadas para responder a esse desafio, e dá resultados muito interessantes porque são leituras atuais.
Aconselha que as pessoas peguem no Manual de Leitura antes ou depois de ver a peça? Porque tenho a ideia de que se uma pessoa o lê depois vai querer ver a peça outra vez.
Mas isso é bom, acho que não é de mais ver-se uma peça duas vezes. O Manuel de Leitura é entregue aos espetadores no ato de se sentarem na sala ou quando saem do espetáculo, portanto será difícil ter antes acesso. É uma memória, um memorando do que se passou, porque tem fotografias do making off e do espetáculo, É uma memória desse acontecimento de ir ao teatro. E é completamente grátis, é serviço público.
Fazem este documento para todas as peças?
Para tudo o que é produção da casa.
Por que é que o teatro está cheio, esgotado?
Está assim desde a estreia. O Shakespeare é um autor popular, quer queiramos quer não.
Já era quando ele próprio existiu.
Exatamente. Quando nos perguntamos o que é isso do património, aqui temos um exemplo. E é um património universal, e não será por causa do brexit que deixa de ser. Há coisas que são culturalmente transversais, essa é uma das razões. Houve uma campanha bem feita que chamou a atenção para a peça, há em muitos pontos da cidade referências ao Macbeth. A imagem que preside a essa motivação é o João Reis que é um ator bastante popular neste momento. E o próprio nome Macbeth, mesmo que as pessoas ainda não saibam exatamente como é a história, é daquelas coisas que ficam.
E há um público de teatro?
Há público de teatro, sim. Há uma vontade grande de ver os atores ao vivo, mesmo nas pessoas que consomem muita televisão, há uma onda à volta da representação que às vezes pode não ser um conceito correto, achamos nós, mas que atrai a atenção para os atores. No Teatro São João há um público jovem numerosíssimo e professores que desenvolvem trabalho muito intenso. Nós temos um grupo, a que chamamos embaixadores, que estiveram no ensaio geral: 60 professores.
Do ensino secundário?
Sim. São pessoas que podem preparar os seus alunos, e preparam com gosto, para que possam falar dos assuntos antes e isso é importantíssimo. Todo o ano temos público. Houve um sobressalto nestes quatro ou cinco anos últimos, de crise, em que vimos as salas esvaziarem-se desse público. Para mim a questão mais inquietante foi essa, porque estava a ver que havia gerações a ser depredadas dessa mais-valia que poderia ser o teatro nas vidas deles. Sei que para muitos esta a primeira vez que vão ao teatro na vida deles. Nós não temos uma atitude paternalista em relação a essas pessoas, nem porque são jovens e não pensam, como se costuma dizer, ou são ignorantes
Ou "no nosso tempo é que era bom"?
Não há nada disso. Se um espetáculo é bom, pode ser visto por crianças, adolescentes, adultos, famílias, porque há uma convocação dos sentidos que é fundamental no teatro. Há sobressaltos, porque os sentidos foram despertos, e depois logo se vê se continua a ir ou não, se não gostou, se quer repetir.
Tem alguma ideia se regressam?
Regressam.
E levam os pais depois?
Isso não sei, mas creio que sim. Em fenómenos de casas cheias, tenho a certeza que sim.
O teatro acabou por ser a sua vida e não a pintura, Isso foi bom? É bom?
É bom porque o teatro obriga-nos a estar despertos para todas as realidades. Uma peça como o Macbeth perpassa por tantos assuntos, há tantas coisas em jogo. O teatro convoca-nos desde a geografia até à psicanálise, passando pela física e pela matemática até à língua. Faz-nos aceitar que a língua é o grande objeto de troca da convivialidade e do tratamento do mundo.