Sob a égide de Fernão Lopes

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Na realidade, o título acima pertence ao colóquio sobre Lisboa, a cidade de Fernão Lopes, que se irá realizar na Torre do Tombo, dia 12 de setembro, das 14h30 às 18h00.

O subtítulo, “Entre a ‘sua’ cidade e a sua obra traduzida para inglês”, aponta para a apresentação da primeira tradução completa das obras atribuídas a um dos maiores cronistas europeus, o nosso Fernão Lopes.

Nunca é demais referir a importância da sua narrativa, desde os factos aí registados a documentos cujo significado e validade se mantêm, tais como o Tratado de Windsor (1386), considerado o mais antigo a vigorar em todo o mundo. Mas há mais: a mulher medieval, que durante séculos parecia viver na sombra, aparece frequentemente em primeiro plano em Fernão Lopes.

O mesmo acontece com o povo miúdo, figura coletiva de pano de fundo nas obras de outros autores, aqui, frequentemente, salta para primeiro plano, mas não vem só - é retratado nos seus momentos tanto de glória como de sofrimento, raiva, frustração, medo, mas sempre de luta pela sobrevivência. Lopes transmite-nos em todo o seu complexo pormenor o universo da corte portuguesa, das caçadas, da diplomacia, das guerras, das pestes, das vicissitudes da economia, incluindo as moedas em circulação e seus valores relativos.

É isso que o distingue de outros cronistas, mas, como se não fosse bastante, toda essa informação é apresentada com o tratamento e intencionalidade de mestre nas artes literárias - como que um excecional autor de ficção histórica, só que o enredo já está delineado, mas é seu mester descobri-lo na documentação disponível e dar-lhe forma artística.

Talvez por isso fique tão vincado no nosso subconsciente desde os bancos do ensino secundário. É nas suas crónicas que se observa a verdadeira consciencialização de uma identidade nacional através da rebelião de 1383-1385 e da batalha real no Campo de S. Jorge, em Aljubarrota.

É difícil escapar à marca que deixou na nossa memória cada vez que olhamos para o Castelo de São Jorge, seu local de trabalho, coroando a “sua”, e nossa, cidade. E se lá subimos, olhamos das muralhas para o Tejo e imaginamos a angústia de ver a frota castelhana durante o cerco de 1384. A caminho da Faculdade de Letras depara-se-nos a nova Torre do Tombo, guardiã dos seus autógrafos. No Museu do Dinheiro encontra-se um exemplar da belíssima “dobra pé-terra” em ouro cunhada a mando de D. Fernando, representando-se como rei guerreiro, em pé, de espada em punho. O Rossio da sua época ainda é o coração de Lisboa, mas ROSSIO é agora a designação da infraestratura da FCSH/NOVA, que, como uma invisível praça digital, oferece acesso aberto a uma miríade de sites de investigação em Ciências Sociais, Artes e Humanidades. Entre eles destaca-se o Fernão Lopes Portal (fernaolopes.fcsh.unl.pt), pertença do Instituto de Estudos Medievais, oferecendo apoio à leitura da obra do cronista por estrangeiros e nacionais.

O portal foi desenvolvido durante o projeto de tradução que levou à primeira edição completa das obras de Fernão Lopes em inglês, The Chronicles of Fernão Lopes (Boydell/Tamesis, 2023), à qual o título acima se refere. E assim fechamos o presente círculo da dita “égide”, tomada como esfera de ação e de influência de Fernão Lopes. Não perca!  

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