O tradicional período de férias seria a chance para a brasileira Laiana Araújo realizar o sonho da filha em conhecer a Disney, em Paris. Porém, o sonho da miúda terá de ser adiado: a imigrante aguarda há quase 10 meses pelo título de residência renovado, que ainda não chegou a sua casa. Quando efetuou a renovação no IRN da Loja do Cidadão das Laranjeiras, a 10 de novembro, não imaginava que a demora seria tanta. “Eu sabia e via em grupos de imigrantes na internet que estavam todos atrasados, mas, lá por abril, vi que alguns receberam, mas o meu nada”, conta Laiana ao DN. O relato soma-se a outros que o jornal já recebeu no mesmo sentido. .Sem sucesso por telefone, a imigrante já perdeu a conta de quantos e-mails mandou ao IRN, à Agência de Integração, Migrações e Asilo (AIMA) e também à Provedoria de Justiça - órgão que respondeu com a afirmação de que, por decreto-lei, todos os documentos caducados são considerados válidos até junho de 2025. .Esta tem sido a resposta padrão de vários órgãos públicos, desde 2020, quando o decreto-lei foi criado e vem sendo prorrogado sucessivamente deste então. O problema é que o documento somente tem validade dentro do território nacional. Ou seja: os imigrantes não podem sair do país e estão “presos” em Portugal - com exceção de viagem para o país de nascimento. Por mais que não exista tradicionalmente controlo de fronteira no Espaço Schengen, como é o caso de um voo Lisboa-Paris, é possível que sejam solicitados os documentos numa fiscalização de rotina..Além disso, desde a criação do título da Comunidade dos Países de Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), que não permite viajar pela Europa, algumas companhias aéreas passaram a pedir o título de residência no ato do embarque. “Eu não vou arriscar”, resume a brasileira..Processo ficou “retido” no IRN.Mas, qual o motivo de tanta demora para chegar o documento em casa? Laiana não descansou até saber. Depois de muitos e-mails, recebeu em julho uma resposta da Loja do Cidadão de Laranjeiras. “Detetámos que o seu processo ficou retido do “nosso” (aspas próprias) lado. Vou reintroduzir novamente os seus documentos e envio-lhe um novo comprovativo”. O processo da imigrante ficou parado de novembro a julho deste ano. “Agora, não sei quando vai chegar a minha residência”, lamenta a brasileira, que trabalha em Portugal desde 2021. .Além da viagem com a filha, a imigrante precisa, por razões profissionais, de viajar até à Alemanha, mas também não pode por ainda não ter o documento renovado em mãos. “É muito desgaste com a situação”, lamenta. Perder a oportunidade de viagens não é o único prejuízo desta cidadã. “Já fui cobrada pelo banco e pelo centro de saúde”, relata. .Contatada por este jornal, a Loja do Cidadão de Laranjeiras não respondeu qual o motivo de o processo da brasileira ter ficado “retido” durante oito meses”. O órgão apenas respondeu que a responsabilidade do IRN é “assegurar a receção e confirmação dos elementos necessários para a renovação das autorizações de residências”. A etapa de concessão do documento é da AIMA - que precisa de receber estes dados por parte do balcões de IRN..A realização de renovações nestes locais fez parte do plano elaborado para a criação da AIMA, com o fim do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. O objetivo era tornar o ato dos estrangeiros igual aos do cidadãos nacionais, nas Lojas do Cidadão. No entanto, fontes da AIMA admitiram ao DN que o processo “não correu bem”, o que levou o atual Governo a retirar esta competência do IRN, mesmo que não de forma imediata. A medida de concentrar as renovações na Agência foi anunciada como uma das ações do Plano para as Migrações, lançado a 3 de junho..Além de não poder viajar, o atraso causa outros constrangimentos por parte dos órgãos públicos. O DN já recebeu relatos de imigrantes com documentos atrasados há meses, com medo de perderem a inscrição no centro de saúde, inclusive casos de pessoas em tratamento contra o cancro com título de residência que nunca chega. O DN já questionou a AIMA diversas vezes sobre a razão para a demora, mas não obteve resposta..Igualmente, o jornal perguntou ao Governo se o decreto-lei que torna os documentos caducados válido foi enviado a todos os órgãos públicos e qual a estratégia de divulgação da medida, mas também não recebeu resposta..amanda.lima@dn.pt