Adam Driver, Michael Mann e Patrick Dempsey na estreia mundial do filme no Festival de Veneza, em agosto.
Adam Driver, Michael Mann e Patrick Dempsey na estreia mundial do filme no Festival de Veneza, em agosto.

Michael Mann. Entre a velocidade de Ferrari e a luz de Caravaggio

Primeiro grande acontecimento cinematográfico do ano: Ferrari, de Michael Mann, com Adam Driver como Enzo Ferrari em 1957, o ano em que a sua scuderia se tornou lendária. Nos cinemas esta quinta-feira. Em exclusivo nacional, o DN esteve à conversa com o realizador e a estrela durante o Festival de Veneza.
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Estamos no verão de 1957: o ex-corredor Enzo Ferrari está em crise. A morte do filho está ainda presente e a vida amorosa é uma aventura stressante: tem uma amante e um filho bastardo que sustenta à saída de Modena. À medida que o tempo passa, Enzo tem ainda de gerir o descalabro financeiro da sua scuderia. Resta-lhe optar por uma aliança com uma Fiat ou procurar parceiros internacionais, como a Ford, mas o seu instinto diz-lhe para apostar antes em pilotos e nas competições motorizadas. E é por isso que investe num novo piloto para vencer a mais prestigiada corrida em Itália: a perigosa Mille Miglia. É neste entroncamento de destino que se passa o novo épico de Michael Mann, Ferrari, filme feito sem o dinheiro dos grandes estúdios de Hollywood e que demorou 30 anos a chegar aos cinemas.

Longe de estar ao nível de um Heat - Cidade sob Pressão ou de O Informador, não deixa de ser um objeto fascinante, algo mais ambiental do que narrativo, Ferrari exibe uma liberdade formal de um realizador que a aproveita sem limitações, construindo um filme sem os rodriguinhos do biopic mais convencional e no qual se funde o pessoal e o público. Um Ferrari em toda a sua mitificação perfeita e com os efeitos exaltantes da velocidade no grande ecrã. Uma velocidade verdadeiramente furiosa.

Em Veneza, o veterano Michael Mann enfrenta a imprensa selecionada com notórios problemas de audição mas é um cavalheiro no trato. Uma lenda viva sem vaidades que nos começa por dizer que nunca pensou na palavra pressão por apresentar este filme em Itália: “acima de tudo, foi importante rodar esta história aqui em Itália. Não seria possível usar por exemplo a Hungria a fingir de Modena... E a nossa ambição foi mesmo rodar no local onde Ferrari viveu. Por exemplo, aquele é realmente o barbeiro que frequentava. Usámos o filho do barbeiro dele! E estar naqueles lugares é sentir uma voz a falar connosco...É algo que bate aos atores. O Adam via o que o Enzo via quando acordava de manhã. Além disso, estávamos ao lado de pessoas que o conheceram, como o médico da sua mulher Laura, um idoso que nos falou da relação deles. Foi também fulcral estar no quarto dela e ver aquele papel de parede louco que depois nós copiámos. Filmar nos locais verdadeiros foi uma fonte de histórias. Enfim, que coisa tão boa filmar lá...”.

Tudo indica que Ferrari seja um dos filmes que fique de fora das principais nomeações aos Óscares, mesmo apesar na Neon estar ainda a tentar encaixar Penelope Cruz na categoria das atrizes secundárias.


Se é notório que neste filme há um fascínio pelas máquinas, pela adrenalina dos motores, o realizador não esconde o seu amor pelos carros, mas lembra: “tenho outros fascínios mas não vou começar a fazer filmes sobre tudo isso... Só quero fazer filmes quando há uma boa história. Se quer que lhe diga, sou fascinado pela História da Rússia a partir de 1905 e não é por isso que me vou pôr a filmar. Mas a verdade é que sou um adepto do movimento. Aos 12, 13 anos estava sempre a sonhar voar, mas depois acabei obcecado com bicicletas de corridas e motorizadas. Claro que gosto de velocidade, mas não foi por isso que fiz este filme. Há filmes que são feitos apenas com esse fascínio e, em geral, não resultam. É preciso que haja uma grande história. Não acredito que um relato de um Grand Prix ou uma corrida de Le Mans possa originar um bom drama. Para Ferrari não me inspirei em nenhum filme sobre corridas, a minha referência foi a luz de Caravaggio. Nas cenas de diálogos quis uma direção de arte muito monocromática e usei planos muito estáticos para depois haver contrastes nas cenas das corridas onde apostei mais em planos de câmara à mão, muita agitação e uma abundância de vermelhos”.

Quando a sua publicista diz que não há mais tempo, Michael Mann deixa uma boa confirmação: Heat 2 vai acontecer: o argumento está a ser escrito a partir do seu livro e terá Adam Driver como protagonista: “quero fazer muito esse filme. Heat é uma marca, uma marca muito importante para a Warner Brothers. Há 20 anos que não sai do top 20 do catálogo deles. Quando eu e a Meg Gardiner escrevemos o livro percebemos que havia uma loucura em seu redor, ficou logo um bestseller! Voou das prateleiras”.

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