Ursula von der Leyen reconhece que até têm visões muito diferentes em questões como os direitos das pessoas LGBTQIA+, mas garante que trabalha “muito bem” com Giorgia Meloni, que descreve como “pró-europeia”. Marine Le Pen é mais direta e deixa o convite à primeira-ministra italiana: “Penso que estamos de acordo nas questões essenciais (...) É a hora de nos unirmos, seria muito útil”, disse a líder do Rassemblement National (RN) ao Corriere della Sera. Viktor Orbán, por seu lado, lembra que, apesar das dificuldades iniciais, quando muitos chamavam “extremista” à líder dos Irmãos de Itália, hoje “todos respeitam o seu Governo de direita, baseado em valores cristãos, favorável à democracia e que luta pelos valores europeus”. E garante: “O futuro do campo soberanista na Europa, assim como da direita, em geral, está hoje nas mãos de duas mulheres” - Meloni e Le Pen, que, “se conseguirem trabalhar em conjunto, num único grupo ou numa coligação, serão uma força para a Europa.”.Ora se a alemã Von der Leyen, que procura um segundo mandato como presidente da Comissão Europeia, sendo candidata pelo Partido Popular Europeu, parece decidida a ignorar as críticas - e foram muitas as que ouviu no recente debate dos spitzenkandidaten, em que traçou os três critérios a que um partido tem de obedecer para aceitar trabalhar com ele: “Ser pró-Europa, pró-Ucrânia (ou seja, anti-Putin) e pró-Estado de Direito” - e estender a mão a Meloni para uma união futura, tem concorrência à altura. Para a francesa Le Pen como para o húngaro Orbán o objetivo é claro: procurar unir as forças de extrema-direita, tornando-as na segunda força no Parlamento Europeu..Neste momento, a extrema-direita divide-se em dois grupos políticos: os Conservadores e Reformistas Europeus (ECR), onde os Irmãos de Itália de Meloni ganharam lugar de destaque, mas onde encontramos também, por exemplo, o Partido da Lei e da Justiça da Polónia, e o Identidade e Democracia (ID), que inclui o RN de Le Pen, mas também a Liga de Matteo Salvini, o Partido pela Liberdade de Geert Wilders e onde o Chega de André Ventura também se insere. De fora do ID, ficou há dias a Alternativa para a Alemanha (AfD), expulsa após as declarações polémicas do seu cabeça de lista sobre as SS. Quem também não pertence a nenhum destes grupos é o Fidesz do primeiro-ministro Orbán, cujos eurodeputados surgem como “Não Inscritos” desde que saíram do PPE em 2021, depois de este ter mudado as regras para os poder expulsar..A pouco mais de uma semana das Eleições Europeias - alguns países começam a votar já no dia 6, Portugal só o faz no dia 9 - ou as sondagens estão muito enganadas, ou vamos mesmo assistir a uma subida em força da direita radical no Parlamento Europeu. A última Sondagem das Sondagens do Politico, por exemplo, prevê 170 lugares para o PPE, com a soma de ECR e ID a chegar aos 144, mais dois do que os Socialistas e Democratas. Mas se a estes somarmos ainda 16 da AfD, 10 do Fidesz, cinco do francês Reconquista, seis do polaco Konfederacja e três do búlgaro Revival, a direita radical chega a uns impressionantes 184 - à frente, possivelmente, mesmo do PPE. Claro que não é credível que toda esta gente se vá entender para formar um grupo político com 184 eurodeputados. Mas, no mínimo, podem ser uma força de bloqueio dentro da própria UE..Neste momento, a maior dúvida parece ser para que lado vai Meloni pender. “Meloni vê-se com duas mãos estendidas (...), uma de Le Pen, outra de Von der Leyen. Meloni só poderá aceitar uma delas”, lembrava à Euronews o politólogo Nicolai von Ondarza. À mesma rede pan-europeia, Francesco Nicoli, do think tank Bruegel, mostrava-se convencido de que Meloni vai pode responder taticamente às propostas de Le Pen e Von der Leyen. “Do ponto de vista político, continuo a acreditar que estas duas opções não estão necessariamente em contradição”, afirmou, garantindo ser “perfeitamente possível” que Meloni junte forças com Le Pen para formar um megagrupo de extrema-direita no Parlamento Europeu e que partes do grupo “deem apoio” a uma coligação liderada por Von der Leyen..Os olhares estão, portanto, todos virados para “La Meloni”. Aos 47 anos, a primeira-ministra italiana, que ao chegar ao poder em 2022 provou que em Itália a política não é só terreno masculino, tem aqui a sua oportunidade de mostrar que é possível uma cooperação na direita, seja ela mais ou menos extrema. Para trás parece ter ficado a mulher que ainda em 2019 gritava num comício para que se “derrubasse a União Europeia”, que em 2018 via o euro como uma forma de “escravatura” e que apontava Putin como um defensor dos valores tradicionais. Desde que chegou ao poder que Meloni soube impor-se em Bruxelas como uma interlocutora construtiva, mudando de rumo para apoiar a Ucrânia e aproveitando a sua amizade com Orbán para se apresentar como mediadora quando o primeiro-ministro húngaro ameaça bloquear as decisões da UE. .E se alguém duvida dos seus objetivos, o slogan de campanha de Meloni diz tudo: “Itália pode mudar a Europa.” E Itália, neste momento, é ela. Se pode ser travada? Tudo depende do voto dos europeus - em Portugal já este domingo 2, por antecipação, ou no dia 9, em qualquer local..Editora executiva do Diário de Notícias