Arquitetos franceses Lacaton & Vassal vencem o Prémio Pritzker

Anne Lacaton e Jean-Philippe Vassal são os vencedores da edição de 2021 do galardão atribuído anualmente pela fundação norte-americana Hyatt. Juntam-se a uma galeria de premiados que inclui os portugueses Álvaro Siza e Eduardo Souto de Moura.
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A dupla de arquitetos franceses Anne Lacaton e Jean-Philippe Vassal são os vencedores da edição de 2021 do prémio Pritzker de arquitetura, atribuído anualmente pela Fundação Hyatt, anunciou esta terça-feira o seu presidente, Tom Pritzker.

"A boa arquitetura é aberta - aberta à vida, aberta a aumentar a liberdade de todos, onde qualquer um possa fazer o que precisa", diz Anne Lacaton. "Não devia ser demonstrativa ou impositiva, mas deve ser qualquer coisa familiar, útil e bela, com a capacidade de silenciosamente apoiar a vida que se desenrola no seu seio".

"Através do seu design de habitação privada e social e instituições académicas, espaços públicos e desenvolvimento urbano. Lacaton e Vassal reexaminam a sustentabilidade na sua reverência pelas estruturas pré-existentes, concebendo projetos fazendo primeiro um inventário do que já existe", diz em comunicado a Fundação Hyatt.

"Não apenas definiram uma abordagem arquitetónica que renova o legado do modernismo, mas propuseram uma definição ajustada da própria profissão da arquitetura. As esperanças e sonhos modernistas para melhorar a vida de muitos são reforçadas através do seu trabalho que responde a emergências climáticas e ecológicas do nosso tempo, assim como a urgências sociais, particularmente no diz respeito à habitação urbana", refere o júri do prémio, citado em comunicado. "Conseguiram-no através de um poderoso sentido de espaço e materiais que cria arquitetura tão forte nas formas como nas convicções, tão transparente na sua estética como na sua ética", acrescenta a nota do júri, liderado pelo arquiteto Alejandro Aravena, distinguido em 2016 com este prémio, considerado o mais importante da arquitetura.

O grupo de jurados também integrava o diplomata brasileiro André Aranha Lago, o professor de História da Arte Barry Bergdoll, a arquiteta Deborah Berke, o jurista Stephen Breyer e a arquiteta Kazuyo Sejima, a arquiteta Benedetta Tagliabue, o professor e arquiteto Wang Shu, a diretora executiva do galardão, Martha Thorne, e a curadora Manuela Lucá-Dazio.

Sobre a escolha, acrescentou ainda Alejandro Aravena: "Este ano, mais do que nunca, sentimos que fazemos parte da Humanidade como um todo. Seja por questões de saúde, políticas ou sociais, há uma necessidade de construir um sentido do coletivo. Como em qualquer sistema conectado, ser justo para com o ambiente, para com a Humanidade, é ser justo para com a geração que se segue". O júri elogiou ainda a "abordagem radical e delicada, ao mesmo tempo corajosa e subtil, equilibrada e respeitosa, mas simples e direta para com o meio construído".

Distinguidos em 2019 com o prémio europeu Mies van der Rohe e, em 2016, com o prémio Carreira da Trienal de Arquitetura de Lisboa, Lacaton & Vassal estabeleceram-se em 1987, em Paris, e já completaram mais de 30 projetos na Europa e África Ocidental.

Entre os trabalhos assinados pela dupla estão a Escola Nacional Superior de Arquitetura de Nantes (França 2009), a Casa Cap Ferret (Cap Ferret, França 1998), 14 casas sociais para a Cité Manifeste (Mulhouse, França 2005), Polo Universitário de Ciências de Gestão (Bordéus, França 2008), bloco de apartamentos em Saint-Nazaire (França, 2011), o teatro multiusos em Lille (França, 2013), as residências para estudantes de Ourcq-Jaurès (Paris, 2013) e o edifício residencial e de escritórios Chêne-Bourg (Genebra, Suíça, 2020).

Anne Lacaton, nascida em 1955, em Saint-Pardoux, em França, e Jean-Philippe Vassal, nascido em 1954, em Casablanca, Marrocos, projetam espaços habitacionais com bastante luz natural, jardins de inverno e varandas de baixo custo, que dão aos residentes acesso à natureza durante todas as estações do ano, refere a Lusa.

As intervenções mais recentes foram no Palácio de Tóquio (Paris, França 2012), aumentando o museu para mais 20 mil metros quadrados, um tipo de trabalho que gostam de realizar para evitar demolições, gastos desnecessários em material e energia, e também de destruição de edifícios históricos, que consideram "atos violentos" no edificado.

Lacaton & Vassal são o 49.º e 50.º laureados e juntam-se a um grupo que inclui dois portugueses - Álvaro Siza (1992) e Eduardo Souto de Moura (2011) - e os compatriotas Jean Nouvel (2008) e Christian de Portzamparc (1994). Há um ano, o Prémio Pritzker foi atribuído às arquitetas irlandesas Yvonne Farrell e Shelley McNamara, cofundadoras do escritório Grafton Architects, primeira dupla feminina a conquistar o galardão.

A dupla esteve em Portugal em 2016 no âmbito da conferência da organização Docomomo - Documentação e Conservação do Movimento Moderno, que visa proteger o legado modernista no mundo.

A professora e arquitetura Ana Tostões, que então presidia à Docomomo afirma ao DN que a distinção "já tardava". "Eles foram pioneiros no reabilitar e reutilizar", diz. "Têm um olhar diferente, sendo muito criativos. É o reconhecimento de um trabalho que se faz sobre outro trabalho que já existe e que pode ser reconhecido como excecional. É transformar uma habitação sombria em algo glorioso", completa.

"É o modo de pensar e de ver a arquitetura que é revolucionário", defende Ana Tostões. A marca mais evidente desse trabalho da dupla Lacaton & Vassal vê-se por exemplo na forma como foram tratando complexos de habitação social que, em lugar de demolidos, foram intervencionados e ganharam espaço e relação com o exterior.

O arquiteto João Carrilho da Graça recordou, em entrevista ao DN, um episódio do percurso profissional da dupla premiada num congresso, em Pamplona, quando Jean-Philippe Vassal mostrou um trabalho: "Ele e a mulher foram convidados para fazer o arranjo de uma praça, o que é um programa comum em arquitetura. Foram ver e gostaram da praça. Falaram com as pessoas e acharam que, grosso modo, estava tudo bem - havia só um problema de limpeza - e que era mais interessante manter o que lá estava. Disseram ao presidente da câmara: 'A nossa proposta é que a praça fique como está. Por favor, pague-nos os honorários'". E concluía: "Gosto imenso desta história."

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