Espaço do Ryoshi, restaurante inaugurado em 2024.
Espaço do Ryoshi, restaurante inaugurado em 2024. DR

No Cais do Sodré, o Ryoshi faz da cozinha japonesa um lugar de conforto

Chef Lucas Azevedo aposta numa culinária japonesa descontraída e autoral, com pratos que fogem do óbvio - do temaki de caranguejo a uma rabanada difícil de esquecer. Em 2026, chegam novidades.
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Em meio às comilanças natalícias e celebrações de fim de ano, tem sido difícil pensar noutra coisa desde que o chef Lucas Azevedo serviu à reportagem do DN uma de suas especialidades do restaurante Ryōshi, em Lisboa: as rabanadas. “Sem exageros, é a melhor sobremesa de Lisboa”, atira a sous-chef Pâmela Rubi, enquanto este repórter tenta compreender a cremosidade daquela fatia dourada servida com gelado de iogurte e azeite. De chorar por mais.

Antes da dita-cuja, no entanto, são outras dezenas os pratos - das entradas aos principais, passando pelas harmonizações e digestivos - que transformam uma refeição neste restaurante japonês numa experiência para ficar marcada na memória.

Faz pouco mais de dois anos que, numa das zonas mais movimentadas de Lisboa, na Rua da Boavista, pleno Cais do Sodré - região que acolhe turistas, despedidas de casamentos e gente alegre até demais - o Ryōshi se sobressai como um dos melhores sítios para comer fora no bairro.

Sashimi de sarrajão do Ryoshi.
Sashimi de sarrajão do Ryoshi.SALVADOR COLACO/DR

Outrora sinónimo de tradição, a zona já é há uns valentes anos virada para quem quer, além de ser bem servido, ter um momento de descontração e iniciar as atividades para uma noite de festa. É aí que o restaurante ganha graça: poderia ser só “mais um japonês” no corredor da noite lisboeta, mas faz o caminho inverso.

Lucas Azevedo gosta de matar, logo de entrada, a ideia de que a cozinha japonesa é um altar intocável, daqueles em que o cliente entra em silêncio e sai com a sensação de ter feito prova de catequese. Quando se fala em conceito, Lucas prefere pensar numa casa “divertida, animada, que não fosse apenas aquela coisa ritualista”.

A “liberdade”, no entanto, não transforma o espaço numa fusão genérica. Pelo contrário: há aqui uma disciplina no sabor e um respeito quase obsessivo pelo produto. “O que eu sei é que eu aprendi no Japão”, diz o chef, que estudou e estagiou por lá, passou temporadas em Nagoya e colocou as mãos em cozinha fria e quente. “Foi um pouco de tudo”, resume, no seu português já misturado entre o de Lisboa e o do Rio de Janeiro - são mais de vinte anos por aqui.

Peixe fresco é regra na casa.
Peixe fresco é regra na casa.SALVADOR COLACO/DR

Depois de meses a ouvir pedidos, Azevedo voltou recentemente a reforçar a oferta de um suspeito do costume no Ryōshi, o sushi - mas sem trair a própria filosofia: peixe de pesca sustentável, ingredientes de temporada, técnica sem exibicionismo. “É o nosso sushi caseiro: o que se faz num dia de festa, em família, no Japão”, explica.

No menu, entram sashimis de peixe da época - como sarrajão e shiromi - valorizados com caldos e pickles. Os temakis aparecem “abertos”, e um deles já virou conversa de mesa: o temaki de caranguejo, cremoso e crocante, com harare (crocante de arroz) e takuan a dar estalo.

Há ainda destaques como o oshizushi, sushi prensado à moda de Osaka e o futomaki generoso com botarga ralada. Os “best sellers” continuam a fazer a cama para as novidades: o Lucas San K-Sandwich (katsu sando), surpreendetemente feito com língua de vaca, a enguia com arroz e gema de ovo, o tártaro de carapau, o frango karaage. Alguns clássicos, avisa a casa, regressam como especiais do dia - convém perguntar. A vertente vegetal segue em destaque com criações como a beringela com miso que, quando chega à mesa, lembra aos carnívoros que vegetal, bem tratado, não é “alternativa”.

O temaki de caranguejo com harare e takuan é um dos destaques do menu.
O temaki de caranguejo com harare e takuan é um dos destaques do menu.SALVADOR COLACO

“No Ryōshi gostamos de brincar e dizer que ‘omakase is dead’. Porque há vida para lá dos nigiri e dos menus escolha do chef. Aqui é o cliente que decide o que quer comer". A sala acompanha o espírito leve do restaurante. "Ryōshi significa pescador", explica o chef nesta cabana urbana no meio do Cais do Sodré, acolhedora sem ser kitsch. O salão também conta com um pequeno altar laico - a única luz que não se apaga - onde mora um quadro com a frase japonesa que o chef trata como essência: Ichi-go Ichi-e, o aqui e agora que não se repete.

E se há algo que o Ryōshi sabe fazer é voltar ao tema sem parecer repetição. É assim com o sushi, que regressa mais forte neste fim de ano e é assim com a rabanada, que o chef conta fazer “há mais de dez anos” e que, no restaurante, ganha sotaque próprio com um toque de sake, gelado de iogurte, azeite do Esporão, sal, telhas de miso e um creme que descreve como “quase um pudim”.

Para fevereiro de 2026, Lucas promete novidades com a abertura do Enso, no Príncipe Real - restaurante que já tem unidades no Marrocos, país para onde o chef mantém uma constante ponte aérea. Em Lisboa, o novo projeto chega “mais purista”, com o sushi ainda mais no centro. O Ryōshi, por sua vez, fica com a missão de continuar a provar que a cozinha japonesa pode ser séria sem excessos, técnica sem ser fria e descontraída sem virar caricatura - algo raro nesta região.

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